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Problemas e dilemas

ÉTICA E RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL

Todo o ser humano, logo que vem ao mundo, herda a responsabilidade de levar uma vida que esteja à altura das suas possibilidades biológicas, psicológicas e sociais. Confrontado com os inúmeros possíveis que se lhe oferecem, desenvolve atitudes, mas ainda assim é preciso que a educação, no sentido lato do termo, recebida na sua infância e ao longo de toda a sua vida, o prepare para a prova de discernimento nas suas escolhas.
(Frederico Mayor, 2004)

Tal como nos é lembrado pelo antigo director geral da UNESCO, Frederico Mayor, a responsabilidade de estar vivo obriga-nos a «fazer da vida a nossa vida», fruindo-a, amando-a e honrando-a em cada escolha, em cada decisão e em cada acto. Colocado no plano da responsabilidade profissional, este imperativo convoca-nos para uma reflexão de carácter ético que, conforme temos vindo a advogar, terá que ser profundamente enraizada no quotidiano, atenta ao pulsar do mundo e suficientemente próxima do próximo. Para poder contribuir para o desenvolvimento de outros, ajudando-os a aprender a estar à altura das suas possibilidades, é preciso que nós próprios ? os educadores ? estejamos preparados para a prova de discernimento moral. São múltiplas e de natureza multifacetada as situações que, no dia a dia, reclamam essa capacidade. Basta começar por considerar os problemas, e dilemas, gerados pela exigência de proximidade com o outro ? o educando. Por um lado, sabemos que sem proximidade não existe verdadeira oportunidade de encontro e de comunicação. Ela é necessária à escuta atenta, ao contacto sensível e à relação de cumplicidade que sustenta o contrato pedagógico. Sobretudo quando vivida no frente a frente, ela traz a marca do afecto, sinal inequívoco da humanidade que desejamos promover em cada ser humano e que, afinal, faz a diferença das escolas com alma e identidade.
Por outro lado, no entanto, há que salvaguardar a distância requerida por uma intervenção técnica e cientificamente suportada ? profissional. Ou seja, uma intervenção racionalmente controlada, subordinada a uma intenção pré-definida e capaz do recuo crítico necessário a uma decisão efectivamente reflexiva e autónoma. Falamos então em «princípio da distância óptima», expressando assim a necessidade, e a dificuldade, de equilíbrio numa posição simultaneamente próxima e distante. Tanto mais que, em situação de classe, a atenção dirige-se a um conjunto de pessoas. Que o mesmo é dizer, seres absolutamente ímpares, excepcionais, inimitáveis e incomparáveis. Na actividade docente, a tarefa consiste, justamente, em criar condições que permitam evidenciar a personalidade de cada um dos educandos, a sua liberdade, o seu enigma, o seu modo único de ser. E é enquanto sujeito contaminado pelos acontecimentos que dão sentido ao esforço de viver que o educador contagia, interpela e ajuda a abrir caminhos pessoais. Para poder reconhecer-se como profissional, a atitude pedagógica não tem que ser, não poderá ser, uma atitude fria ou isenta da ameaça de risco inerente a toda a aventura humana. Mas ela não pode, também, ser armadilhada pelo sentimento, tornada refém do jogo de bem e mal querer que alimenta os mistérios da amizade ou do amor. Obrigados a viver na linha de fronteira entre o pessoal e o profissional, os educadores precisam de referências éticas, de pontos de apoio, de valores que ajudem a estruturar um espaço de reflexão e de exercício profissional colegialmente partilhado.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 133
Ano 13, Abril 2004

Autoria:

Isabel Baptista
Universidade Católica, Porto
Isabel Baptista
Universidade Católica, Porto

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