Página  >  Edições  >  N.º 126  >  Janelas da Mente: Os potenciais evocados - A componente N400

Janelas da Mente: Os potenciais evocados - A componente N400

A N400 É A DESIGNAÇÃO DADA A ESSA NEGATIVIDADE QUE SE SUCEDE AO APARECIMENTO DE UM FINAL INCONGRUENTE NUMA LISTA DE PALAVRAS QUE COMPLETAM UMA FRASE.

O nosso cérebro responde electrofisiologicamente às violações da estrutura semântica ou sintáxica da linguagem, gerando uma componente negativa, com uma amplitude média de uns 6 mV e que aparece principalmente ante estímulos e tarefas relacionadas com o processamento verbal, numa latência que se inicia por volta dos 200 ms, tem o seu pico máximo em torno dos 400 ms e se prolonga pelos 500-600 ms.
A N400, designação dada a essa negatividade que se sucede ao aparecimento de um final incongruente numa lista de palavras que completam uma frase, por exemplo, foi observada pela primeira vez por Kutas e Hillyard (1), que usaram situações experimentais baseadas em paradigmas de ?priming? semântico e que interpretaram o aparecimento deste componente como sendo ?um sinal electrofisiológico do reprocessamento de informação semanticamente anómala?.(2)
O paradigma tradicional para a observação da N400 consiste na apresentação de frases em que a última palavra poderá ser semanticamente congruente ou incongruente com o contexto geral. Por exemplo, poder-se-á contrapor à frase "esta noite não dormi nada porque o bebé chorou" a frase incongruente "esta noite não dormi nada porque o bebé telefonou". Por outro lado, a N400 também parece verificar-se quando o sujeito escuta pares de palavras e a segunda palavra do par não se relaciona com a primeira (3) e, em geral, a sua amplitude é maior quando o significado da frase que se apresenta como estímulo é ambíguo, quando uma palavra está incorrectamente escrita ou não se conhece o seu significado ou quando uma frase afirma algo que não é correcto, sendo tanto maior quanto mais acentuadas forem essas incongruências (4, 5).
A N400, no entanto, também é evocada pelo aparecimento de uma imagem anómala num contexto sequencial de imagens relacionadas (6, 7) o que parece indicar que os seus correlatos psicofisiológicos vão mais além do que a mera incongruência semântica e poderá mesmo ser um sinal indicativo de qualquer desajustamento conceptual num contexto de conceitualização categorial. Estas características da N400 tornam-na, por isso, numa ferramenta hoje essencial nos estudos das perturbações da leitura (dislexia) ou da linguagem, no estudo das situações de demência como a doença de Alzheimer, no estudo das dificuldades comunicacionais em casos de autismo e até nos estudos de psicologia criminal, nomeadamente na tentativa de identificar falsos depoimentos ou na descoberta de criminosos que negam os seus crimes.(8)

Referências Bibliográficas

  1. Kutas, M. & Hillyard, S. A. (1980) Event-related brain potentials to semantically inappropriate and surprisingly large words, Biol Psychol, 11, 99-116.
  2. Kutas, M. & Iragui, V. (1998) The N400 in a semantic categorization task across 6 decades, Electroencephalogr Clin Neurophysiol, 108, 456-71.
  3. Bentin, S., Kutas, M. & Hillyard, S. A. (1995) Semantic processing and memory for attended and unattended words in dichotic listening: behavioral and electrophysiological evidence, J Exp Psychol Hum Percept Perform, 21, 54-67.
  4. Kiefer, M. (2002) The N400 is modulated by unconsciously perceived masked words: further evidence for an automatic spreading activation account of N400 priming effects, Brain Res Cogn Brain Res, 13, 27-39.
  5. Yano, T. & Kaga, M. (2000) Semantic category discrimination and N400, Psychol Rep, 87, 415-22.
  6. Hamm, J. P., Johnson, B. W. & Kirk, I. J. (2002) Comparison of the N300 and N400 ERPs to picture stimuli in congruent and incongruent contexts, Clin Neurophysiol, 113, 1339-50.
  7. West, W. C. & Holcomb, P. J. (2002) Event-related potentials during discourse-level semantic integration of complex pictures, Brain Res Cogn Brain Res, 13, 363-75.
  8. Neshige, R., Kuroda, Y., Kakigi, R. et al. (1991) Event-related brain potentials as indicators of visual recognition and detection of criminals by their use, Forensic Sci Int, 51, 95-103.

  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 126
Ano 12, Agosto/Setembro 2003

Autoria:

Celso Oliveira
Escola José Fragateiro, Ovar
Celso Oliveira
Escola José Fragateiro, Ovar

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo