À procura da democracia
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Em Abril e Maio pomos a democracia à mesa. Estendemos a toalha, cada um traz garrafa, boroa, chouricita, um poema antigo esfarrapado no bolso e uma canção de luta a ferver com o caldo-verde. Os amigos de sempre, os de vez em quando e aqueles de "há quanto tempo!.." evocam momentos de partilha, são companheiros durante uma madrugada imaginada. Acontece um pouco o mesmo nas escolas. Abril e Maio não passam em claro: exposição, vídeo, um poema que se lê numa aula, um cravo em que alguém insiste, uma memória que se perpetua. Porém, a grande questão situa-se a nível da capacidade de se autogerirem quotidianamente, usando a democracia como algo intrínseco. Se ao longo destes mais de trinta anos o Estado continuou a optar por um controlo das escolas bem centralizado - o que, de certa forma, se alicerçou em termos gerais logo em 1976, com uma política normalizadora que optou por uma democracia representativa (parlamentar) em detrimento de uma democracia participativa (popular) ? tal já não parece possível quando esse mesmo Estado pretende que cada Escola ou Agrupamento construa a sua própria autonomia; a gestão democrática que temos tido (melhor do que qualquer reitor, gestor ou especialista porque é eleita directamente pela comunidade escolar) já não sobrevive com atitudes baseadas em direitos adquiridos por representatividade; ou as escolas têm Conselhos Executivos e outros órgãos capazes de serem as "alavancas" impulsionadoras da implicação de todos os membros das comunidades, ou a autonomia resulta no maior insucesso da educação na sociedade portuguesa. O facto - sem discutir agora se se trata de um abandono por parte do Estado - é que a autonomia exige a capacidade de se ser independente e autodeterminado, liberdade só consequente se houver uma responsabilidade que encerre princípios éticos que não consentem falhas e maus hábitos antigos ou novos, pois as escolas passam a estar inseridas nas suas comunidades, às quais prestam contas, ali mesmo, em presença e em cada momento, e não à distância, perante uma Direcção Regional ou um Governo Central cujos inspectores não têm possibilidades de ver o que há de bom ou de mau. Confrontando João Barroso (2006), o processo de Autonomia consistirá: na "delegação de competências e recursos", na"individualização de percursos escolares" e na "horizontalização de dependências". A deslocação de competências dos poderes central e regional para as escolas, a maior emancipação no andamento dos Projectos Educativos e a correlação que será criada com a comunidade local e com todas as escolas vizinhas obrigam a uma postura dos responsáveis pela gestão das escolas que não poderá ter características de gestão "doméstica". Requere-se que a Escola actue de feição democrática dinamizadora e que interaja com uma comunidade local igualmente detentora de hábitos sociais e culturais de participação democrática implicada. Mas surgem duas questões que urge resolver: nem as comunidades locais nem as escolas têm hábitos de vida democrática activa. As razões são simples e prendem-se com as políticas adoptadas pelos dois partidos que têm gerido os governos de Portugal. A inexistência de regionalização em Portugal continua a contribuir para que - ao contrário dos cidadãos de muitos países da CEE (incluindo de Leste) que sabem para onde vão os seus impostos, autárquicos e nacionais - mal saibamos quem é o nosso presidente da Câmara, a não ser que este tenha protagonismo a nível nacional. A maior parte das escolas não tem cultura de vida democrática. Onde estão as assembleias de delegados de turma, as reuniões com os órgãos de gestão pedagógica, as assembleias gerais de escola e a construção de vias comunicantes que levem a informação a todos de igual modo e tragam, com o mesmo direito, a opinião de cada um? Que se fará quando as comunidades recusarem para a Escola Pública o papel instrumentalizador do conhecimento científico ao serviço do poder político e económico? Quando as comunidades tomarem consciência de que não querem pertencer ao país da Europa com maior diferença entre ricos e pobres? Quando resolverem que têm uma palavra a dizer sobre a concepção, a orientação e adaptação dos curricula aos respectivos contextos? Quando reclamarem sobre o tratamento dado aos mais desfavorecidos, às diferentes raças, às questões de género e a outras? Vai ser necessário inventar novas formas de política colectiva, dentro das escolas e à sua volta. Se não, isto vai ser duro.
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Ficha do Artigo
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Edição:
Ano 16, Maio 2007
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Autoria:
Professor do Ensino Secundário
Professor do Ensino Secundário
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