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Reconstituição de agrupamento de escolas - um processo exemplar, no pior sentido

O processo de reordenamento da rede escolar teve desenvolvimentos inesperados no final do último ano lectivo, com a imposição às escolas das regiões Norte e Centro de agrupamentos verticais de grande dimensão, resultantes, regra geral, da criação de unidades de gestão centradas numa escola EB 2/3, aglutinadas com um ou mais agrupamentos horizontais ou verticais anteriormente existentes.

Perante um despacho da Secretaria de Estado de Administração Educativa, publicado a 8 de Julho, onde se assume a intenção de "agrupar todas as escolas em unidades de gestão" privilegiando "os agrupamentos verticais", e apesar de se apontar o ano lectivo de 2003-2004 "como o ano de encerramento global do processo", foi entendimento dos responsáveis da Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) e do Centro (DREC) que as escolas tinham que realizar, com urgentíssimo carácter de urgência (até 15 e 20 de Julho, respectivamente), eleições para as comissões executivas instaladoras destes agrupamentos-tipo. Com um calendário que não salvaguarda condições de participação dos diversos membros do colégio eleitoral, gerador de grande perturbação nas escolas em época de encerramento do ano escolar e preparação do próximo, por explicar fica esta posição extremosa destas duas regiões quando, por exemplo, é na Região de Lisboa e Vale do Tejo que o processo está mais atrasado.

Numa posição conjunta, a FENPROF e a CONFAP contestaram a validade deste processo e, consequentemente, apresentaram no Tribunal Central Administrativo um pedido de declaração de ilegalidade do despacho e da nulidade dos seus efeitos. Do mesmo modo, a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) veio a público reclamar o papel vinculativo que legalmente lhe está consagrado no que toca à configuração de agrupamentos de escolas e exigir a não ratificação, por parte do correspondente secretário de Estado, destes agrupamentos-tipo, até porque, quer o referido despacho, quer os ofícios das direcções regionais que o acompanharam, ao dispensarem o envolvimento e o acordo das escolas e das autarquias, assumem que o poder central pode impor unilateralmente soluções de agrupamentos, situando-se, assim, em plano contrário ao do respeito pelas leis vigentes.

Ao protesto e à indignação dos diversos agentes educativos, que fizeram chegar ao ME e às direcções regionais posições onde exigem que as alterações a introduzir na rede escolar sejam precedidas de uma avaliação dos projectos existentes e do levantamento das necessidades educativas de cada concelho,  a DREN e a DREC, numa posição completamente autista, nada disseram. Resultado: a generalização, ou melhor a implementação, de um modelo de formato único, materializado em agrupamentos com milhares de alunos e dezenas de escolas geograficamente dispersas, sem quaisquer afinidades entre si. Ou seja, o aparecimento dos mega-agrupamentos, pré-formatações para a instalação de gestores profissionais nomeados e da confiança do poder. Isto é, uma solução meramente administrativa e economicista, que compromete dinâmicas pedagógicas e projectos educativos comuns, em que, como a lei preconiza, deveria assentar a constituição dos agrupamentos.

Sobre a ilegalidade, falarão os tribunais. Sobre a ilegitimidade, falam as centenas de posições de contestação das escolas/agrupamentos, associações de pais e órgãos autárquicos. Sobre a instabilidade causada nas escolas, responderá o ministro da Educação, responsável político por um processo de reordenamento da rede em que tudo valeu: a violação da lei, o desrespeito por pessoas e instituições, a arbitrariedade, a prepotência e até o recurso à intimidação, à ameaça e ao insulto. Enfim, sinais dos tempos...


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 127
Ano 12, Outubro 2003

Autoria:

Manuela Mendonça
Coordenadora do Departamento de Gestão e Avaliação do Sistema Educativo do Sindicato dos Professores do Norte
Manuela Mendonça
Coordenadora do Departamento de Gestão e Avaliação do Sistema Educativo do Sindicato dos Professores do Norte

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