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Os modelos de universidade e as questões do género

Mas o início do fenómeno da feminização, como alunas, nesta velha instituição multissecular, muito anterior às escolas públicas das primeiras letras, só vai acontecer em meados do século XIX, nos Estados Unidos e, em finais do século, no Reino Unido.

Fazendo a intersecção das questões do género com os vários modelos de universidade destacamos no modelo medieval, a grande ênfase dada ao ensino, a ligação dos saberes à teologia e a ausência das mulheres.
Mais tarde, com as reformas de Humboldt na Prússia e as de Napoleão em França ocorre o advento do modelo de universidade moderna. O seu papel redefine-se, partir dos finais do século XVIII e o traço dessa modernidade está na centralidade que a razão passa a ocupar, no novo quadro epistemológico. O ensino passa a ser concebido como um instrumento da busca do conhecimento, desinteressado e liberto de pressões exteriores (Magalhães, 2001). Mas o início do fenómeno da feminização, como alunas, nesta velha instituição multissecular, muito anterior às escolas públicas das primeiras letras, só vai acontecer em meados do século XIX, nos Estados Unidos e, em finais do século, no Reino Unido (Verger, 1994). Ele acontece de forma ainda mais tardia se nos debruçamos sobre o caso português, o que não é de estranhar dado que, em pleno final do século XIX, ainda se questionava sobre a natureza das mulheres (Araújo, 2000). Quanto à entrada das mulheres como docentes, nas universidades portuguesas, aconteceu ainda mais tarde, acompanhado por resistências a nível social e familiar. 
Com a chegada do empreendedorismo, assiste-se de novo a mudanças na universidade. Destacamos, em especial, as que aconteceram a partir da década de 1980, perante os desafios impostos pela nova economia. O modelo de universidade empreendedora passa a orientar-se por regras de mercado ou quasi-mercado, com tónica na competitividade, produtividade, racionalização de custos, investigação que traga vantagens e atracção de alunos e novas relações com os stakeholders(1) (Amaral e Magalhães, 2000).
Muitas das implicações daí advêm, nomeadamente, a própria valorização ou desvalorização de determinadas áreas de ensino, de determinado tipo de investigação e de relações de trabalho (Santos, 1994).
Estudos realizados em países anglo-saxónicos revelam-nos os efeitos das orientações de teor neo-liberal no mundo académico. Estas perspectivas, denominadas por investigadores internacionais como managerialistas(2) vão exigir novas formas de trabalho académico (Deem, 2001:10).
Os estudos de Brooks e Mackinnon (2001) são particularmente importantes para nos alertar sobre algumas questões, não apenas sobre as questões do género, mas de outras que estão subjacentes e que determinam a própria missão da universidade na sociedade. Eles tornam-se ainda mais pertinentes porque as formas de organização e gestão das universidades cada vez mais se assemelham, orientando-se para princípios manageralistas  mais ou menos hegemónicos.

Notas:
1) Termo utilizado por Alberto Amaral e António Magalhães (2000) nos seus estudos, para significar o conjunto de pessoas ou entidades com legitimo interesse no ensino superior e  como tal, adquire algum direito de intervenção.
2) Termo que traduz um conceito, ligado às ideias acerca das mudanças nos modos como as instituições passam a ser geridas nas sociedades ocidentais, copiando formas de gestão dos meios empresariais (Deem, 2001:10).
No próximo número retoma-se neste espaço a rubrica Lugares da Educação.

Bibliografia

  • AMARAL, Alberto e MAGALHÃES, António, (2000).? O conceito de stakeholder e o novo paradigma do ensino superior?, Revista Portuguesa de Educação, vol.13, nº2 (p.7-28) CEEP, Universidade do Minho.
  • ARAÚJO, Helena Costa (2000) Pioneiras na Educação: as Professoras Primárias na Viragem do Século.1ª edição, Porto: Afrontamento.
  • BROOKS, Ann e MACKINNON, Alison (eds.) (2001) Gender and the Restructured University: Londres. Open University Press.
  • DEEM, R.(2001)?Globalization, New Managerialism, Academic Capitalism and Entrepreneurialism in Universities: is the local dimension still important??, Comparative Education, vol. 37 (1) p.p. 7 - 20.
  • MAGALHÃES, António (2001) Higher Education Dilemmas and the Quest for Identity: Politics, Knowledge and Education in an Era of Transition, University of Twente.
  • SANTOS, Boaventura de Sousa (1994) Pela Mão de Alice. O Social e o Político na Pós-Modernidade. 7º edição, Porto: Edições Afrontamento.
  • VERGER, J ; C. Charles (1994) Histoire des Universités.Paris: PUF.

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 146
Ano 14, Junho 2005

Autoria:

Arcelina Santiago
Professora e consultora de formação. Licenciada em Filologia Germânica pela FLUP. Pós-Graduação em Ciências da Educação e mestre em Ciências Sociais, Políticas e Jurídicas pela UA.
Arcelina Santiago
Professora e consultora de formação. Licenciada em Filologia Germânica pela FLUP. Pós-Graduação em Ciências da Educação e mestre em Ciências Sociais, Políticas e Jurídicas pela UA.

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