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Lógica de empreiteiro

Entre o VI Governo Constitucional (Sá Carneiro ? 03 Jan. 80) e o XII Governo (Cavaco Silva ? 28 Out. 95) medeiam quase dezasseis anos de ministros [da educação] indicados pelo PSD.

Concordo, em absoluto, com o Presidente do Governo Regional da Madeira quando, há dias, assumiu que o Ministério da Educação deveria ?ter sido saneado há muito tempo?. Referia-se, certamente, a Valente de Oliveira, Carlos Braga, Vítor Crespo, Fraústo da Silva, José Seabra, Deus Pinheiro, Roberto Carneiro, Diamantino Durão, Couto dos Santos, Manuela Ferreira Leite e David Justino, ministros indicados pelo PSD que, desde 1978, lideraram a pasta da Educação. Figuras do PS, apenas constam as de Sottomayor Cardia (1976/78 ? I e II governos constitucionais) e, recentemente, as de Marçal Grilo, Oliveira Martins e Augusto Silva, dos governos liderados por António Guterres. Conclui-se, portanto, que a prevalência partidária é do PSD, com um dado significativo: entre o VI Governo Constitucional (Sá Carneiro ? 03 Jan. 80) e o XII Governo (Cavaco Silva ? 28 Out. 95) medeiam quase dezasseis anos de ministros indicados pelo PSD. Ora, se os resultados em matéria de política educativa, onde se inclui o desporto, reflectem-se a prazo, posso então dizer que a falência do Sistema do Educativo tem como responsável primeiro o PSD. E se é verdade o que o Dr. Alberto João Jardim disse sobre a irresponsabilidade histórica dos ministros do PSD, também é verdade que deveria se ver ao espelho relativamente à sua irresponsabilidade em matéria de política educativa na Região onde detém, há 28 anos, uma maioria absoluta. Se, entre outros dados, o analfabetismo apresenta, ainda, uma deplorável taxa de 12,7% contra 9% do Continente; a baixa qualificação dos continentais atinge os 64% e, na Madeira, 68%; o nível de escolaridade incompleta da população activa empregada é de 20% no 1º Ciclo (Continente 15%) e de 27% no 2º Ciclo (Continente 21%); o ensino superior completo é de 8,6% no Continente e de 6,5 na Madeira (dados de 2001); a taxa de abandono antes de concluído o 9º ano é de 29,8% na Madeira contra 24,6% no Continente e, ainda, se os resultados das sucessivas avaliações não são abonatórios para a Região, posso concluir que o Dr. Jardim cuspiu para o ar ao se atirar aqueles que apelida de ?colonialistas?.
Face aos dados é falso que o problema educativo na Região resida, como afirmou, nas Leis Gerais da República. Aliás, a alínea o), do Artigo 40º do Estatuto Político-Administrativo da RAM define, como matéria de interesse específico da Região, a ?Educação pré-escolar, ensino básico, secundário, superior e especial? e, nesse pressuposto, todos os diplomas puderam e alguns até foram, embora desadequadamente, adaptados aos interesses do Dr. Jardim. Foi, por exemplo, o caso do Dec. Lei da ?Autonomia, Administração e Gestão dos Estabelecimentos de Ensino? O problema é, portanto, outro e define-se em duas palavras: incompetência política. De facto, ao Presidente do Governo Regional nunca interessou ter uma escola de participação activa, aquela que nasce de necessidades sentidas, democrática, atenta, inclusiva, prospectiva, de qualidade, envolvente, que apaixona, que co-responsabiliza e desenvolve o sentido de pertença, que interage com o mundo, simultaneamente, uma Escola social, que disciplina, que institui princípios, valores e impõe rigor e qualidade na docência e nas aprendizagens. Pelo contrário, sempre quis ter um pé em cima da comunidade educativa, impondo a Escola heterónoma, amarrada, subserviente, de pensamento único, de conflito permanente com o principal sindicato de professores e de mitigada autonomia, do tipo ?sejam autónomos na execução das decisões que já tomámos por vós?, como, noutro contexto, sublinhou o Doutor Licínio Lima, da Universidade do Minho.
É óbvio que uma política educativa não se esgota na construção de estabelecimentos de ensino ou de espaços desportivos. No desporto, enquanto 24.145.144,00 milhões de Euros de subsídios (2003) mantêm um balofo crescimento e desenvolvimento desportivo regional, com 295 praticantes ?importados?, oriundos do Continente e de outros trinta países (demografia federada de 2002), para assegurar a representatividade qualitativa da Região, aquele que se pratica na Escola não tem a expressão quantitativa desejável (10,7% do universo escolar) e é de baixa qualidade, fundamentalmente porque é mais tolerado do que apoiado. É caso para dizer que o Dr. Jardim tem sido um bom empreiteiro mas um mau político.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 133
Ano 13, Abril 2004

Autoria:

André Escórcio
Mestre em Gestão do Desporto. Professor do Ensino Secundário, Funchal
André Escórcio
Mestre em Gestão do Desporto. Professor do Ensino Secundário, Funchal

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