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Os ídolos como encruzilhada de comportamento e identidades
Vivemos numa sociedade que, cada vez mais, dá visibilidade às grandes estrelas mediáticas, quer sejam elas jogadores de futebol, lutadores de wrestling ou actores de cinema? Por múltiplas razões, imensos dispositivos promocionais tornam omnipresentes raríssimas personagens. Como é fácil depreender, nem sempre pelos melhores motivos essas figuras se tornam conhecidas e surgem com regularidade em televisões ou jornais? De qualquer modo não interessa, pois passa a ser vendível qualquer detalhe referente às suas vidas: se gosta desta ou daquela pessoa; se já se separou; se bebe álcool e foi preso; se tornou violento e injusto para com os filhos?
Mas o que se passa do outro lado, do lado do público e, concretamente, no que diz respeito aos adolescentes e pré-púberes a que muitas destas campanhas se dirigem? Num levantamento por nós efectuado, através de dinâmicas de grupo, muitos dos alunos definiram o que é um ídolo com frases do género, citamos de memória: "alguém que a gente quer ser"; "pessoa que tem tudo o que quer"? Instados a identificar alguns líderes, os alunos forneceram nomes daquelas pessoas que mais nos invadem o quotidiano mediático.
Assim, não é de estranhar que a temática tivesse sido identificada como importante no desenvolvimento de vários programas de promoção da saúde. Deste modo, a relevância de se trabalhar os ídolos perpassa vários determinantes, de natureza tão díspar como a alimentação saudável, a prevenção do tabagismo, a prevenção do consumo de drogas ilegais ou, mais genericamente, em acções de promoção da saúde mental.
No nosso trabalho de intervenção, a que já nos referimos em vários textos, optámos por trabalhar os ídolos imediatamente a seguir a uma outra sessão, dedicada ao desenvolvimento da imagem de si quer no que diz respeito a dimensões corporais, quer ainda no que concerne a aspectos de natureza mais psicológica. Nela, os alunos concluíram que não há pessoas iguais e que devem gostar de si mesmos. Ora, logo após estas conclusões, quando voltámos a estar com o grupo, dedicámos um primeiro momento a um brainstorming sobre o conceito de ídolo e quais os ídolos mais apreciados. Depois de terem sido proferidas frases como aquelas que acima transcrevemos, espantámo-nos: "mas afinal vocês disseram-me, na última sessão, que eram únicos e agora querem ser como X ou Y, não estou a perceber?" A dissonância, fruto da contradição em que caíram, motivou a turma para se embrenhar um pouco mais na questão dos ídolos e sobre o que é admirar alguém.
Após a formação dos grupos de trabalho, distribuíram-se diversos textos com uma série de cenários diferentes. Neles, apresentaram-se quatro países imaginários, a saber: País dos Aviões; País dos Anões; País dos Azuis; e País dos Carros. Para cada situação, o grupo teve de inventar três a quatro personagens que seriam os ídolos das suas comunidades ou países. Houve depois um momento de partilha em grande grupo sobre os nomes e as características de cada ídolo. Curiosamente, e como não podia deixar de ser, os ídolos apresentaram diferentes qualidades e defeitos, consoante o país de origem? mas também eram reflexo dos interesses e gostos de cada aluno.
Finda esta etapa, cotejaram-se os novos ídolos com as definições iniciais e com aspectos idiossincráticos das tarefas realizadas (ou seja, o ídolo do país dos aviões gostava muito de andar de phones e de ouvir um certo género de música). Levantou-se, de seguida, nova interrogação: nós apenas queremos ser como ídolos ou também os escolhemos e gostamos mais ou menos deles conforme os nossos gostos pessoais? A questão passa por saber seleccionar os ídolos e relacionarmo-nos com eles de forma activa e responsável.
Também achamos que estas actividades permitem explorar o papel da influência do grupo na escolha dos heróis, das pessoas de que se gosta mais e que se considera um exemplo a seguir. Trata-se, no fim de contas, de promover sentimentos de autoria e competências de tomada de decisão dos alunos. A mensagem a tornar aqui visível passa, principalmente, por tornar consciente as escolhas e não escolhas (decisões não pensadas) nos processos que levam à eleição de ídolos, ao desejo, mais ou menos estruturado, de ser como outra pessoa.
Apresentámos aqui uma forma de se trabalhar a temática que escapa ao formato tradicional das palestras e dos métodos expositivos em geral. A utilização das dinâmicas de grupo, se devidamente enquadradas em programas de promoção bem desenhados, pode aumentar o impacto das actividades? rumo a uma saúde física e mental mais equilibrada.

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 173
Ano 16, Dezembro 2007

Autoria:

Rui Tinoco
Psicólogo Clínico - ACES Porto Ocidental
Rui Tinoco
Psicólogo Clínico - ACES Porto Ocidental

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