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Da educação do Governo e da clientela política

A União Europeia definiu em 2001, em Lisboa, metas educativas ambiciosas para atingir em 2010. A Europa afirmava pretender basear a sua economia numa dinâmica e competitividade do conhecimento, que fosse capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos e com maior coesão social.

Recentemente, a Comissão Europeia concluíu que as estratégias e os objectivos [delineados na Cimeira de Lisboa] não se concretizaram ao ritmo desejado e programado.
É esta a conclusão expressa no documento de trabalho ?Educação e Formação para 2010 ? A Urgência das Reformas Necessárias para o Sucesso da Estratégia de Lisboa?.
Dos indicadores europeus quantificados e pretendidos para 2010, justifica-se referir o pouco empenhamento do governo português na sua consecução.
Em 2002, o abandono escolar precoce (percentagem da população entre os 18 e os 24 anos com apenas o ensino básico e que não está a estudar ou em formação) posiciona-nos no pior lugar da tabela com 45,5%, enquanto a média da União Europeia é de 18,8%.
Mas igualmente preocupante é a verificação da diminuição do abandono escolar ocorrida no início da década de 90 e o seu posterior aumento a partir de meados desta mesma década, que remetem o país para índices de há pelo menos 10 anos.
Relativamente à conclusão do ensino secundário só 44,9% da população com 22 anos termina este nível de ensino, enquanto a União Europeia atinge os 75,4%.
No que se refere às aprendizagens básicas, 26,3% dos nossos alunos com 15 anos têm capacidade de leitura igual ou inferior ao nível 1 da escala de competência em leitura.
Mas também na área da formação ao longo da vida Portugal possui o pior índice da União Europeia.
Só 2,9% da população portuguesa entre os 25 e os 64 anos participou em acções de formação nas quatro semanas anteriores ao inquérito formulado em 2002, enquanto a média da União Europeia atinge os 8,5%.
Também nas áreas do Ensino Superior e Investigação Científica o cenário português é francamente negativo.
No que se refere à igualdade de oportunidades (homens/mulheres) o diferencial é de 26% a favor do sexo masculino.
Temos a mais baixa taxa de diplomação de toda a União Europeia e possuímos também a mais baixa de diplomação em Matemática, Ciências e Tecnologias.
A Comissão, não obstante a dura e crua realidade, reavaliou as estratégias e objectivos e definiu algumas acções prioritárias, como por exemplo, sugerir que cada estado-membro concentre as reformas e os investimentos nas áreas que considere determinantes, que cada estado-membro defina programas globais e concretos nas áreas da educação e formação e que cada estado-membro utilize o programa ?Educação e Formação para 2010? como um instrumento de formulação, acompanhamento e avaliação das políticas nacionais.
Perante estes dados era naturalmente exigível que o Governo tomasse opções políticas capazes de responder adequadamente aos nossos deficits.
Mas o Governo prefere investir no nosso afastamento, pelo quarto ano consecutivo, da média de crescimento da União Europeia.
O Governo opta por hipotecar o futuro do país e dos portugueses.
O Governo opta por submeter o país aos ditames do Pacto de Estabilidade.
Ao longo destes quase dois anos de governação, a maioria PSD/CDS/PP tudo tem feito para transformar as escolas em empresas, numa lógica de mercado e, por isso, não foram ingénuas as divulgações dos rankings, evidenciando aquelas ?empresas /escolas? que, à partida, interessa posicionar nos lugares de topo.
Na perspectiva da maioria a escola é um espaço de elites seleccionadas.
E se a este espaço educativo chegam outros, que não os eleitos, propõe-se-lhe o mundo do trabalho precoce ou uma via profissionalizante mais adequada à sua origem de classe.
A exclusão, o abandono e o insucesso escolares são assumidos como factos para os quais não se propõem medidas.
Impõe-se antes a diminuição do financiamento para a escola pública.
A preocupação do governo e assumida pelo Ministro David Justino em sede de Comissão de Educação é clara, não engana sequer os mais distraídos.
Educação sim mas com menos despesa, com mais alunos por turma e com vínculos laborais mais precários para os docentes.
Às instituições de Ensino Superior foram retirados mais de 20 milhões de euros no Orçamento de Estado para 2004 que influenciarão de forma determinante a qualidade do seu funcionamento.
Na ciência a situação é idêntica. Onze Laboratórios de Estado das mais diversas áreas tiveram um corte global de 12,3%, crescendo a pressão sobre as instituições para procurar receitas próprias e substimar as actividades de I&D.
E enquanto a qualificação dos portugueses e o desenvolvimento do país são trucidados por uma feroz política de direita, o governo deleita-se no exercício da cunha, do favoritismo da clientela política, nas irregularidades que põem em causa o direito do cidadão e lançam o descrédito sobre as instituições.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 131
Ano 13, Fevereiro 2004

Autoria:

Luísa Mesquita
Deputada do Grupo Parlamentar do PCP
Luísa Mesquita
Deputada do Grupo Parlamentar do PCP

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