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Mais uma vez? Roubar aos pobres para dar aos ricos

O espectáculo da oposição acesa entre o governo e o PSD em torno da reforma da Segurança Social é mesmo isso, só espectáculo. Sócrates e Correia de Campos armam-se em defensores do povo quando a única diferença que os separa do PSD é saber se a entrega da Segurança Social aos privados deve ser feita mais de chofre ou por etapas, como preconiza a União Europeia.

Tem estado em debate na Assembleia da República a nova Lei de Bases da Segurança Social, que resulta do acordo assinado pelo governo com as associações patronais e com a UGT, não tendo sido assinado apenas pela CGTP. Durante os debates, não têm faltado as críticas do primeiro-ministro e do ministro do Trabalho à proposta apresentada pelo PSD. Dizem que ela levaria à privatização da Segurança Social e à criação de problemas financeiros muito graves a esta, pondo mesmo em causa o pagamento das pensões aos actuais pensionistas e que, por essa razão o PS nunca o aceitaria.
Ora, a lei do governo, para além de introduzir o chamado "factor de sustentabilidade", que determina a redução continua das pensões dos futuros pensionistas, introduz ainda dois tipos de "tectos contributivos", que representam cedências do governo? precisamente ao PSD.
O governo introduz na sua Proposta de Lei, para além do "plafonamento horizontal" que já fazia parte da lei de Bagão Félix (a aplicar apenas aos trabalhadores com salários mais elevados), também aquilo que se chama o "plafonamento vertical", ou seja, a possibilidade de um futuro decreto regulamentar estabelecer que uma parcela dos descontos de todos os trabalhadores, e não apenas dos que têm salários mais elevados, deixem de ser entregues à Segurança Social e passem a ser aplicados em fundos de pensões privados, que é precisamente aquilo que exige o PSD.
A proposta de lei inclui também um novo ataque ao sistema de segurança social dos trabalhadores da Administração Pública, já que estabelece que deve ser "prosseguida a convergência", o que só pode significar que, se os trabalhadores não o impedirem, o governo pretende aplicar o chamado "factor de sustentabilidade" a toda a Administração Pública. O governo pretende ainda introduzir futuramente uma fórmula de actualização das pensões que não garante aos pensionistas, mesmo aos actuais reformados, o aumento do poder de compra das suas pensões, perpetuando assim a miséria em que vivem a maioria dos reformados no nosso País.

O segredo do negócio

Governo e oposição de direita tentam convencer-nos, com apoio em modelos teóricos complicadíssimos e "indiscutíveis", de que se está a caminho da falência do sistema da Segurança Social. A verdade é que bancos e seguradoras querem deitar mão à gestão desses fundos, que lhes proporcionaria lucros imensos. O clima de catástrofe iminente visa convencer o público de que o sistema é inviável e levá-lo a aceitar sistemas de segurança puramente privada, ao estilo americano.
O problema não é pois técnico, é de saber quem fica com o dinheiro dos descontos para a Segurança Social. O governo do Partido Socialista, aqui como noutros terrenos, faz o papel de "humanista" para melhor fazer passar junto da opinião pública a manobra de toda a classe burguesa que visa entregar ao capital todos os sectores que lhe possam servir de fonte de lucro.
De resto, o que está em causa com a grande batalha do Governo pelo equilíbrio financeiro a qualquer preço é somente a redistribuição dos dinheiros do Estado. Para canalizar anualmente milhares de milhões para o lado do capital em reduções de impostos, apoios, isenções, incentivos, falta necessariamente dinheiro para a Segurança Social, a educação, a saúde.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 162
Ano 15, Dezembro 2006

Autoria:

João António Cavaco Medeiros
Economista/Professor do Ensino Secundário
João António Cavaco Medeiros
Economista/Professor do Ensino Secundário

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