O governo trabalhista de Tony Blair anunciou recentemente um vasto plano de reformas no sistema educativo deste país prevendo, entre outras medidas, um acréscimo substancial do papel dos pais, das empresas e das diversas confissões religiosas no ensino público. Esta controversa reforma, destinada, de acordo com o governo, a oferecer uma maior ?independência? às escolas e mais possibilidade de ?escolha? aos encarregados de educação, foi apresentado no Parlamento pela ministra da Educação Ruth Kelly, perante a reserva dos deputados trabalhistas e a satisfação dos deputados conservadores. Kelly referiu na ocasião que esta reforma coloca a Grã-Bretanha perante uma ?viragem histórica que lhe permitirá ter escolas de nível mundial?. O aspecto mais relevante desta proposta de Lei é a possibilidade de os estabelecimentos de ensino poderem passar a optar por um estatuto de ?fundação?, categoria que lhes permitirá ter autonomia em matéria de gestão, de recrutamento dos professores, de selecção dos alunos ou de escolha dos programas. Estas fundações poderão ser geridas por empresas privadas, confissões religiosas ou inclusivamente por associações de pais, explicou Ruth Kelly, adiantando que empresas como a Microsoft, a consultora KPMG ou a Igreja Anglicana já se mostraram interessadas em assumir a gestão de algumas destas instituições. Várias vozes levantaram-se já para criticar o papel acrescido das instituições religiosas e a vontade demonstrada pelo governo em facilitar a passagem de escolas privadas para o domínio do financiamento público. ?Certos movimentos religiosos extremistas são muito poderosos, e a possibilidade de terem acesso a crianças vulneráveis a troco de quase nada é para eles um sonho tornado realidade?, acusa Keith Porteous Wood, presidente da Sociedade Britânica para a Laicidade. Esta orientação de confiar a gestão das escolas públicas a diferentes igrejas ou religiões remonta ao século XIX. Actualmente, das cerca de 20 mil escolas básicas ou secundárias existentes no país, cerca de sete mil são confessionais e a maioria (mais exactamente 6955) está nas mãos das igrejas Anglicana e Católica. Com a chegada de Tony Blair ao poder, em 1997, este processo sofreu um impulso. No ensino público, existem hoje 36 escolas judaicas, cinco escolas muçulmanas, duas escolas sikh, uma escola grega ortodoxa e uma escola gerida pelos adventistas do 7º dia. Entretanto, já foi dada luz verde à criação de outras nove escolas públicas religiosas, entre as quais a primeira escola hindu, em Londres. Muitos inquietam-se com o acentuar destas diferenças no campo educativo. No início de Outubro deste ano, o rabino Jonathan Romain, líder de um movimento para a reforma e modernização do judaísmo, afirmou que ?mesmo as escolas confessionais mais sérias promovem a segregação entre alunos judeus, muçulmanos e católicos, ajudando a criar um sistema educativo de apartheid que conduz a ?guettos? religiosos?. Para Salman Rushdie, autor de ?Os Versículos Satânicos?, aumentar o número de crianças inscritas em escolas confessionais não resolverá o problema dos extremismos, como o muçulmano. ?Se Tony Blair pensa que mais religião resolverá o problema, não só está equivocado como mostra que está desligado da vontade do povo?, disse recentemente o escritor. De facto, de acordo com uma recente sondagem, 64 por cento dos britânicos opõem-se ao financiamento das escolas religiosas com o dinheiro dos contribuintes.
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