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Um amigo de natal
A 15 de Dezembro, o João, ar cabisbaixo quase a tocar o tapete, entrou no Executivo preso à mão do empregado. A acusação, na voz de corneta do sr. Olimpo, podia ter-se ouvido em toda a escola:
- Este aluno atirou as meias do Luís pela janela, no vestiário! E é impossível recuperá-las!
O vento batia à janela instigando o castigo e a chuva contribuía para que imaginasse os pés gelados do companheiro nas duras botas.
Retirado o sr. Olimpo, o João pespegou os olhos no chão e nunca mais de lá os tirou. Poço calado. Sem alocução não havia hipótese de sentença; telefonou-se à mãe, que falou com ele: nada; o professor de Ed. Física pouco sabia; o delegado de turma, verdade ou mentira, não tinha visto. E o João, com o afinco de há uma hora atrás, olhos no mesmo ponto sagrado.
Só então me lembrou a vítima. O Luís entrou, com umas sapatilhas encharcadas que não teriam a sola toda. Desta vez, deixei a voz ecoar:
- Então por que é que este malandro te deitou as meias fora?
Olharam um para o outro, maravilhados. Nos olhos esbugalhados do Luís, duas lágrimas límpidas e enormes:
- Fui eu que lhe pedi, tinham uns buracos enormes. Mas não queria que a minha mãe soubesse?
E os lábios do João esgueiraram um sorriso de bravura.
Tinha sabido guardar com firmeza o segredo de um amigo. Tomaram muitos adultos! Que melhor prenda de Natal?
Mandei buscar umas peúgas do equipamento da escola e dei-as ao João para que as oferecesse ao companheiro.

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 162
Ano 15, Dezembro 2006

Autoria:

Rafael Tormenta
Professor do Ensino Secundário
Rafael Tormenta
Professor do Ensino Secundário

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