Falar acerca e, efectivamente, 'produzir' ou construir uma economia fundada no conhecimento (EFC) é como que atirar gelatina contra a parede; é uma coisa muito escorregadia! Parte do problema, é claro, reside no facto de que a EFC, como todas as metáforas poderosas, tem muito trabalho político a fazer e é poderosa precisamente porque pode fazer esse trabalho politico, tendo sempre qualquer coisa para toda a gente, seja qual for a política. Um grupo de elite de organizações internacionais, do Banco Mundial da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e o Fórum Económico Mundial, envolveram-se, com a pretensão de parteiras, em dar à luz este novo projecto dentro das nações e ao nível supranacional. Gostaria de me aqui centrar especialmente no Banco Mundial, que desde 1998 tem andado ocupado a fazer uma grande mudança do seu visual, re-representando-se a si mesmo, não com um 'banco de desenvolvimento' mas um como 'banco de conhecimento'. Esta mudança, sob a liderança do Presidente do Banco James Wolfensohn, assumiu seriamente a ideia de que a maneira como se gere o conhecimento é importante e que o conhecimento é um factor-chave na criação, adopção e comunicação tecnológicas. Um produto desta mesma mudança foi o Programa Conhecimento para o Desenvolvimento [Knowledge For Development (ou K4D)] com o objectivo de auxiliar os países em desenvolvimento a capitalizar a partir da 'revolução do conhecimento'. Especificamente, países em desenvolvimento (e também desenvolvidos) são desafiados a planear investimentos adequados em capital humano, instituições eficazes, tecnologias relevantes, e empresas inovadoras e competitivas. Estes desafios foram traduzidos nos quarto pilares de uma economia fundada no conhecimento: * Um 'regime económico e institucional' que valorize a eficiência e o empreendedorismo * uma população 'educada' * um sistema de 'inovação' eficiente * uma infra-estrutura de 'tecnologia de informação e comunicação' Os quatro pilares assentam na Metodologia de Avaliação do Conhecimento [Knowledge Assessment Methodology - ou KAM] do Banco, um instrumento interactivo de benchmark que consiste actualmente em 83 variáveis estruturais e qualitativas para 140 países de todo o mundo para medir o seu desempenho no âmbito dos pilares da economia do conhecimento em relação a uma imaginada pontuação perfeita. É gerado um Índice da Economia do Conhecimento (IEC) fornecendo uma pontuação geral, embora as pontuações possam ser muito diferentes em cada um dos quatro pilares. O conselho para o desenvolvimento é então construído em torno de uma série de 'linhas de produto'. A 'linha de produto' mais simples é uma avaliação 'faça você mesmo' da própria economia em relação à dos países no seu todo, a outras da mesma região, ao rendimento, etc. O utilizador fica também capacitado para criar um Cartão de Pontuação Básico usando cerca de 14 variáveis, ou aceder a representações mais complexas baseadas respectivamente combinações de 81 variáveis, pontuações de desempenho de todos os países, comparações no tempo, comparações entre países, etc.. Outras 'linhas de produto' incluem o Banco fazer relatórios de políticas para países específicos (por exemplo, El Salvador, Turquia, Marrocos), avaliações gerais (por exemplo Índia, China, Coreia, Chile, região africana), e organizar eventos de aprendizagem para o intercâmbio das melhores práticas. A recente reforma do sistema de ensino superior da Malásia, na esteira da avaliação de 2007 do Banco Mundial, é um bom exemplo de como a KAM está a ser usada para reconfigurar a política e a prática do ensino superior. Sob certos aspectos isto acaba por ser engraçado. Contudo, é algo de muito sério, dado que o benchmarking funciona como um instrumento de aprendizagem. É dada a oportunidade a uma nação para aprender onde se posiciona na imaginada economia do conhecimento perfeita, e depois como pode desenvolver estratégias para alcançar uma posição desejada usando os pilares como guias políticos e como alavancas. Benchmarking, rankings e outras espécies de classificações estão a tornar-se cada vez mais populares enquanto instrumentos para promover tipos específicos de aprendizagens entre instituições, nações e regiões. E estas vão desde o Programa Internacional para a Avaliação dos Estudantes (PISA) até ao Quadro de Pontuação da Inovação da OCDE, e aos Rankings das Universidades e do Índice do Fórum Económico Mundial para a Competitividade. Como todos estes sistemas de ordenação e de benchmarking, a questão mais interessante em relação à Metodologia de Avaliação do Conhecimento do Banco Mundial é o de saber o que é que está a ser medido, porquê e quais serão as suas presumíveis consequências? Deixando por ora de lado a controversa questão da eficácia dos indicadores (como o Índice do Desenvolvimento Humano que é um dos 83 indicadores que constituem a KAM), à medida que se desfiam os 83 indicadores, rapidamente se dá conta da natureza política do projecto; a produção de uma ordem mundial que valoriza o comércio mundial, com algumas proibições sobre importações e licenciamentos, fortes protecções instaladas da propriedade intelectual (PI), um sistema para assegurar o pagamento de direitos e PI através das fronteiras, altos níveis de literacia ao nível dos adultos, linhas terrestres e computadores para apoiar a conectividade global, etc.. Ausente nesta lista de indicadores estão as maneiras de representar o trabalho não pago, os sistemas de produção de conhecimento alternativos, conhecimentos culturais, e por aí adiante. As economias ocidentais desenvolvidas ficam colocadas em vantagem neste tipo de economia - dado o seu interesse em alargar globalmente os seus sectores de serviços e em assegurar maior retorno no ponto alto final da cadeia do valor. Contudo, em áreas como a educação, as alavancas políticas estão ainda pouco afinadas. É difícil ver, por exemplo, como é que os investimentos no ensino superior per se poderão gerar os indivíduos inovadores, criativos e empreendedores, referidos como os motores desta nova economia.
Susan Robertson
|