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Excerto de Diário de um filho de professor

O meu pai tem chegado a casa nervoso e a barafustar contra o governo. Diz que não gosta de ser bode expiatório que parece ser uma forma de atirar as culpas para os outros. Nem tampouco se importa com as listas que andam a fazer para quem fez greve.  Parece que quem faz greve são os preguiçosos que não gostam de trabalhar. É o mesmo que ser sindicalista ou comunista, acho eu. Pelo menos é o que se tem ouvido na televisão e o que escrevem os senhores dos jornais.
Tenho aprendido nos últimos tempos novos sinónimos; comunista quer dizer bandido, malfeitor. Espero que o meu pai não seja comunista senão ainda vai preso. Ele anda preocupado. Hoje à noite ouvi-o a folhear um livro como quem não o lê. Não dorme e anda com mau aspecto. É terrível andarem sempre a dizer mal de nós. Eu queria ser professor quando fosse grande mas agora vou ter que pensar melhor. Não quero que me andem a insultar em público e a dizer que vivo à custa de outros. 
Eu só queria ter coragem para abraçar o meu pai e dizer-lhe que gosto muito dele e por mim acho o máximo ele ser grevista e essas coisas todas que lhe chamam. Eu gosto muito dele.


  
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Edição:

N.º 148
Ano 14, Agosto/Setembro 2005

Autoria:

Paulo Frederico F. Gonçalves
Professor, Porto
Paulo Frederico F. Gonçalves
Professor, Porto

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