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Território e poder: o papel da Universidade Pública - I

É cada vez mais evidente que não podem existir ideias sem território e que qualquer território potencializa conteúdos estratégicos políticos. As investigações feitas sobre o modo de apropriação espacial permitiram uma melhor compreensão dos problemas da exclusão social, da esgotabilidade energética e matérias-primas e da contaminação planetária. Evoluíram as concepções sobre a paisagem e modificou-se também a imagem da natureza. Esta metamorfose levou a abandonar pontos de vista mecanicistas do território. Estas e outras questões são abordadas neste texto que, por razões de espaço, se publica em Junho, Julho e Agosto.

Até aos anos 70 do séc. XX, as abordagens sociológicas pouco levavam em conta a problemática do território e as ciências do território fixavam-se em preocupações tecnicistas não se abrindo à problemática social.
A nova condição social que o paradigma emergente fez surgir, revela-se em vários trabalhos que a partir desse período vêm revelando a interacção sistémica do lugar e do social.
Foucault, debruçando-se sobre o texto de Jeremy Benthan ? O Panóptico ? revelava o papel determinante dos dispositivos topológicos como organizadores da vida social permitindo, graças ao envelope que representam, conteúdos de poder. A investigação de Foucault mostrava que os referidos dispositivos topológicos poderiam ser formas de poder repressivo ou de enquadramento normativo, ou até mesmo libertários, consoante essa forma exprimia o carácter político do poder exercido. O livro ?Vigiar e punir?(1) tornou-se um exemplo essencial para a leitura geopolítica do discurso do poder.
Por seu turno Henri Lefebvre(2), em múltiplos trabalhos sobre a reprodução do poder, revelou a importância decisiva do território ? do urbanismo e da urbanização territorial ? como a substância que moldava percursos e trajectos de comportamentos sociais e individuais.
Esta filosofia geopolítica esteve de algum modo presente no pensamento conservador mas alheia, como se disse, à investigação sociopolítica progressista.
A leitura territorial da política era essencialmente assumida por militares como Vauban, Clauswitz e Haussman que tiveram também papel de arquitectos ou de planeamento urbano.
Mas a geografia e o planeamento territorial, só nos últimos anos do séc. XX esteve sujeita a uma reflexão epistemológica que permitiu retirar o carácter neutral ou universal em que viviam as ciências do território, a arquitectura e o urbanismo.
Yves Lacoste, num livro célebre dos anos 70(3), colocava duma forma clara a sua reflexão: ?a geografia serve para fazer a guerra?. Tal era o título dessa sua obra!
Desmoronava-se assim o ponto de vista das ciências do território, da arquitectura e do planeamento territorial como ciências neutras ou puramente técnicas.
Hoje é cada vez mais evidente que não podem existir ideias sem território e que qualquer território potencializa conteúdos estratégicos políticos. Nestes últimos anos as investigações feitas sobre o modo de apropriação espacial permitiram uma melhor compreensão dos problemas da exclusão social, da esgotabilidade energética e matérias-primas e da contaminação planetária. Evoluíram as concepções sobre a paisagem e modificou-se também a imagem da natureza. Esta metamorfose levou a abandonar pontos de vista mecanicistas do território.

1) ?Surveiller et punir?, M. Foucault, Ed. Gallimard, Paris1975
2) ?Le droit a la ville?, Henri Lefebvre, Ed. Seuil, 1974
3) ?La géographie, ça sert, d?abord, à faire la guerre?Yves Lacoste, Ed. FM petite collection maspero, Paris, 1976


  
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Edição:

N.º 146
Ano 14, Junho 2005

Autoria:

Jacinto Rodrigues
Fac. de Arquitectura da Univ. do Porto
Jacinto Rodrigues
Fac. de Arquitectura da Univ. do Porto

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