A REDUÇÃO DE 10% NAS VAGAS NO ENSINO SUPE...IOR PÚBLICO? TEM SIDO JUSTIFICADA COM A NECESSIDADE DE RACIONALIZAR A OFERTA E AUMENTAR A EFICIÊNCIA, A EFICÁCIA E A RELEVÂNCIA SOCIAL DO SISTEMA DE ENSINO SUPERIOR PORTUGUÊS.
A redução de 10% nas vagas no ensino superior público, exceptuando áreas consideradas estratégicas como as de saúde, ciências exactas, tecnologias e artes, imposta pelo Ministro da Ciência e Ensino Superior para o próximo ano lectivo, tem sido justificada com a necessidade de racionalizar a oferta e aumentar a eficiência, a eficácia e a relevância social do sistema de ensino superior português. Ora o planeamento centralizado do sistema de ensino superior pelas necessidades do mercado de trabalho, além de traduzir uma visão redutora, tendo como único objectivo a formação profissional, não parece ser uma boa alternativa dada a inexistência de estudos e modelos preditivos de confiança, conforme têm salientado vários analistas. Foi com os mesmos argumentos do desperdício de recursos que a formação excessiva de diplomados acarretaria, da necessidade de preservar a qualidade do ensino e de planear o desenvolvimento do ensino superior de acordo com as necessidades do País, que se justificaram medidas de limitação do acesso ao ensino superior nos finais da década de 70 e primeira metade dos anos 80, como a generalização dos numeri clausi e sua redução. A diminuição de vagas atingiu principalmente as Universidades tradicionais, sendo de destacar o caso de Medicina, que passa de um numerus clausus de 835 em 1979 para 312 em 1985, com as consequências hoje bem conhecidas. A redução de vagas, dada a evolução recente do número de candidatos, pode parecer uma medida sensata de racionalização de recursos. O governo não reduziu, no entanto, apenas as vagas nos cursos sem (grande) procura, o que poderia ter alguma lógica dado os mecanismos de financiamento existentes. O argumento da quebra demográfica fica, também, de certa forma, fragilizado, com o facto de, em 2001, cerca de metade dos jovens portugueses entre os 18 e 24 anos residentes no continente português, não ter concluído o ensino secundário nem se encontrar a frequentar o sistema educativo. O governo também não reduziu apenas as vagas nos cursos onde as notas dos candidatos admitidos foi inferior a 10. A redução de vagas no ensino superior público traduz, de facto, um desinvestimento na qualificação da população portuguesa e penaliza as instituições de maior mérito. Além da redução das vagas, as alterações das condições de acesso ao ensino superior, impondo uma classificação mínima nas provas de ingresso e uma diminuição do número de provas alternativas, vão contribuir, também, para uma diminuição da procura de ensino superior. As oscilações na procura de ensino superior nas últimas décadas em Portugal traduzem bem o efeito regulatório das condições de acesso. Não se defende aqui o livre acesso ao ensino superior, dadas as limitações humanas e materiais das diversas instituições, mas uma política que favoreça um aumento da frequência do ensino superior e a constituição de um sistema mais diversificado. Em vários sistemas educativos europeus para aceder à frequência de muitos cursos e instituições basta apenas ter concluído com aproveitamento o ensino secundário. Tal não impede que para outros cursos e instituições as condições de acesso e ingresso sejam diferentes. Uma redução nos numeri clausi poderá não ter hoje as consequências dramáticas imediatas como no período de franco crescimento da procura de ensino superior, mas poderá tê-las a longo prazo. Portugal tem actualmente taxas de frequência, no grupo etário de referência, próximas da média dos países da União Europeia. Dadas as metas estabelecidas por muitos países para o aumento da frequência de ensino superior, corremos o risco de deixarmos de ter essa paridade.
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