Que ano mais cheio! No ano anterior, ou seja, em 1998, houve um dia em que um ditador não teve outro remédio senão cair. E caiu! Pelo menos, aparentemente, foi-lhe retirada a cadeira do poder. Ele, Suharto, que quando assumiu a presidência receitou as purgas anticomunistas que vitimaram cerca de um milhão de pessoas em 1965/66. O mesmo que chamou terapia de choque ou assassínio profilático quando a polícia e o exército aniquilaram milhares de pequenos delinquentes da ilha de Java. As mudanças políticas que poderiam vir a verificar-se diziam directamente respeito à Indonésia e, necessariamente, ao povo maubere que, fora obrigado a sofrer a injusta, humilhante e arrasadora experiência de "balão de ensaio" e "amostra de resultados" para uma população imensa de um imenso potentado ditatorial. Voltando a 1999, já que algum balanço pode ser feito, digo algum devido às incertezas e aos compromissos meio comprometidos e não à escassez de evidências, houve expectativas defraudadas, cumplicidades disfarçadas de solidariedades, ambiguidades enroupadas de posições claras, recrudescimento das atrocidades. E, paradoxalmente, se calhar não, os massacres tomam o forma de extermínio, quando se cumpre a preparação e a realização do referendo resultante de um acordo firmado em Nova Iorque, no âmbito das Nações Unidas. Não foi o acordo que Timor merecia e vários países, entre os quais Portugal, desejavam. Era o 5º dia do mês de Maio! Foi um passo, de qualquer modo, foi um passo! Só que sobre tapete de brasas. O fogo e a flagelação, entenda-se violência, purificam? Recuso a teoria. Mas lá que não desmobilizaram é verdade. No penúltimo dia de Agosto consuma-se um acto, diria religioso, de exaltação da liberdade. Realiza-se a consulta aprazada, se bem que adiada, e os timorenses gritam quase em uníssono: INDEPENDÊNCIA! Que lição ao mundo! Surpreendentemente, para quem se deixa surpreender, em 19 de Outubro é declarada pela Indonésia a desanexação de Timor Leste. E logo, logo de seguida, é conhecido o sucessor de Habibie que não é o próprio nem Megawati Sukarno Putri, esta que já tinha ganho umas eleições (?). Outra surpresa? Se calhar ... Na manhã de 22 de Outubro regressa ao seu país, à sua gente, o carismático Kai Rala Xanana Gusmão e as primeiras saudações que partilha com o povo são: Viva Timor Loro Sae! Viva o povo maubere! Vivam as Falintil! Vou prometer-me neste final de ano pousar em mais sossego o dossier da indignação. E vou cuidar de, a partir de Janeiro, mês que começa o findar do milénio, dar mais cor às páginas da construção em formação. E, necessariamente, lembrar em particular as crianças que vão continuar a fazer a história do seu país. E a língua portuguesa vai ser não um nó, mas um laço de união muito poderoso! Iracema Santos Clara Escola E.B. 2/3 Dr. Pires de Lima
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