Governo quer certificar um milhão de activos até 2010
Os Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC) vão passar a certificar habilitações equivalentes ao ensino secundário. Até agora, o âmbito de actuação destes centros estava limitado ao ensino básico, que, nos últimos cinco anos, atribuíram graus de equivalência ao 1º, 2º e 3º ciclos a cerca de 50 mil adultos. Agora, o objectivo do governo é mais ambicioso: qualificar 1 milhão de trabalhadores nos próximos 5 anos, 650 mil dos quais através dos centros RVCC. Para isso, a rede será expandida de forma a atingir os 300 centros em 2008 e os 500 em 2010.
No contexto da União Europeia, Portugal é, a par com Malta, o país com os mais baixos níveis de qualificação escolar e profissional entre a população adulta. Os números não são novos, mas vale sempre a pena lembrá-los: 3,5 milhões dos cidadãos activos possuem um nível de escolaridade inferior ao ensino secundário, 2,6 milhões dos quais não atinge sequer o 9.º ano. Entre os jovens com idades entre os 18 e os 24 anos, cerca de 485 mil estão a trabalhar sem terem concluído o 12.º ano, 266 mil sem a escolaridade mínima obrigatória. Cerca de 50 por cento dos jovens adultos portugueses até aos 24 anos não terminou o ensino secundário, ao passo que na UE a média de conclusão se situa acima dos 75 por cento. Para vencer a "batalha da qualificação", como a ela se referiu o primeiro-ministro José Sócrates, o governo alargou em 2006 o número de Centros RVCC, agora denominados "Centros Novas Oportunidades" ? a rede possui actualmente 271 centros, mais 177 do que em 2005 ? e incrementou a oferta de Cursos de Educação e Formação de Adultos. Desde o início deste ano, cerca de 50 dos 271 centros RVCC actualmente em funcionamento avançaram com a implementação do novo referencial de competências de nível secundário. O objectivo é alargar o número de centros para 300 já no próximo ano e chegar aos 500 em 2010, de forma a qualificar um milhão de activos até 2010. O sistema de reconhecimento, validação e certificação de competências é tutelado pela Direcção-Geral de Formação Vocacional (DGFV) e permite que cada cidadão maior de 18 anos, com um mínimo de três anos de experiência profissional, possa certificar os conhecimentos escolares e profissionais adquiridos em contextos pessoal, social e profissional com vista à obtenção de um certificado de habilitação escolar. O novo referencial para o ensino secundário mantém a estrutura que caracteriza o referencial para o ensino básico, mas as áreas de competência-chave foram reduzidas a três: Sociedade, Tecnologia e Ciência; Cultura, Língua e Comunicação; Cidadania e Profissionalidade. A partir desta estrutura, refere-se no documento orientador, "será sempre possível partir de uma situação de vida, até de um dado objecto, para os trabalhar de pontos de vista diferentes mas integrados e integráveis", concretizados através de um total de 22 Unidades de Competência (UC), divididas em 88 competências, demonstradas "através de um conjunto muito diversificado e amplo de critérios de evidência". O número mínimo de UC por cada área é de 7 em STC, 7 em CLC e 8 em CP. De acordo com este referencial, são precisos no mínimo 44 créditos, distribuídos pelas três áreas e relativos a 88 competências, para que os candidatos possam receber um diploma de equivalência ao 12º ano, com cada crédito a corresponder aproximadamente a 12 horas de trabalho, distribuídas por entrevistas, formação, auto-aprendizagem e elaboração do 'portfólio'. Duas publicações estão disponíveis na Internet para consulta: o Referencial de Competências-Chave para a Educação e Formação de Adultos ? Nível Secundário e respectivo Guia de Operacionalização, que podem ser consultados no sítio da Direcção Geral de Formação Vocacional em www.dgfv.min-edu.pt. Outro documento de consulta pertinente diz respeito ao referencial europeu das competências-chave para educação ao longo da vida, que pode ser visto na sua versão inglesa em http://europa.eu.int/comm/education/policies/2010/doc/keyrec_en.pdf Em Portugal, o processo de certificação de competências para o ensino secundário é em tudo idêntico ao utilizado para o ensino básico. Os candidatos começam por demonstrar as competências que adquiriram ao longo da vida, seja em contexto escolar seja através da sua experiência pessoal e profissional, nas três áreas de competências-chave atrás referidas. Esta demonstração processa-se com base na elaboração de um 'portfólio', onde o candidato explicita as experiências que considera significativas para obter a certificação pretendida. Em função da avaliação realizada pelos técnicos dos centros e depois de identificadas as lacunas do candidato, este poderá ter de realizar acções de formação complementares de curta duração, a decorrer no próprio centro ou através de alguma entidade associada, ou encaminhado para um Curso de Educação e Formação (EFA) com a indicação do percurso que deverá desenvolver. Os cursos EFA estão organizados por módulos e permitem um percurso flexível, ajustado à necessidade do candidato, permitindo que este frequente apenas a formação necessária ao preenchimento das suas lacunas formativas. O processo fica concluído com a apresentação e discussão do 'portfólio' realizado pelo candidato, através do qual este demonstra as competências adquiridas perante um júri. Se o painel de avaliadores reconhecer essas competências, valida-as e é emitido um certificado equivalente ao ensino secundário. Apesar de este ser um processo com provas dadas no país e reconhecido pela União Europeia, há quem considere que ele não está a corresponder aos ambicionados critérios de qualidade. Numa recente entrevista à revista "O Direito de Aprender", Licínio Lima, da Universidade do Minho, referia que "a tónica [da educação e formação de adultos] é demasiado instrumental" e que a resposta para o atraso de qualificações se baseia numa política de "qualificar e certificar rapidamente", concluindo que "os centros [RVCC] e os cursos EFA têm uma pressão governamental para a produção de certificados". A coordenadora do novo referencial de competências para o ensino secundário, Maria do Carmo Gomes, tem uma opinião contrária e explica porquê na entrevista que se segue.
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