Página  >  Edições  >  N.º 178  >  Ampliação da experiência pelo relato

Ampliação da experiência pelo relato

A ampliação da experiência pelo relato, pela escuta e pela troca de experiências para manter o fluxo comunicacional é necessário para a vida em sociedade. O professor, ao perder a sua capacidade de narrar, perde os relacionamentos e a própria identidade. Torna-se um professor decadente pela falta de produção de si e da sua história. No resgate do passado, pelo do ato de lembrar, ele percebe a incompletude do saber sobre certas situações e a possibilidade de outra história, de um outro futuro.
Pelas memórias voluntária e involuntária (Benjamin, 1994), o narrador pode trazer à tona lembranças rotineiras e poéticas e revelar as apropriações de situações que dão hoje o caráter sintético à práxis docente, que acontece na inter-relação entre o pessoal, o universal e o global.
Além disso, há uma sensação de que o professor está aprisionado a estigmas e tabus acerca da sua profissão (Goffman, 1998); está no amparo do tempo construído dentro desses padrões estigmatizados sem conseguir "elaborar o passado", o que "só estará plenamente elaborado no instante em que estiverem eliminadas as causas do que passou" (Adorno, 2003, p.29- 49), já que "o gesto de tudo esquecer e perdoar, privativo de quem sofreu a injustiça, acaba advindo dos partidários daqueles que praticaram a injustiça". Os tabus acerca do Magistério (Adorno, 2003, P.20) e os estigmas (Goffman, 1988) poderiam ser elaborados no relato que exige um ouvinte e uma escuta atenta (Freire, P. 1994), como veremos mais adiante.
Assim, o método (auto) biográfico como estratégia e lugar possibilita ao professor recuperar a comunidade destino (Bosi, E. 1994), aquela a que sempre se retorna pelo relato, pois a linguagem materializa e socializa a memória docente, que unifica e aproxima, no mesmo espaço histórico e cultural, vivências tão diversas como sonhos e lembranças, tornando-as experiências recentes e histórias compartilhadas. Acontece uma identidade, pode-se dizer, na narrativa (Ricouer apud Dartigues, 1988) que encontra elementos biográficos entre o horizonte da expectativa e o universo da experiência.
A produção do si mesmo, através da narrativa, gera uma ambiência tecida entre as expectativas e o futuro, o que faz o educador estar sendo nesse entremeio. O tempo de lembrar (a memória) e o tempo destrutor (esquecimento) são pólos da memória que operam dialeticamente.

Referencias bibliográficas

  • ADORNO, Theodor W. Tabus acerca do magistério. In: Adorno, T. Educação e emancipação. 2a. ed., Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003. 
  • BENJAMIN, Walter. Magia, técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. 7.ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. (Obras escolhidas; v. 1) 
  • BOSI, Eclea. Memória e sociedade: lembranças de velhos. 3.ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. 
  • DARTIGUES, André. Paul Ricoeur e a questão da identidade narrativa. In: Paul Ricoeur: ensaios. C. Marcondes César (Org.) São Paulo: Paulus, 1988. 
  • FREIRE, Paulo. Cartas a Cristina. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994. 
  • ____________. Canção óbvia (1971). In: FREIRE, P. Pedagogia da indignação. São Paulo: Editora UNESP, 2000. (Pedagogía de la indignación. Madrid: Morata, 2001). 
  • GOFFMAN, Erving. Estigma ? Notas sobre a manipulação de identidade deteriorada. 4a. ed., Rio de Janeiro: Koogan, 1988.

Margarita Victoria Gómez


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 178
Ano 17, Maio 2008

Autoria:

Margarita Victoria Gómez
Universidade Vale Rio Verde Minas Gerais
Margarita Victoria Gómez
Universidade Vale Rio Verde Minas Gerais

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo