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Educação & Violência

O espanto de um professor catedrático chamou-me a atenção, recentemente. "Lá, em Portugal?! Puxa, na civilização europeia...". Pois é. Conversávamos sobre o surto de violência de estudantes contra o professorado em plena sala de aula, notícia com letras garrafais em vários veículos da Comunicação Social de países europeus. "A violência é parte do processo da Pessoa humana no seu exercício de Estar comunitariamente, tal e qual o exercício de muitos ouros animais", respondi, "e não interessa qual a Civilização". Olhamo-nos e, respeitando as diferenças ideológicas, continuamos a conversa.
O mundo, há muitos anos, vive com a imagem social de um Portugal de "brandos costumes", construída pela ditadura salazarista [dos Anos 30 aos 70] para encobrir os seus crimes policiais e militares. Uma imagem falsa. No caso do Brasil, a grande massa de emigrantes portugueses viveu e deu a bênção a essa ditadura, pelo que repassou para a sociedade local aquela imagem de "gente que não faz mal a uma mosca". Não é bem assim... São vários os episódios de revoltas internas, de assassinatos, até se chegar ao golpe de Estado de 25 de Abril de 1974, que pôs fim à ditadura salazarista e abriu os caminhos para a pluralidade política e cultural. A própria tomada do Brasil foi um exercício de pura violência contra os nativos americanos, e isso aconteceria com qualquer outro povo que tivesse tido a coragem de lançar âncora nas terras já conhecidas, então, do rei João II, e "herdadas" por Manuel I, pelo Tratado de Tordesilhas.
O que isto tem a ver com a violência nas escolas portuguesas e europeias? Na verdade: tudo. Não conheço Povo que sobreviva em "brandos costumes", e até aqueles portugueses quinhentistas se espantaram ao observarem os povos nativos se devorarem e tomarem muitos dos forasteiros para banquete. É que, não se pasmem!, nós somos a Violência, nós carregamos o instinto animal do qual fomos gerados. E com a precariedade social que se vive, globalmente, é óbvio que essa animalidade fica à flor da pele em muitas circunstâncias.., até em uma sala de aula, onde jamais deveria acontecer. O tal país dos "brandos costumes" chamado Portugal não poderia estar fora deste contexto sócio-político, económico e cultural, pelo que a sua Escola reflecte necessariamente a Crise de Identidade que a Pedagogia não consegue eliminar ou atenuar.
A indisciplina, que é irmã gémea da ignorância, é o foco que irradia o mal estar pelas redes escolares em todo o mundo; e ela vem carregada de um sentimento de "rebeldia absoluta, ou, sem causa", porque se reveste da falta de educação e de carinho familiar, o que o professorado não pode substituir. O que se entende hoje por Indisciplina generalizada tem leito e curso na Família desestruturada e no Poder Público incapaz e corrupto. É isto que não podemos esquecer, e é esta a Lição, entre outras, que se aprende em vários livros do filósofo luso Manuel Reis, que tem dedicado a sua vida ao Ensino, enquanto tal.
Depois do espanto, o professor quis saber por que eu sou tão radical nas minhas afirmações, e eu respondi-lhe que a vida foi e é radical comigo, por isso, tentativas de estabelecer meios termos (pontes) para atenuar situações como a Violência que se alastra na Escola levam, também, a situações como a de reitores de Universidade que vivem corruptamente como qualquer politicalho. Ofereci-lhe um livro de Reis, "Em Demanda Do Multiculturalismo Crítico", e creio que saiu do muro... para tomar vergonha na cara e, talvez, encarar a situação da violência como ela é!
25 de Abril de 2008.
Brasil - Cotia/SP

João Barcellos


  
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Edição:

N.º 178
Ano 17, Maio 2008

Autoria:

João Barcellos

João Barcellos

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