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Ainda a Educação Física...

Chegou-me às mãos o texto do Real Decreto 1670, de 24 de Setembro de 1993, preparado pelo «Ministerio de Educación y Ciência», que criou, em Espanha, o licenciado em «Ciencias de la Actividad Física y del Deporte». Nele se lê: "A nova denominação, que contou praticamente com o consenso de todos, substituiu o termo tradicional de educação física que, embora possua uma grande riqueza conceptual, não contempla outros aspectos da actividade física, que podem e devem ser objecto de estudo e de investigação, no âmbito de uma perspectiva científica e universitária". Quando, há quase trinta anos, escrevi o mesmo, por outras palavras (veja-se o meu artigo, intitulado "Prolegómenos a uma nova ciência do homem", na revista «Ludens» do Instituto Superior de Educação Física da Universidade Técnica de Lisboa (ISEF/UTL), de Outubro-Dezembro de 1979, logo uma oposição desencabrestada visou com remoques insulsos o corte epistemológico e político que acabava de propor. De facto, a passagem do físico ao ser humano em movimento intencional, procurando a transcendência (ou superação) vem dizer-nos que, no desporto, na dança, na ergonomia, na reabilitação, está presente a complexidade humana e não o físico tão-só. E, se a complexidade humana emerge destes quatro aspectos da motricidade humana, importa salientar que não bastam as qualidades físicas, num ser humano em movimento intencional. Ora, há quem não goste de fazer rupturas com o marketing, com a máquina mediática, ou com os critérios mercantis que, hoje, superintendem no desporto ? todos eles ao serviço de grandes e inconfessados interesses.
Há muita gente a quem interessa que o desporto seja, unicamente, uma actividade física, sem espírito crítico, sem pensamento filosófico e político; há muita gente a quem interessa que as licenciaturas em educação física e desporto e que os cursos de treinadores desportivos sejam mais uma prática de respostas do que uma prática de problematização (quem não sabe problematizar, não sabe resolver problemas); há muita gente a quem interessa que se desconheça que o desporto pode ser uma instância normativa. Por isso do desporto mais publicitado e propagandeado ressalta muita comunicação e pouca reflexão, muito esforço físico e pouca imaginação, muito pensamento «light» e pouca utopia. Enfim, este é o reino das "bestas esplêndidas", do "homem-máquina", das actividades unicamente físicas... ao serviço das forças históricas dominantes!

Manuel Sérgio


  
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Edição:

N.º 181
Ano 17, Agosto/Setembro 2008

Autoria:

Manuel Sérgio
Universidade Técnica de Lisboa
Manuel Sérgio
Universidade Técnica de Lisboa

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