"Os adultos nunca compreendem por si sós, e as crianças se cansam quando precisam explicar-lhes tudo, todas as vezes". Antoine de Saint-Exupéry
No convívio cotidiano aprendemos muitas coisas com as crianças. Aprendemos o quanto nossas próprias ações afetam suas formas de conceber o mundo e as relações que estabelecem com outras pessoas, muito mais do que aquilo que lhes dizemos com afinco. Aprendemos que, sob a ótica infantil, as possibilidades de atribuir sentido nunca se esgotam ou se perdem na rotina. Aprendemos que ser criança, ao contrário do que muitos pensam, não é sinônimo de tolice, ingenuidade ou ignorância. Aprendemos que as crianças são capazes de subverter normas, regras e determinações dos adultos. Aprendemos o quanto criam formas de resistência, como o protesto contra o disciplinamento a que são submetidas nos espaços escolares, o quanto são capazes de dinamizar esses espaços e aprendemos que se comunicam através de muitas linguagens que não se restringem à oralidade e à escrita. Quantas vezes nos surpreendemos com suas tentativas de hipotetizar sobre tudo o que as cerca com seus porquês que polemizam as coisas que nós, adultos, professoras e professores, deixamos passar desapercebidamente, presos que estamos à ordem e à seriedade de nossas tarefas e aspirações. No convívio com as crianças tantas e tantas vezes nos deparamos com questões aparentemente simples, mas que há tempos nos deixamos de fazer, ou que naturalizamos. Por que as crianças têm que freqüentar a escola? Por que agora não é hora de brincar? Por que na escola a gente passa tanto tempo sentado? São perguntas simples lançadas pelas crianças, que mobilizam nossas certezas e nos levam a pensar sobre a pertinência da educação escolarizada nas suas vidas. Aprendemos com essas pequenas dúvidas, para as quais buscamos respostas provisórias, que as crianças estão o tempo todo construindo aprendizagens nas relações que estabelecem com os adultos e que isso não acontece passivamente, como se fossem introjetando nossos modelos sem questioná-los. Aprendemos que as crianças têm vontades, desejos e um papel ativo na sociedade, que sentem e agem em concordância com o período histórico em que vivem e que as infâncias são invenções, assim como as instituições escolares e o ofício de ser professor/professora, ofício que atravessa os tempos demandando novas concepções e novas posturas. Ainda temos muito a aprender com as crianças. É preciso ouvi-las em suas inquietações, que não raras vezes são geradoras de aprendizagens. Vejamos um exemplo: a fala de uma menina de nove anos expressa na sala de aula em que atuo como professora. Com sua manifestação podemos aprender um pouco sobre o que pensam e o que sentem as crianças diante de posturas autoritárias dos adultos: "Eu acho que as crianças não são tão felizes porque os adultos gritam muito com a gente!".
Joice Araújo Esperança
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