Página  >  Edições  >  N.º 161  >  Do nascimento das telecomunicações

Do nascimento das telecomunicações

Como e quando

Costuma dar-se por um facto adquirido, quanto ao arranque das telecomunicações, a demonstração, por Samuel Morse, da ligação telegráfica ?eléctrica? entre o Congresso dos EUA, em Washington, e a gare de caminho de ferro, em Baltimore. Acrescenta-se com frequência o ano da sua realização, 1844, e, por vezes, mesmo o dia e o ano, assim como a distância de 70 Km separando os telégrafos instalados em cada um dos extremos da ligação referida - talvez com o objectivo de que tais detalhes ajudem definitivamente à verosimilhança e à credibilidade de tal asserção. O próprio autor do texto presente tem procedido de tal modo em certas ocasiões.
Trata-se, aliás, de uma maneira de sinalizar acontecimentos muito própria desta nossa modernidade. Ademais é uma forma de destacar informação relevante que é estimulada pelo ambiente mediático em que as nossas sociedades têm estado imersas. Por exemplo, se eu tivesse que elaborar uma pergunta, para um dos populares concursos televisivos que pretendem combinar entretenimento com cultura [geral], acerca do pai fundador / inventor da telegrafia ?eléctrica? poderia colocar Morse em alternativa a Bell - ligado à invenção do telefone -, Wheatstone - ligado a um telégrafo ?eléctrico? concorrente - e Henry - de quem Morse colheu a ciência e o saber fazer sobre a utilização do electromagneto para a recepção das mensagens -, sendo, claro, Morse, a resposta a dar como solução correcta. Seria uma pergunta difícil. O mesmo aconteceria para as datas, confrontando 1844 com 1837 - o ano da demonstração do telégrafo de ?morse? por Morse -, 1855 - a data entrada em funcionamento da rede telegráfica portuguesa, mais precisamente em Setembro desse ano - e 1876 - quando Bell demonstrou oficialmente o telefone. Qualquer delas, perguntas muito mais difíceis do que a efectuada na televisão francesa sobre se era a Lua, o Sol, Vénus ou Marte, que girava em torno da Terra - e neste caso o concorrente falhou, pronunciando-se pelo Sol, depois de ter pedido ajuda ao público, que votou maioritariamente no Sol.
No entanto, nem Morse fez tudo sozinho, nem sequer tudo o que era mais relevante, nem Wheatstone, a quem foi atribuído a solução rival à de Morse, o telégrafo ?eléctrico? de agulhas, que teve não pouca voga - inclusivamente, a sua primeira ligação, entre Paddington (que o visitante actual de Londres conhece bem como nó de Metro e de caminho de ferro) e Slough -, em 1841, ou seja, três anos antes da famosa ligação de Morse entre Washington e Baltimore, nem Wheatstone, dizíamos, teve a iniciativa de avançar por ele mesmo.
E, se neste último caso, o do britânico telégrafo de agulhas, foi Cooke que desafiou Wheatstone para avançarem conjuntamente, no caso de Morse - pintor e professor universitário de Belas Artes, em Nova Iorque -, aquele a quem designam com frequência como o seu assistente principal, Vail - mecânico de profissão -, foi de facto o parceiro indispensável de Morse em vários dos aspectos tecnológicos, o parceiro daquilo que teve a ver com o criar de específico saber fazer. Com efeito, sendo certo que Morse foi beber muito do que estava realizado em termos de electromagnetos a Henry, professor universitário de electromagnetismo - com o qual manteve grande controvérsia a propósito das patentes -, já nomeadamente a chave morse, o registador de papel à recepção e o alfabeto morse são sobretudo atribuíveis a Vail, que acabou por participar nas patentes de Morse e, por fim, morreu na miséria.
Enfim, se Morse foi o empreendedor, o ?campeão?, o gestor do projecto pelo qual o arranque das telecomunicações é conhecido, o que não deve continuar na sombra é ter sido Alfred Vail que, na realidade, se manifestou a centelha de génio que deu inicio ao caminho das ciência e prática da codificação em telecomunicações.


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 161
Ano 15, Novembro 2006

Autoria:

Francisco Silva
Engenheiro, Portugal Telecom
Francisco Silva
Engenheiro, Portugal Telecom

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo