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Actividades dentro e fora da escola: um olhar sobre os novos serviços educativos

Escola pública

Enriquecer o currículo ou apenas prolongar a permanência dos alunos na escola para responder às necessidades dos pais. É neste duplo papel que joga o desenvolvimento de actividades extra-escolares ou extra-curriculares ou ainda de enriquecimento curricular, nos estabelecimentos de ensino. Em Portugal, o ensino primário passou a incluir actividades que permitem aos alunos aprendizagens fora do horário lectivo. Noutros países, as escolas começam a oferecer "serviços" educativos extras. Umas vezes gratuitos, outras pagos com propinas pedidas aos encarregados de educação. Na edição passada dê-mos conta de como estão a ser organizadas as Actividades de Enriquecimento Curricular em Portugal. Nesta edição de A PÁGINA, apresentamos o caso de três países: Reino Unido, Bélgica e Espanha, onde fomos encontrar outros exemplos de como as escolas se estão a organizar neste domínio. Finlândia, Suécia e França, serão os sistemas educativos a analisar na edição de Janeiro de 2007.

Reino Unido
Escolas em prolongamento de horário: abertas 10 horas por dia

"Do amanhecer ao anoitecer", assim titulava o jornal "The Guardian", de 13 de Junho de 2005, a notícia sobre a intenção do Governo britânico em manter as escolas primárias abertas das oito às 18 horas. BR>As designadas ? "extended schools" ? escolas em prolongamento de horário, foram anunciadas pela secretaria da Educação Ruth Kelly, com o propósito de ajudar os pais oferecendo aos alunos um conjunto de actividades extracurriculares programadas para depois das aulas. Este ano, muitas escolas já estenderam os seus serviços de prolongamento de horário às férias de Verão, mantendo algumas actividades em funcionamento, noticiou o "The Guardian", na edição de 1 de Agosto, de 2006.
O Governo marcou na agenda politica a data de 2010 para que todas as escolas não apenas do ensino primário, mas também do secundário, passassem a oferecer um conjunto de serviços educativos e de lazer adicionais não só aos alunos mas à comunidade em geral.
Na lista de actividades que as escolas podem oferecer em prolongamento de horário definidas pela secretaria de Estado da Educação constam: clubes de trabalhos de casa, de apoio ao estudo, desporto (duas horas por semana no mínimo), música, dança, expressão dramática, artes, trabalhos manuais, clubes temáticos (como de xadrez), cursos de primeiros socorros, visitas a museus, galerias, aprendizagem de uma língua estrangeira, acções de voluntariado, aconselhamento aos pais e serviços de apoio à família.
No documento "Escolas em prolongamento de horário: acesso de oportunidades e serviços para todos", publicado pelo Departamento para a Educação e Competências britânico, onde a medida é apresentada, lê-se que estes serviços "não vão implicar mais trabalho, nem responsabilidades adicionais para os professores".
Cabe à escola assegurar a contratação das pessoas mais indicadas para desenvolver as diferentes actividades, recorrendo para isso a entidades privadas ou a prestadores de serviços especializados. "As autoridades locais podem ajudar a escola a identificar os recursos necessários ao desenvolvimento destes serviços", lê-se ainda no documento. Por um lado, porque "têm acesso a fundos que podem ser usados para o seu financiamento"; por outro, "podem ajudar na criação de parcerias".

Financiamento

A verba governamental fixada para a implementação da escola em prolongamento de horário foi de 50 milhões de libras para o arranque inicial das actividades extra-curriculares entre 2003 e 2005, 110 milhões de libras para 2005/2006, 194 milhões de libras em 2006/2007 e 238 milhões de libras para 2007/2008. O financiamento foi disponibilizado por intermédio das autoridades locais, mas prevendo "os desafios" que a implementação destas actividades colocariam, o Governo providenciou um fundo adicional directo às escolas que rondou os 100 milhões de libras este ano lectivo e alcançará os 150 milhões de libras em 2007/08.
Apesar deste financiamento, o documento que regula as actividades é claro em referir que o seu desenvolvimento tem de ser "sustentável". E alerta: "Cabe às escolas a iniciativa de gerar os meios financeiros à execução das actividades." Para isso, lê-se ainda no mesmo documento, as escolas podem candidatar-se a fundos previstos pelo Governo para determinados Planos Nacionais, como o do Desporto Escolar e Ligação Estratégica aos Clubes, e também a fundos específicos, como o Fundo Europeu, isto mediante o aconselhamento junto da autoridade local.

