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Plano Nacional de Leitura importante oportunidade de debate

Como anda a leitura recreativa nas escolas? E, já agora, a ?orientada? e a ?leitura para informação e estudo? que com aquela perfazem os tais 25 por cento? Ainda andarão? E se não andam, como é mais do que evidente, não será importante perceber as razões, para que o Plano Nacional da Leitura, no que à aula de Português diz respeito, não tenha o mesmo destino? O debate nacional, a exemplo do inglês, pode começar precisamente por aqui ...

Em Agosto de 1997, o governo trabalhista do Reino Unido, a seguir à sua vitória em Maio desse ano, deu início ao seu plano nacional, não de leitura, mas de literacia ? a chamada National Literacy Strategy (NLS) que pôs em polvorosa diversos sectores da sociedade britânica. A polvorosa não decorria, no entanto, da novidade da iniciativa já que ela era um desenvolvimento do National Literacy Project ? projecto-piloto do governo conservador anterior que os trabalhistas decidiram alargar a todo o país. O objectivo da NLS era claro: conseguir que, em 2002, 80 por cento dos alunos de 11 anos atingissem o nível quatro ou superior (em cinco) na avaliação de Inglês. A estratégia era simples: criação da Hora da Literacia, em todas as escolas do ensino básico, estruturada segundo um quadro apertado de objectivos de ensino; a declaração do ano de 1998/1999 como o Ano Nacional da Leitura, visando, por este meio, aumentar os níveis de leitura em toda a comunidade; a revisão da formação inicial dos professores; a promoção do envolvimento dos pais no apoio à aprendizagem da leitura dos seus filhos. À veemência das críticas iniciais, designadamente sobre a falta de sustentação teórica e evidência empírica para os efeitos da Hora da Literacia, a desconsideração das diferenças económicas, culturais e cognitivas das crianças ou a demasiadamente forte regulação desse tempo lectivo, contrapôs-se a opinião entre os professores de que, sendo o currículo nacional (imposto cerca de dez anos antes) demasiado aberto, a estruturação que agora se propunha era fundamental para a organização do ensino.
Diga-se, ainda, que nos múltiplos estudos que foram escrutinando o desenvolvimento da estratégia, a ênfase nacional que assim era colocada na literacia era o aspecto mais positivamente assinalado.
Dadas as semelhanças entre esta inglesa estratégia para a literacia e o nosso português Plano Nacional de Leitura é possível que as críticas venham a ser da mesma natureza, com as mesmas ou opostas motivações, é possível? Mais produtivas serão, contudo, as semelhanças que conseguirmos encontrar ao nível do debate nacional que tal estratégia provocou, esse, sim, com poder para colocar a literacia na hora do dia, cá como lá.
Mas uma pergunta parece também óbvia: andaremos nós ?a reboque?? Talvez não, pelo menos totalmente! Porque nós, no que diz respeito a horas de literacia/leitura, até quase podemos dizer que somos precursores? Recordemos, por isso, os Programas de Português do Ensino Básico ? do 1º ao 3º ciclo - de 1991 (ainda em vigor, note-se), que estipulam, por um lado, que a leitura, aí fortemente valorizada, ocupe 25% do tempo lectivo global e, por outro lado, que, dentro desta, cerca de 30% seja dedicado à leitura recreativa, a qual era apresentada do seguinte modo: ?O aprofundamento da relação afectiva com a leitura exige o contacto dos alunos com os livros enquanto objectos, o acesso a uma grande variedade de obras, a vivência de situações que propiciem o prazer imediato da leitura e afirmação da subjectividade do leitor?. Grosso modo não são estas as pretensões do Plano Nacional quando se centra nas actividades da sala de aula e define os tempos e a natureza das actividades aí a levar a cabo?
Ora, como anda a leitura recreativa nas escolas? E, já agora, a ?orientada? e a ?leitura para informação e estudo? que com aquela perfazem os tais 25 por cento? Ainda andarão? E se não andam, como é mais do que evidente, não será importante perceber as razões, para que o Plano Nacional da Leitura, no que à aula de Português diz respeito, não tenha o mesmo destino? O debate nacional, a exemplo do inglês, pode começar precisamente por aqui, desde logo contrariando, veementemente, quem considera que esta iniciativa só terá sucesso se os programas forem mudados.


  
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Edição:

N.º 158
Ano 15, Julho 2006

Autoria:

Maria de Lourdes Dionísio
Universidade do Minho
Maria de Lourdes Dionísio
Universidade do Minho

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