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No meio do caminho havia uma copa

Milhões de brasileiros, em sua maioria jovens estudantes, foram para as ruas do país Milhões de brasileiros, em sua maioria jovens estudantes, nos ensinaram que as políticas cotidianas não se reduzem a ser contra ou a favor; elas são complexas e plurais, com muitas demandas e muitas nuances. 

Se ser professor é estar sempre no atravessamento de fronteiras de conhecimentos, culturas e significações, ser professor no país do futebol, como alguns gostam de chamar o Brasil, é se posicionar em mais um atravessamento.
Diante de mega-eventos esportivos como a Copa das Confederações, realizada no mês de junho, e com a aproximação da Copa do Mundo de Futebol, muitos professores hesitam entre participar das comemorações futebolísticas do país que habitam as conversas de salas de aula – ainda que muitos nem gostem de futebol – ou assumir uma postura de combate, propondo debater nas escolas os interesses políticos e mercadológicos que estão por trás da indústria do esporte.
Muitas vezes, o maior desafio é mostrar para os estudantes de classes pobres que a probabilidade de tornar-se um jogador milionário é muito pequena, já que dados disponibilizados em 2009 pela Confederação Brasileira de Futebol indicam que 84% dos jogadores recebem menos que 2,2 salários mínimos. Por vezes, trata-se de um discurso em vão, pois grande parte destes meninos continua desejando ser jogador de futebol e ganhar como o Neymar no momento atual.
Mas desta vez, nós professores, aprendemos com os nossos estudantes e aprendemos nas ruas. Milhões de brasileiros, em sua maioria jovens estudantes, foram para as ruas do país Milhões de brasileiros, em sua maioria jovens estudantes, nos ensinaram que as políticas cotidianas não se reduzem a ser contra ou a favor; elas são complexas e plurais, com muitas demandas e muitas nuances. havia uma Copa em diferentes cidades para protestar contra os rumos da política local e nacional. Foram muitas as bandeiras levantadas por estes jovens que reclamavam do aumento das passagens de transporte, da corrupção política, do pouco investimento na saúde e na educação.
A crítica aos gastos realizados pelos governos para a realização das copas das confederações e do mundo perpassou todas estas manifestações e chegou à cerimônia de encerramento da Copa das Confederações, quando voluntários do evento burlaram as normas e no centro do gramado do Maracanã abriram faixas de protesto. Do lado de fora do estádio, eclodiam confrontos entre a polícia militar, com carros blindados, e manifestantes que agitavam cartazes mesclando humor e denúncia: “queremos equipamentos de saúde e educação padrão FIFA!!!”
Um dos cartazes exibidos pelos manifestantes fazia uma brincadeira com uma frase do poeta brasileiro Carlos Drummond de Andrade. O poema diz que “no meio do caminho tinha uma pedra / tinha uma pedra no meio do caminho”. Para os manifestantes, a frase era “no meio do caminho tinha uma Copa / no meio da Copa, achamos o caminho”.
E foi justamente no meio da Copa das Confederações que os jovens nos ensinaram, nas ruas e através de suas manifestações na rede mundial de computadores, que as políticas cotidianas não se reduzem a ser contra ou a favor; elas são complexas e plurais, com muitas demandas e muitas nuances que fizeram boa parte dos acadêmicos brasileiros se questionarem, sem compreender o que está acontecendo no Brasil.
Aqueles que diziam ser esta uma geração desinteressada pelas questões políticas, individualista e isolada por trás de seus computadores, se surpreenderam com a capacidade de uma mobilização que não teve um único centro, partindo de diversos grupos com motivações diferentes, que mais nos lembram a ideia de rizomas proposta por Deleuze e Guattari.
Um estudante que frequentou as nossas aulas em uma escola pública da cidade do Rio de Janeiro e que hoje cursa uma universidade nos explicou sobre o movimento: “O que os dedos frenéticos escreviam no facebook, as vozes hoje gritam nas ruas”. Com estes jovens aprendemos que tanto na rua quanto na rede mundial de computadores também se aprendeensina.

Nivea Andrade
Laboratório Educação e Imagem
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil


  
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Edição:

Edição N.º 201, série II
Outono 2013

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