Fornecedores de serviços

"Não se espera que o professor seja o fornecedor dos serviços extracurriculares, embora se espere que alguém assuma um papel de coordenação." O esclarecimento fornecido pelo documento "Escolas em prolongamento de horário: acesso de oportunidades e serviços para todos", descarta a hipótese de o prolongamento de horário das escolas ? sejam primárias ou secundárias ? poder vir a implicar horas de trabalho extra para os professores. "As escolas devem assegurar que não existem pressões ou trabalho adicional para os professores", lê-se, antes "cabe-lhes procurar a melhor pessoa para prestar os serviços", sejam: professores assistentes, jovens trabalhadores, pessoal técnico, organizações locais ou instrutores (no caso da actividade desportiva).


Bélgica
Prolongar o horário de funcionamento é decisão da escola

No sistema educativo belga as escolas primárias públicas não são obrigadas a funcionar em regime de prolongamento de horário. Ainda assim, qualquer actividade extracurricular é organizada pela escola e realizada com pessoas contratadas para o efeito. Por norma, este serviço é facultativo e quando existe pode até ser pago pelo encarregado de educação ou pela sua entidade patronal.
Durante as férias escolares - quatro interrupções no ano lectivo acrescidas de dois meses no Verão - as escolas encerram e toda a actividade educativa é suspensa. Não há aulas para crianças, nem actividades extra-curriculares. Portanto, os professores efectivos e os contratados ficam desobrigados das suas tarefas no estabelecimento de ensino. Durante a semana, as escolas fecham uma tarde, normalmente à quarta-feira.
Eddy Macquoy, professor da escola pública de Appeltuin, Leuven veria com agrado que as escolas pudessem ser obrigadas a organizar actividades de prolongamento. "Nos últimos tempos, na nossa escola há cada vez mais casais em que os dois pais trabalham, portanto, há uma necessidade crescente do funcionamento em regime de prolongamento de horário", escreve o professor contactado por email pela PÁGINA. A escola primária onde lecciona já responde a esta necessidade: abre as portas às 8h e encerra às 18h30. Ainda que as aulas só comecem às 8h45. "O acolhimento de manhã é feito pelos professores, em rotatividade, mas fora do seu horário de trabalho", esclarece Eddy Macquoy.
Na maioria dos casos, os estabelecimentos de ensino primários encerram às 16h. A escola de Appeltuin, no entanto, funciona em regime de prolongamento de horário, mantendo-se aberta até às 18h30. Um serviço realizado, diz o professor, por " três pessoas", a quem a escola paga com a atribuição de verbas feita para este efeito e com as propinas, ainda que mínimas, pagas pelos pais dos alunos. Há entidades patronais que aceitam pagar aos funcionários os custos do prolongamento do horário dos seus filhos, bem como a participação em outras actividades extra-curriculares que acontecem fora da escola.
A este respeito, Eddy Macquoy esclarece: "Na Bélgica existe um sistema de "aulas de floresta" e "aulas de neve", em que as turmas do primário inferior (o equivalente ao 1º ciclo do sistema educativo português) e do primário superior (o equivalente ao 2º ciclo) passam uma semana em cada uma destas actividades."
A entidade patronal financia estas aulas como se de um abono extra-ordenado se tratasse. Os custos entram nas despesas correntes da empresa, diminuindo o lucro e fazendo diminuir o escalão de IRC. É uma medida que se assemelha ao sistema de mecenato.

Quem organiza?

