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Quando o "belo feminino" se torna um pesadelo e uma obrigação

A beleza é, em sua própria essência, algo muito relativo. Prova disto, é que os padrões de beleza modificaram-se no decorrer da história da humanidade. Dentro deste contexto, a mulher continua sendo o alvo mais visado da ?estética? corporal dominante em nossa sociedade.
A maior propagação dos ?modelos de beleza? ocorre através dos grandes meios de comunicação social, os quais reforçam os ditames do consumismo capitalista, construindo um padrão de ?beleza? dado como obrigatório.
A corrida desenfreada para as academias de ginástica e para a medicina estética, o uso de produtos dietéticos para emagrecer, a anorexia e a bulimia, revelam uma espécie de ?ditadura da beleza? à qual a maioria das mulheres se condiciona em busca de um corpo ?perfeito?.
Antes considerada um atributo da natureza, a beleza passou a ser encarada como uma questão de ?conquista? e, nesta lógica, é necessário investir muito dinheiro e tempo a fim de se alcançar a aprovação da sociedade. A beleza, ou melhor, a feiúra, acabou gerando um lucrativo mercado no mundo capitalista. Com muita propriedade, a escritora americana Noemi Volf afirma, em seu livro O mito da beleza, que ? a beleza é um sistema monetário assim como o ouro. É o último e o melhor sistema de crenças que mantém a dominação masculina intacta. Assim, o capitalismo usa as mulheres ?bonitas? como isca para a venda dos seus produtos, lucrando com a discriminação das consideradas ?feias? que buscam o maior número de produtos possíveis para compensarem sua ?feiúra?.?
A figura da mulher é exposta e explorada como um ?objeto?. Os grandes meios de comunicação social vêm desempenhando um papel decisivo, através de revistas, jornais, comerciais, novelas e programas em geral, contribuindo, desta maneira, com a afirmação de um padrão de ?beleza?. Um exemplo a ser considerado, são os programas de televisão, principalmente os humorísticos, onde as mulheres são apresentadas, em sua grande maioria, como figuras bonitas e atraentes, porém, imbecis, desprovidas de idéias e vontades. Constantemente, em contraste a esta figura, encontra-se uma mulher feia. Esta, por sua vez é apresentada como uma pessoa chata e desinteressante, embora, algumas vezes dotada de certa inteligência. Estes estereótipos reforçam a idéia de que são os ?dotes físicos? de uma mulher que realmente importam.
A discriminação do corpo da mulher também ocorre, de uma forma específica, através da maioria dos concursos de beleza, onde somente as mulheres jovens e que se enquadram nos padrões estéticos impostos, podem participar. Com este intuito, estas mulheres são avaliadas por meros critérios físicos. Analogicamente pode-se comparar os concursos de beleza com as mostras de gado, realizadas em muitos estados do Brasil, onde os animais desfilam na frente dos jurados e juradas que adotam critérios para a avaliação física destes, como por exemplo, o tamanho e a textura dos pernis, das paletas, a postura e desenvoltura do animal e, no caso das vacas, seus úberes. 
Lamentavelmente, este exemplo evidencia a forte discriminação da mulher como ser humano, ditada pelo mundo masculino e, muitas vezes, aceita pelas próprias mulheres. A ideologia de ?beleza física? acaba gerando uma inversão de valores, nos quais a busca por um corpo perfeito, é considerada um sinônimo de aceitação social, geralmente confundida com a felicidade.
Embora as mulheres, ao longo de muitos anos, com muita luta e persistência, tenham conquistado direitos e se afirmado em vários espaços da sociedade, lamentavelmente, ainda é ?normal? continuarmos sendo vistas e consideradas pelos contornos físicos de nossos corpos, o que evidencia um empobrecimento da capacidade de olhar o ser humano.  Como afirma Maria Rita Kehl, ?a maior beleza está no corpo livre, desinibido em seu jeito de ser, gracioso porque todo ser vivo é gracioso quando não vive oprimido e com medo. É a livre expressão de nossos humores, desejos e odores; é o fim da culpa e do medo que sentimos pela nossa sensualidade natural; é a conquista do direito e da coragem a uma vida afetiva mais satisfatória; é a liberdade, a ternura e a autoconfiança que nos tornarão belas. É essa a beleza fundamental.?

Revista Espaço Acadêmico/a Página da Educação

 


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 144
Ano 14, Abril 2005

Autoria:

Rosângela Angelin
Militante feminista e doutoranda em Direito na Universidade de Osnabrûck, Alemanha
Rosângela Angelin
Militante feminista e doutoranda em Direito na Universidade de Osnabrûck, Alemanha

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