Página  >  Edições  >  N.º 122  >  Janelas da Mente: Os potenciais evocados (P300)

Janelas da Mente: Os potenciais evocados (P300)

Os potenciais evocados constituem uma das técnicas neurofisiológicas com maior utilidade na investigação cognitiva, como referimos já em artigo anterior (cfr . edição nº 111, Abril 2002), Entre estes, por sua vez, destacam-se algumas componentes de maior relevância para a investigação, como é o caso do complexo P300, uma componente ampla e positiva, que apresenta o seu pico máximo à volta dos 300 milissegundos (ms) e que se manifesta principalmente em tarefas discriminativas, com estimulação auditiva, visual ou somatossensorial. Esta componente terá sido descoberta por Sutton e colegas (1) e aparece normalmente perante a apresentação de um estímulo que o sujeito está a atender activamente, podendo também ser desencadeada quando um estímulo é desconhecido ou surpreendente, como acontece, por exemplo, quando um tom inesperado surge numa sequência de outros tons mais frequentes. A latência típica da P300 situa-se entre os 300 e os 500 ms e a sua amplitude média situa-se em torno dos 10 micro volts (mV). É uma onda mais facilmente detectável na região centroparietal do crânio (Pz e Cz), tendo a sua origem no córtex frontal e no hipocampo, e parece estar relacionada com a resposta de orientação. Ao requerer que a atenção se dirija para o estímulo ela é facilmente obtida em tarefas apresentadas no paradigma ?oddball?, isto é, tarefas em que se apresentam estímulos com algumas diferenças entre si (intensidade, duração ou qualquer característica física) de forma a que uns estímulos sejam mais frequentes (80% - 90% dos ensaios) e outros sejam raros ou inesperados (10% - 20%) mas apresentados numa ordem aleatória e imprevisível para o sujeito. A amplitude de P300 é maior para os estímulos raros a que o sujeito atende (target) pelo que se pode interpretar como sendo um indicador ou reflexo de variáveis como a falta de expectativa do sujeito relativamente ao estímulo ou da significação e relevância que o sujeito atribui a esse estímulo (independentemente dos requisitos da tarefa). A P300, no entanto, não parece ser uma componente unitária, sendo talvez mais correcto falar-se num ?complexo P300? (2). Nesse complexo de componentes, na verdade, tem-se distinguido uma P3a da P3b (P300 original). De facto, se for introduzido numa tarefa oddball um terceiro estímulo, funcionando como evento novo, inesperado ou surpreendente, pode ser observada uma componente positiva distinta da P300, que apresenta uma latência menor (à volta dos 250 ms) e cuja distribuição no crânio tem uma orientação mais frontal. Esta componente designa-se por P3a (frontal) para se distinguir da P300 clássica (P3b), mais tardia e com uma distribuição mais parietal. A P3a tem sido relacionada com processos que implicam a captura da atenção de forma automática e involuntária perante eventos salientes (3, 4), ou seja, enquanto que P3b depende não só da tarefa mas também da expectativa de aparecimento do estímulo (5, 6), a P3a está, de alguma forma, dependente da probabilidade de aparecimento do estímulo (captura de atenção) mas não varia com a tarefa que a desempenhar. O complexo P3 é normalmente precedido de uma deflexão negativa denominada N2 (onda que surge por volta dos 200 ms face ao aparecimento de um estímulo estranho) e está assim associado aos mecanismos neurocerebrais de processamento da atenção e da memória imediata (7), como a captura da atenção, a atenção selectiva e a actualização do contexto da memória de trabalho ou memória imediata.

  1. S. Sutton, M. Braren, J. Zubin, E. R. John, Science 150, 1187-1188 (1965).
  2. K. A. Brookhuis, G. Mulder, L. J. Mulder, A. B. Gloerich, Biol Psychol 17, 277-96 (Dec, 1983).
  3. M. D. Comerchero, J. Polich, Brain Res Cogn Brain Res 7, 41-8 (Jul, 1998).
  4. R. F. Simons, F. K. Graham, M. A. Miles, X. Chen, Biol Psychol 56, 207-18 (Jun, 2001).
  5. M. Elton, M. Scherg, Int J Neurosci 29, 57-63 (Mar, 1986).
  6. D. S. Ruchkin, R. Johnson, Jr., H. L. Canoune, W. Ritter, M. Hammer, Psychophysiology 27, 157-76 (Mar, 1990).
  7. J. Polich, A. Kok, Biol Psychol 41, 103-46 (Oct, 1995).

  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 122
Ano 12, Abril 2003

Autoria:

Celso Oliveira
Escola José Fragateiro, Ovar
Celso Oliveira
Escola José Fragateiro, Ovar

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo