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Sabotador-mor

O jovem Norberto precisa de uma cadeira de rodas especial para a sua plena integração na Escola. Custa 20 mil euros, mas essa ?é uma despesa muito grande para a Direcção Regional de Educação Especial? ? explicaram. Porém, em 2005, os clubes e associações desportivas receberam, para despesas correntes, 22.8 milhões de euros. Revoltante!

A história conta-se em poucas palavras. Li-a na revista do DN-Madeira de 04.06.06. O jovem Norberto foi uma criança normal até aos onze anos de idade. Hoje, devido a uma doença degenerativa, assiste às aulas, em casa, através de um sistema de videotelefone. A sua plena integração na escola só será possível se dispuser de uma cadeira especial e de um transporte diário entre o local onde vive, no meio da Seara Velha (Curral das Freiras) e o estabelecimento de ensino. A cadeira custa cerca de 20 mil euros, mas essa ?é uma despesa muito grande para a Direcção Regional de Educação Especial? ? explicaram. Certamente, uma história semelhante a tantas outras de um país onde existem mais direitos do que justiça. Revoltante, quando se sabe, apenas a título de exemplo que, por aqui, em 2005, o governo regional distribuiu, pelos clubes e associações desportivas[1], um total de ¤ 22.856.491,00. Já agora, só mais um pormenor: entre 2001 e 2005 o governo atribuiu ao desporto um total acumulado de subsídios no montante de ¤ 130.718.169,00 (33%) de um somatório de ¤ 396.090.339,00 a associações, câmaras municipais, desporto, cultura, educação, empresas e instituições religiosas.
O curioso é que o mentor desta política continua a disparar para todos os lados, como se fosse, à luz daqueles dados, um paraíso de virtudes e a Região um exemplo de um projecto político humanista. Recentemente, a propósito da Revolução de Abril, voltou a atacar os Órgãos de Soberania com palavras e expressões impróprias. Desse extenso rol, pergunto, afinal, quem é o ?sabotador?, o ?ayathola?, o ?sacerdote fundamentalista? igualzinho ?aos do regime de 28 de Maio?, o ?corporativista? e ?anti-democrático?, o que anda de orgasmo em ?orgasmo parolo?, isto é, de inauguração em inauguração, com masturbatórios discursos de garganta? Quem será? Quem, à escala da vida política madeirense, é omnipresente em tudo o que é instituição, impõe o medo, castra o pensamento e cria uma sociedade submissa? Quem é o gerador de um falso desenvolvimento, que ao longo de três décadas, criminosamente, agrediu o ambiente, cimentou a paisagem, petrificou a consciência cívica e ofendeu através de palavras e actos? Quem endivida, diariamente, as actuais e futuras gerações? Quem e com que interesses permitiu que o poder político ficasse refém do poder económico? Quem permitiu os tais ?gangs à solta? e, daí, as fortunas, umas mal explicadas, outras, absolutamente previsíveis? Quem é o culpado político pelos alegados casos de corrupção que o Tribunal julgou e julga? Quem não soube gerar políticas de família, daí resultando mais de meio milhar de jovens em risco, muita droga (entre os 13 e 30 anos, 1293 são já dependentes de drogas duras), alcoolismo, violência e crime, enquanto correm milhões para actividades não prioritárias? Quem é o responsável pelo sofrimento de idosos, muitos abandonados nos corredores dos hospitais, outros, em desespero por uma vaga num lar? Quem é que subtraiu a autonomia aos estabelecimentos de ensino, subordinando as escolas e os professores a uma educação burocrática e sem rumo? Quem é que se serviu do desporto como meio de propaganda e não de educação, deixando a Região no fundo da tabela europeia? Quem?
Sabotagem é isto. Sabotagem é comprometer o futuro mesmo admitindo que por incompetência política e não por deliberada intenção. Igualzinho aos do 28 de Maio é aquele que gerou uma sociedade controlada e culturalmente assimétrica. O sabotador-mor, de tanto falar dos ?tipos do 28 de Maio? parece, lá no fundo, desejar o seu regresso. Até realizou, nessa data, o último Congresso do seu partido. Não se tratou de uma coincidência. Aproveitou esse dia para, ao som da charanga que toca, ininterruptamente, há trinta anos, dar vivas e insultar quem pensa de forma diferente. O sangue (político) que o alimenta é, de facto, o mesmo que marcou 48 anos de intolerância. O ?modus faciendi? é que é outro. 
Enquanto isto acontece, o Norberto continua, para ali, dependente da caridade que lhe permita viver, plenamente, a escola pública.   

[1] Fonte: Economia & Empresas, DN-Madeira, 13.03.06.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 158
Ano 15, Julho 2006

Autoria:

André Escórcio
Mestre em Gestão do Desporto. Professor do Ensino Secundário, Funchal
André Escórcio
Mestre em Gestão do Desporto. Professor do Ensino Secundário, Funchal

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