Depois de Lisboa contada pelos Dedos (2001), que mereceu justamente o Grande Prémio de Crónica da APE-Associação Portuguesa de Escritores, Baptista-Bastos publica agora A Cara da Gente", que reúne muitas das suas crónicas saídas no antigo Diário Popular, sobretudo com o propósito de retratar ou de evocar pessoas próximas e distantes, no fio compassado dos dias e dos anos sempre vividos em Lisboa. Nas crónicas deste livro, Baptista-Bastos, em escolha pessoal, estabelece uma espécie de "breviário" de rostos de gentes que andaram no seu caminho de jornalista e escritor atento à valorização do quotidiano e ter muitas vezes sabido captar pela emoção e sensibilidade tudo o que se passou à sua volta no correr dos amos. Daí que o autor de Elegia de um Caixão Vazio deseje na recuperação literária destas páginas recuperar situações de vida ou imagens para um balanço de identificação de pessoas e lugares, vozes e gentes com todos os seus problemas, numa comunhão de palavras e de sentimentos, de ideias e emoções, e por isso falar uma vez mais em voz alta ou ser como admirável cronista um arauto daqueles que não têm voz. Na sua habitual forma de denunciar e intervir, Baptista-Bastos reafirma uma visão muito própria de retratar as gentes com quem dialogou e assim afirmar de modo comovido ou irónico, e numa intenção humanizada, na lembrança dos lugares e ruas lisboetas, na evocação de pessoas com quem dialogou ou memória dos amigos de estúrdia e boémia por sítios que permanecem na sua memória, enfim, sempre o sentido de crónica ou de reportagem está presente nas páginas deste novo livro do autor de Secreto Adeus, como círculo que se não fecha e percorre os meandros mais fundos da vida em solidariedade com os outros. Assim, já passada a casa dos seus setenta anos, é bom salientar a força e a limpidez da escrita: sempre cortante e meticulosa nos pormenores, rigorosa no que descreve e narra na certeza de saber que, dividido entre a ficção literária e a crónica. Baptista-Bastos é, sem favor, um dos nomes mais destacados da nossa literatura, quer pela qualidade da escrita como pelo sentido intervencionista como sabe definir as suas posições com grande verticalidade. E por isso não podemos deixar de repetir as palavras de Luiz Pacheco a propósito de outro livro do autor de A Colina de Cristal": "Leiam o livro todo. São trabalhos jornalísticos exemplares. Há talento, há verve, há ousadia, há um homem, há um escritor".
Baptista-Bastos A CARA DA GENTE, crónicas Ed. Oficina do Livro / Lisboa, 2008.
Serafim Ferreira
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