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Alguns Parágrafos Sobre Dois Acontecimentos do Mês Anterior


1 Internacional

Acordo de Bagdad faz abortar a guerra

A fotografia correu mundo nas primeiras páginas de centenas de jornais. Kofi Annan, secretário-geral das Nações Unidas, e Tarek Aziz, vice primeiro ministro iraquiano, assinaram, em Bagdad, um acordo que parece travar a guerra entre os Estados Unidos e o Iraque.
No acordo de Bagdad, as 'Nações Unidas reiteram o compromisso de todos os Estados membros em respeitar a soberania e a integridade territorial do Iraque', enquanto reconhecem que o levantamento das sanções económicas contra o país de Saddam Hussein é de importância primordial para o povo e o governo iraquianos.
Os Estados Unidos da América, que tinham, unilateralmente, manifestado a possibilidade de atacar o Iraque, aceitaram o acordo firmado em Bagdad, embora mantenham na região do Golfo Pérsico tropas prontas a desencadear nova 'tempestade no deserto'.
Recorde-se que o Governo português, pela voz do ministro dos Negócios Estrangeiros, Jaime Gama, disponibilizara a Base das Lajes, nos Açores, para apoio às tropas norte-americanas nesta cruzada contra o Iraque, o que fez de Portugal um dos raros países a avalizar a tese belicista dos Estados Unidos da América.
No apoio à vontade norte-americana de atacar o Iraque distinguiu-se também o governo britânico de Tony Blair, contrariamente a grande maioria dos países da União Europeia que pressionaram no sentido de uma solução diplomática e politicamente negociada.
A evolução da situação político-militar no Golfo Pérsico volta a colocar o problema que resulta do facto de um país (os Estados Unidos da América) querer assumir-se como 'polícia do Mundo'. Estados Unidos não é sinónimo de Nações Unidas.

2 Nacional

Lei do aborto'abortada'

Por cá a questão do mês terá sido a das alterações à lei do aborto. Uma proposta, sobre a matéria, aprovada pela Assembleia da República, no início do mês de Fevereiro, ameaça abortar, em nome da possibilidade da realização de um referendo.
Enquanto se decide se há ou não referendo, a lei aprovada na generalidade, no dia 4 de Fevereiro (votos do PS e do PCP), aguarda, sem data, a discussão e votação na especialidade. Na prática a decisão dos deputados não tem qualquer efeito.
Como é do conhecimento público, o secretário-geral do Partido Socialista e primeiro-ministro, eng. António Guterres, é contra a despenalização do aborto, pelo menos nos termos em que os deputados socialistas e comunistas a aprovaram no Parlamento.
Sectores da maioria parlamentar que votou as alterações à lei do aborto manifestaram estranheza pelo facto de, só agora, se querer um referendo: há um ano, quando o parlamento rejeitou alterações à lei, então propostas, ninguém quis referendar a rejeição.
Tudo isto faz lembrar uma velha máxima, atribuida ao senhor Henry Ford, co-criador dos primeiros carros homónimos, segundo a qual os americanos eram livres de escolher a cor que quisessem para os Ford T, desde que fosse o preto.

Jornalistas

Terminou, em Lisboa, o 3º Congresso dos Jornalistas Portugueses no decorrer do qual o secretário de Estado da Comunicação Social, Arons de Carvalho, defendeu a tese de que o serviço público de rádio e de televisão exige que o Estado detenha uma estação de rádio e um canal de televisão.
No decorrer dos trabalhos, os proprietários dos grupos económicos mais significativos com interesses no sector defenderam a ideia de que há grupos a mais, em Portugal, para que cada um possa crescer e competir internacionalmente.
O Congresso discutiu, também, os problemas relacionados com as incompatibilidades do exercício da profissão, nomeadamente no que respeita à assessoria política e à colaboração nas agências de comunicação.
Neste ponto é curioso referir que dois terços da informação publicada na União Europeia tem origem em 'fontes organizadas' (assessorias e agências de comunicação), segundo uma percentagem adiantada no Congresso por João Carreira Bom, jornalista actualmente proprietário de uma agência de comunicação.
Durante os trabalhos foi divulgado o resultado de um inquérito efectuado a jornalistas que revelará, em percentagens significativas, a existência de pressões ilegítimas sobre o exercício da profissão. Numa das comunicações, um dos participantes deu a cara para acusar a hierarquia do jornal onde trabalha de censura e de incitamento à publicação de informações favoráveis a determinados grupos, partidos e pessoas.
Organizado pelo Sindicato dos Jornalistas, o Congresso, que mereceu a presença do presidente da República, teve como principais rostos os de Diana Andringa, presidente do sindicato, e de José Pedro Castanheira, presidente da comissão organizadora, este último com um Fevereiro mediático, depois de assinar, no Expresso, uma entrevista a Rosa Casaco, o 'pide' que chefiou a brigada que assassinou Humberto Delgado.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 66
Ano 7, Março 1998

Autoria:

João Rita
Jornalista, Porto
João Rita
Jornalista, Porto

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