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Juventude, cultura visual digital e comunidades virtuais

Vem este breve artigo a propósito de uma série de reflexões que decorrem de um projecto de investigação, em que me encontro envolvido, dedicado a uma análise do graffiti e da denominada street-art. Através deste projecto e de outros em que estive envolvido anteriormente pude aperceber-me da importância que a visualidade, as imagens e a comunicação visual possuem na composição das identidades juvenis. Neste contexto defendo que as novas gerações possuem uma competência visual bastante diferente das gerações que as antecederam, que cresceram com horizontes e tecnologias bem mais limitadas.
Os jovens e as crianças que conhecemos crescem num ambiente onde as tecnologias fazem parte da família, o seu manuseamento e a descodificação da sua linguagem é algo que acontece com naturalidade desde muito cedo. A televisão, o leitor de DVD, o leitor de MP3, o telemóvel, o computador, a máquina fotográfica digital, são ferramentas cada vez mais acessíveis. A meu ver, a literacia visual (e audiovisual) das novas gerações, à qual se acrescenta a facilidade de interacção e manuseio tecnológico, favorecem a expressão visual dos jovens que, actualmente, multiplicam os seus circuitos de comunicação, bem como os formatos comunicativos. Estes não receiam a experimentação partindo dos recursos disponíveis, transformando diferentes elementos do quotidiano em matérias para a comunicação e construção de identidades grupais.
Os media e tecnologias digitais reforçam esta tendência, na medida em que facilitam a criação e circulação de diferentes produtos, criando oportunidades para uma maior inventividade por parte dos jovens. Ao longo do projecto referido, tive a oportunidade de constatar que a máquina fotográfica digital, por exemplo, era uma ferramenta comum entre os jovens que fazem graffiti. Este utensílio assumia um papel central nesta cultura, facilitando o registo de imagens que posteriormente circulam, estreitando redes sociais e contribuindo para a afirmação do estatuto dos diferentes jovens. Os recentemente aparecidos weblogs e os fotologs tiveram um impacto profundo, funcionando como nós de uma extensa rede de comunicação. Através destes os diferentes jovens partilham através de fotografia os graffitis mais recentes, conhecem novos protagonistas, fortalecem laços sociais e disseminam ideias e tendências. Hoje é difícil pensar o graffiti sem a Internet.
Se ao longo do século XX o cinema e a televisão, abriram espaço a uma circulação de imagens e imaginários por todo o planeta, a Internet veio acelerar esta tendência, sendo actualmente um dos principais veículos para a globalização cultural. Através da Internet os jovens têm acesso a um conjunto de informações e recursos sobre expressões culturais distantes, acedendo, ainda, a diferentes protagonistas culturais. Conhecem expressões de graffiti no Brasil, EUA, Alemanha, Espanha ou Reino Unido, acompanhando as vanguardas estéticas. Tive oportunidade de conhecer diferentes writers* que conseguiram viajar e pintar por toda a Europa, com base em conhecimentos e laços que foram estabelecidos unicamente através da Internet. Deste modo, as denominadas comunidades virtuais, longe de significarem apenas um laço ausente, podem potenciar o encontro, a comunicação e a realização colectiva de acções. Os recursos digitais servem, também, como instrumentos de exploração e criatividade obrigando, ainda, a uma constante aprendizagem (em muitos casos autodidacta) dos modos de funcionamento de uma tecnologia em permanente mudança.
Para terminar, acredito que a juventude, em resultado da sua literacia visual e do elevado domínio da tecnologia, possui um papel cada vez mais importante na criação visual contemporânea, fundando novos formatos de comunicação, movimentos estéticos e linguagens que, apesar de por vezes chocarem os adultos, reflectem a natureza criativa, agitada, transgressora e antagonista da juventude.

*Writer: termo que se aplica a alguém que faz graffiti


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 168
Ano 16, Junho 2007

Autoria:

Ricardo Campos
Sociólogo. Doutorando em Antropologia Visual. Universidade Aberta
Ricardo Campos
Sociólogo. Doutorando em Antropologia Visual. Universidade Aberta

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