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Quem quer saber?

As tentativas oficiais de ajudar a criar soluções para que a população cigana deixe as franjas da sociedade e, passe a viver uma vida de cidadania plena em Portugal, conheceram algum incremento na derradeira década do século XX.

Parece um antigo pregão, mas não é. Apenas retomo o tema da escolarização das crianças ciganas, agora, por intermédio do elo fundamental que dá pelo nome de educação intercultural. 
As tentativas oficiais de ajudar a criar soluções para que a população cigana deixe as franjas da sociedade e, passe a viver uma vida de cidadania plena em Portugal, conheceram algum incremento na derradeira década do século XX.  
Em especial no ensino, em 1991 foi criado o SCOPREM substituído, em 2001, pelo Secretariado Entreculturas, que ficou na dupla tutela da Presidência do Conselho de Ministros e do Ministério da Educação, cuja produção de materiais veio colmatar uma lacuna sentida no domínio intercultural.
Para a escolarização das crianças ciganas, publicou, entre outros, um conjunto de livros da colecção europeia «Interface», abrangendo temáticas variadas e, que também propiciam abordagens diversificadas no ensino em geral. Privilegiar a sua cultura, história e, organização social foram preocupações dos autores, que os elaboraram respeitando o rigor e a clareza. A língua romani, as origens da sua história e estudos de caso, são exemplos de temas nela incluídos. Trata-se de uma colecção a merecer a máxima atenção dos professores (porém, de que percentagem é conhecida ou, quantos deles a usam amiúde?) e, por isso mesmo, a exigir aplicação em contexto de aula, vocação primeira da sua já longa existência (remonta a finais dos anos oitenta).
Coube ainda ao Secretariado recolher, compilar, registar, analisar e publicar (Base de Dados, I a VIII, desde 1992-93 até 1996-97) os dados estatísticos referentes ao conjunto dos alunos por grupo cultural ou, pelo conjunto dos estudantes que frequentavam (no início e no final de cada ano) a Escola pública no espaço continental. Contemplando os ensinos básico e secundário a sua distribuição era concelhia, por distrito, dando a conhecer os dados compilados por grupo cultural ou, pelo conjunto dos estudantes. A recolha, efectuada escola a escola, permitia, através da consulta da base informatizada, realizar múltiplos estudos detalhados. Em 1998, todavia, a base saiu da gestão do Secretariado e, na prática, deixou de existir e, a sua falta continua a fazer-se sentir. De resto, várias entidades a nível internacional recomendam a existência de compilações similares para se poderem analisar tendências, corrigir trajectórias, aperfeiçoar estratégias, i.e., melhorar o que assim o exige. Ainda há dias, a Agência das NU-Habitat lamentava a escassez de dados estatísticos sobre o  Povo Cigano em Portugal.
Um trabalho pioneiro que existiu, e que deveria ter tido melhor sorte.
Através dele foi possível conhecer, com rigor, a evolução escolar (e a respectiva distribuição geográfica) dos alunos ciganos e, é por força da sua actual inexistência que se voltou à situação anterior de palpitar, desconfiar, presumir, ou seja, a pior maneira de abordar questões já de si tão complexas e, a merecerem sê-lo com sensatez. A realidade mostrou que a saída precoce do sistema e o abandono eram elevados (revestindo especial gravidade e, por isso, a pedir actuação consentânea, o caso específico das alunas) e, que havia um fosso entre o número dos alunos que ficavam pelo 4º. ano do básico e os poucos que prosseguiam até ao 9º. ano. Só em casos excepcionais transitavam para o secundário ou cursavam no universitário.
O trabalho realizado pelo Entreculturas parece ter ido ?por água abaixo?. Avaliações, balanços, são desconhecidos. Diz-se que não está extinto mas, a página na Internet (www.sg.min-edu.pt/entreculturas.html) indica a última actualização em Maio/2003. Semear para não colher parece irracional, além do desperdício de recursos financeiros, sempre tão parcos, donde a pergunta no título ser pertinente. Logrará obter resposta?
A Ana Laura Valadares cá estará, no próximo número com "Touch my back & I snore".


  
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Edição:

N.º 139
Ano 13, Novembro 2004

Autoria:

Elisa Costa
Historiadora
Elisa Costa
Historiadora

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