AVALIAÇÃO
Como aprendem as crianças?
Muitas são as teorias sobre aprendizagem e desenvolvimento infantil que nos ajudam a olhar para a sala de aula, para nossos alunos, para suas formas de aprender e nossos modos de ensinar. Porém, em muitos casos, parecem se referir a crianças diferentes das que lidamos em nossos cotidianos.
Um discurso amplamente divulgado e aceito que afirma a aprendizagem como processo singularmente vivido pelos estudantes convive com a necessidade de adequar os diferentes ritmos e possibilidades de percurso ao tempo definido pela escolarização. O ensino demarca o limite da flexibilidade para o tempo de aprender, por se vincular a objetivos homogêneos aos quais todos devem alcançar. Freqüentemente, nas salas de aula, crianças não correspondem aos modelos de aprendizagem e desenvolvimento que conhecemos, sendo percebidas como crianças que não aprendem. Por que são identificadas desse modo? O que as caracteriza? Não aprendem o quê? O movimento individual, comparado ao modelo pré-definido, produz uma classificação das crianças, postas numa hierarquia de acordo com seus diferentes ritmos. Os alunos cujos processos diferem dos padrões são vistos, porque compreendidos, como aqueles que não aprendem. A prática avaliativa predominante se refere a etapas pré-determinadas às quais todos os alunos devem atingir, mesmos quando se considera o ensino-aprendizagem numa perspectiva processual, em que a variedade de ritmos é prevista. No cotidiano escolar ouvimos falar de crianças que não acompanham a turma; que não realizam as atividades no tempo esperado; que copiam, mas não lêem; que não escutam, enfim, crianças sempre acompanhadas pela palavra não. Diante desse quadro, como compatibilizar a identificação de crianças que não aprendem com as teorias que nos informam que a aprendizagem ocorre por diferentes caminhos, demandando diversos processos? Seria a não aprendizagem outro modo de expressão da aprendizagem? A prática classificatória, ao comparar a criança real com a idealizada, não nos ajuda a responder à difícil pergunta que nos acompanha a cada dia: como aprendem as nossas crianças? Que pode ser acompanhada por outra: o que sabem os que são vistos como os que nada sabem? A avaliação classificatória, embora dominante, não é a única. Defendemos a avaliação como uma prática de investigação, que nos convida a dialogar com o processo pedagógico do qual participamos e com cada um dos sujeitos que compartilham o trabalho realizado na sala de aula com a finalidade de melhor compreender a dinâmica ensino-aprendizagem. Como parte dessa dinâmica, a ação avaliativa se propõe a investigar os diversos percursos realizados, resultados apresentados, obstáculos encontrados, soluções produzidas cotidianamente na sala de aula. Contribui, desse modo, para que a professora conheça melhor seus alunos(as), em especial, aqueles que apresentam trajetos ainda não elaborados nas teorias que sustentam as ações docentes. Aqui se revela especialmente relevante o modo como o erro é apreendido no processo de avaliação. Se na perspectiva classificatória o erro demarca o não saber, a impossibilidade, a incapacidade, a falta, fazendo da criança que erra a criança que não aprende, na ótica da investigação, o erro sinaliza o movimento que vem sendo realizado pela criança no processo ensino-aprendizagem do qual participa. O erro, assim considerado, indica as aprendizagens já realizadas, os saberes consolidados e, também, novos saberes ainda em elaboração, portanto, espaços potenciais de novas aprendizagens, espaços privilegiados para a intervenção pedagógica. A avaliação como prática de investigação colabora para potencializar os movimentos de interação e interlocução em que alunos e professoras(res), trocam saberes, compartilham desconhecimentos, dialogam sobre suas experiências, partilham descobertas, criando na sala de aula um clima mais solidário e menos solitário de aprender-ensinar.
Bibliografia: ALVES, N. & GARCIA, R.L. Os sentidos da escola. Rio de Janeiro, DP&A. 1999. ESTEBAN, M.T. (org.) Avaliação: uma prática em busca de novos sentidos. Rio de Janeiro, DP&A. 1999. SAMPAIO, C.S. Avaliar o processo de aquisição da escrita: desafios para uma professora pesquisadora. In: ESTEBAN, M.T. (org) Escola, Currículo e avaliação. São Paulo, Cortez, 2003.
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