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A canetinha prateada
«Psst, Psst», ouvia a Mariana enquanto ligava o computador da escola.
- Psst, Psst, aqui em baixo ? gritava uma canetinha prateada.
- Ah, és tu que me chamas! ? respondeu Mariana aliviada ? O que fazes aqui?
- O meu dono esqueceu-se de mim. Colou-se à Internet e pronto?cabecinha na lua! E tu, já estavas com saudades desta tua escola? ? perguntou a canetinha.
- Eu já não frequento esta escola. Estou no sexto ano de escolaridade. Eu vim para aqui com o meu pai, porque as minhas aulas ainda não se iniciaram.
- Por acaso nunca visitei uma escola como a tua. Diz-me lá como é.
- É muito diferente desta. No princípio fiquei um pouco angustiada. Eram tantas as disciplinas, os professores, cada um com as suas regras?Foi um choque, mas lá me adaptei. A minha avó diz-me que estes choques me fazem crescer. O meu avô desata-se a rir e repete sempre o mesmo: «minha netinha, o problema está na falta de organização do ensino».
- E gostas dos professores?
- Sim?sim?mas alguns não têm a mínima paciência para nós. Ainda me lembro do professor de ginástica: «só digo isto uma vez, só digo isto uma vez». Um dia, ele até me disse que estava um pouco gordinha e precisava de fazer dieta. Eu sei disso, não precisava que ele sublinhasse! O meu pai é que não gostou nada dele, porque tive um dois na nota final. Eu acho que um três não teria sido nada imerecido, na medida em que nunca recusei realizar as actividades e dei sempre o melhor de mim.
- Costumava ouvir uma história semelhante. O meu dono relembrava várias vezes que nunca conseguiremos ser bons em tudo. Por isso é que vivemos numa sociedade. No entanto, deveremos esforçar-nos em todas as tarefas que realizamos. De certeza que a tua professora desta escola foi mais compreensiva.
- Nem sempre. Quando não indiquei os graus dos adjectivos, fiquei virada para a parede durante uma hora. Pelo menos não levei umas galhetas como o José.
- Mas agora já memorizaste os graus dos adjectivos?
- Mais ou menos... Grau superlativo analítico... A minha mãe sempre disse que era uma estupidez ter que decorar estes nomes no 1º Ciclo. Havia coisas mais importantes para aprender nesta idade, mas não adianta barafustar, não é?
-E o José? Que fez ele para merecer tal? Conta-me?
- O José batia nos colegas. A professora fez-lhe o mesmo para o castigar. Sabes, eu tinha pena do José. Ele fazia tudo o que o pai mandava, porque tinha medo dele.
Pois é, Mariana, muitos adultos continuam a confundir respeito e medo. O respeito não se impõe. O respeito conquista-se!
- O José era tão rancoroso! ? lembrou Mariana
- A razão do seu comportamento é muito simples: todo aquele que sofre, procura transmitir o seu sofrimento, por exemplo maltratando os outros.
- Uau! Tu és uma canetinha muito educada. Posso ficar contigo?
- Claro! Assim terei tempo para te explicar que sou simplesmente uma canetinha muito instruída.
- Vou aprender tanto contigo! Estes adultos não sabem mesmo o que perdem. Valorizam coisas tão supérfluas ? rematou a Mariana.

  
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Edição:

N.º 173
Ano 16, Dezembro 2007

Autoria:

Miguel Gameiro Silva
Ponta Delgada. Açores
Miguel Gameiro Silva
Ponta Delgada. Açores

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