Os estabelecimentos de ensino têm autonomia para decidir quem contratam para organizar as actividades extra-escolares que oferecem aos seus alunos. Muitas escolas recorrem a centros de actividades extra-escolares existentes na comunidade geográfica onde se inserem. Em muitos casos, estes centros funcionam das 6 horas às 20 horas permitindo aos pais maior flexibilidade em termos da "guarda" dos seus educandos. "Este serviço é mais caro para os pais!", adianta Eddy Macquoy que afirma conhecer pelo menos uma escola que opera nestes moldes. Ou seja: onde a partir das 15h30 todas as crianças obrigatoriamente passam a frequentar o centro onde se organizam as actividades extra-escolares. "Assim a escola está vazia a partir das 15h40 da tarde e de manhã as crianças só são levadas - do centro para a escola - 10 minutos antes de começarem as aulas."
Por outro lado, esclarece o professor, "as escolas que organizam elas próprias as suas actividades trabalham muitas vezes com contratos pouco interessantes e com pessoal não qualificado". Uma situação que, segundo Eddy Macquoy, originou recentemente um pedido do sector do ensino público ao Ministério da Educação para um acréscimo de 15 mil lugares destinados ao acolhimento de crianças e do respectivo reforço orçamental para as escolas.

Financiamento

O orçamento dos estabelecimentos de ensino é alimentado, em primeiro lugar, pela transferência de verbas do Ministério da Educação para a escola ou o agrupamento de escolas. Estas verbas são atribuídas em função do projecto educativo apresentado, sendo que este pode ou não incluir as actividades de prolongamento. As verbas suportam os custos com os salários de todo o pessoal docente e não docente e os gastos com o equipamento pedagógico. A escola tem autonomia para acrescentar receitas próprias a este financiamento, para assim completar o seu orçamento.


Espanha
Actividades fora e dentro do horário lectivo

Desde 1990, figuram no sistema educativo espanhol as denominadas Actividades Complementares e Extra-escolares (ACE). São actividades distintas, mas com um objectivo comum.
"Tanto as actividades complementares como as extra-escolares contribuem de forma decisiva para o desenvolvimento do processo educativo, tanto pelo seu aspecto académico, como no âmbito da socialização e integração dos alunos", lê-se no documento do Ministério da Educação e Ciência espanhol que as regula.
As actividades complementares são de carácter didáctico e frequência obrigatória por parte dos alunos. Por isso, são gratuitas e devem ser desenvolvidas dentro do horário lectivo. Os conteúdos fazem parte do programa, mas assumem um cariz diferenciado pelo momento, espaço ou recursos que utilizam. Exemplos: as visitas ou viagens de estudo, trabalhos de campo ou actividades de comemorações.
Extra-escolares, são consideradas as actividades desenvolvidas fora do horário lectivo, ou no tempo compreendido entre a sessão de aulas da manhã e da tarde dentro do horário de permanência dos alunos na escola, mas não em horário docente. Como a participação dos alunos é voluntária, estas actividades não podem conter ensinamentos incluídos no programa docente das áreas curriculares nem ser objecto de avaliação, podendo ser pagas. Ambas são desenvolvidas pelas escolas e destinam-se não só ao ensino primário, mas também ao secundário.

Quem organiza?

No ensino primário, a tarefa de promover, organizar e desenvolver as actividades complementares e extra-escolares cabe a uma equipa constituída pelos professores que nelas participam. No secundário, essa tarefa incide, não sobre uma equipa, mas sobre um departamento criado para o efeito. Em ambos os casos, a chefia quer da equipa quer do departamento é assumida por um professor com vínculo efectivo à escola. Isto porque o cargo tem uma duração de dois (no ensino primário) e quatro anos (ensino secundário).
As escolas primárias, com a aprovação dos conselhos escolares, podem estabelecer convénios de colaboração com associações ou entidades sem fins lucrativos para o desenvolvimento das ACE. Estes convénios devem ser autorizados pelo delegado provincial do Conselho de Educação e Ordenação Universitário.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 162
Ano 15, Dezembro 2006

Autoria:

Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação
Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação

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