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Poliana

Chama-se Poliana porque os pais foram membros do Partido Comunista Brasileiro dos tempos de Luís Carlos Prestes. Esse engenheiro militar nascido em Porto Alegre comandou uma "grande marcha" pelo interior do Brasil. Começou uma luta armada que se estendeu de Santo Ângelo no Rio Grande do Sul, à Foz do Iguaçu no Paraná. Chefiou 1500 homens e durante 29 meses percorreu 25000 quilómetros pelo interior do Brasil. ?Cavaleiro da Esperança?, chamou-lhe Jorge Amado em 1942. Amado que por ele escreveria ?Os Subterrâneos da Liberdade?, em 1954.
Prestes voltou ao Brasil clandestinamente em 1935, casado com a alemã Olga Benário. Novamente preso, ainda em 1935, ficou assim nove anos, enquanto Olga Benário, grávida, foi deportada do Brasil e morreu no campo de concentração nazi de Ravensbrück. Só regressaria ao ?País do Carnaval? após a amnistia de 1979. Seria afastado de Secretário-Geral do PCB. Apoiaria depois a candidatura de Leonel Brizola ao governo do Rio de Janeiro, o que motivou a sua expulsão do partido em 1982.
Poliana tem esse nome em honra de Lev Tolstoi, nascido em Yasnaya Poliana em 1828, tendo aí vivido durante 60 anos, a 200 quilómetros de Moscovo. Tolstoi que seria uma das fontes do movimento pedagógico chamado ?Escola Nova?.
Poliana é descrente. Pedagoga, como ainda se diz no Brasil, fala do trabalho e dos alunos. Enquanto fala refastela-se com enormes bocados de alcatra, cupim, coração, maminha, farofa, feijão preto. ?Não quero ser um novo Tolstoi, nem uma repetição de Prestes?, diz ela. ?Que vá tudo prá PQP, entendeu?? ? Sim, entendi. E então? ?Então que se dofa! Isto sempre foi assim: quem procurou atalhos encontrou sofrimento. Não quero ser bandeira de nada. Lembro-me de viver em Marília, não havia muros por toda a parte. Agora vivemos na prisão. A verdade é como uma nuvem: modifica-se e desaparece. Somos guiados por paixões, os nossos objectivos não são claros. Há uma ética hedonística, indispensável à sociedade de consumo, somos submetidos aos seus apelos, na rua, quando vamos ao cinema, quando vemos televisão. Falam-nos de prazer, de compras, de férias. Depois, quando trabalhamos, volta a ética do trabalho, a produtividade, o combate às faltas, a hierarquia.? Hum? e os alunos? ? Com eles é o mesmo, diz Poliana. Sobretudo com os mais abastados, talvez com os teus alunos. Vivem num mundo maravilhoso; um dia acabam os estudos e não estão preparados: passam ao universo do trabalho, às vezes de repente. Estamos todos a criar inadaptados, até o meu nome, Poliana, é resultado de uma inadaptação à História!


  
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Edição:

N.º 159
Ano 15, Agosto/Setembro 2006

Autoria:

Carlos Alberto Mota
Univ. de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), Vila Real
Carlos Alberto Mota
Univ. de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), Vila Real

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