Página  >  Edições  >  N.º 181  >  O aprendizado precoce de limites

O aprendizado precoce de limites

O aprendizado de limites começa muito precocemente, sendo que o papel dos cuidadores é imprescindível para que isso aconteça. Não existe um bebê, enquanto ser humano, sem estar na relação com alguém, por isso Winnicott (1982) destaca a importância da mãe (ou de quem cuida do bebê) para o desenvolvimento saudável dele. A mãe é necessária no sentido físico, primeiramente; o bebê necessita sentir-se acolhido pelo corpo da mãe. E é quem apresenta ao bebê o mundo, quem o nomeia e ajuda-o a entender a realidade.
Mas, a mãe é, sobretudo, necessária no processo de "desiludir" o bebê, ou seja, mostrar que nem tudo será como ele deseja e que ele vai ter frustrações, mas que sobreviverá, à custa do amor que deve estar na base da relação. É preciso conter a agressividade do bebê diante das frustrações que a realidade impõe; conter não é ignorar, reprimir ou repreender, conter é aceitar, abarcar, digerir e, acima de qualquer coisa, decodificar o significado da agressão, tornando conhecimento o impulso sem nome.
A agressão cria para o bebê a noção de exterioridade, sendo, por isso, parte importante no desenvolvimento. Esta agressão não tem intencionalidade, e, desta forma, não deve ser confundida com violência. Quem dará sentido para os gestos do bebê é seu cuidador. De modo que, a mãe, ou quem faça seu papel, deve conseguir acolher os gestos agressivos, tolerar e dar significados. Se há uma falha ambiental em conter as agressões elas acabam se transformando em violência.
De certa maneira, é a agressão que nos move na vida, isso porque ela aparece fundida com o amor. A agressão nos faz ir ao encontro do outro, nos faz criar e conhecer. É uma fonte de energia vital, ao mesmo tempo em que é uma resposta à frustração. Mas a agressão só se transforma em algo producente à medida que o indivíduo encontra no meio algo que a limite e que permita com que ele possa significar seus atos. Os limites garantem a criação de um espaço para um desenvolvimento criativo, sem riscos para a criança e para os que a rodeiam.
Winnicott coloca que o cuidador deve ser continente às agressões do bebê, oferecendo um espaço afetivo suficientemente bom. Enfim, ser continente significa não só aceitar, conter, abarcar, mas, sobretudo compreender, decodificar e devolver para o bebê o entendimento acerca de seus atos. É fundamental nesse processo nomear para o bebê o que a mãe captou de suas atitudes.
Para conseguir estabelecer para as crianças o que é ou não permitido e para isso, os adultos devem ter claros seus próprios princípios morais. Muitas vezes, eles acabam se confundindo sobre o que consideram que é permitido ou não às crianças. Isso gera muita insegurança para as crianças, pois elas necessitam de coerência nas atitudes disciplinadoras, e não de regras que mudem a todo instante. Quando as regras são impostas e cumpridas, isso tranqüiliza a criança, faz com que ela se sinta segura.
A rotina e o diálogo são pontos essenciais para que a criança compreenda os limites. O fato de ter atividades que se repetem em determinados horários promove o aprendizado de parâmetros e da passagem do tempo. Entender que pode planejar atividades futuras faz com que a criança possa postergar a sua gratificação de algum desejo. Do mesmo modo, a palavra permite que a criança assimile intelectualmente as regras, esclarecendo sua relevância e significado.
Brazelton e Greenspan (2002) afirmam que a disciplina significa educação e não punição. Por isso bater, castigar fisicamente uma criança além de não lhe ensinar nada, pode prejudicar a auto-estima da mesma, tendo reflexos negativos em seu desenvolvimento. Por outro lado, se os adultos têm uma atitude empática e carinhosa, a criança aprende a se comportar desse modo. A criança é obediente porque deseja agradar o adulto, mantendo fortes os laços da relação. O objetivo da disciplina é estruturar dentro da criança um espaço para a autodisciplina, para que ela possa, por ela mesma, regular suas ações.
Mas, afinal, o que torna uma criança obediente? Provavelmente, é ela se sentir amada, respeitada e sentir que os adultos têm firmezas em seus valores, em suas resoluções. Sempre que um adulto quiser que a criança faça ou deixe de fazer algo, deve explicar a ela o porquê. Nunca se pode menosprezar a capacidade da criança de entender a situação, por menor que ela seja. Negociar longamente pode ser necessário e, é fundamental, se colocar no lugar dela, entender o que ela está sentindo, por que está querendo determinada coisa. Os adultos devem, também, proporcionar momentos em que ela está autorizada a escolher o que deseja, pois isso reforça a sua auto-estima; ela se sente capaz, ao perceber que seu pensamento é valorizado.

Referências Bibliográficas

  • BRAZELTON, T. Berry; GREENSPAN, Stanley. As necessidades essenciais das crianças. Porto Alegre: Artes Médicas, 2002. 
  • WINNICOTT, D. W. A Criança e o seu Mundo. 6 ed. Rio de Janeiro: LTC, 1982.

Beatriz de Oliveira Abuchaim


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 181
Ano 17, Agosto/Setembro 2008

Autoria:

Beatriz de Oliveira Abuchaim
Psicóloga, escritora, mestre em Educação pela PUCRS - Brasil.
Beatriz de Oliveira Abuchaim
Psicóloga, escritora, mestre em Educação pela PUCRS - Brasil.

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo