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Voluntários da Liga Portuguesa Contra o Cancro - A militância da ternura

A correr o mais depressa que as pernas deixam, um miudinho, franzino, irrompe pelo corredor fora. Atrás a mãe esbaforida ralha: ?Espera!? Mas a corrida continua e a criança só pára às pernas da ?avó? Geninha.
Quando começou a fazer voluntariado no Instituto Português de Oncologia (IPO), no Porto, há 21 anos, Eugénia Ribeiro era Gena para quem a quisesse chamar. Com o passar do tempo foi rebaptizada de ?tia? Geninha. Aos 73 anos Geninha é ?avó?. É também a coordenadora das voluntárias da Liga Portuguesa Contra o Cancro (LPCC) que prestam apoio ao serviço de pediatria naquele hospital. Mas este é apenas um dos serviços assegurados pelos 450 voluntários da Liga no IPO. Existem outros.
À chegada ao hospital é impossível não reparar no serviço de acolhimento. Há um voluntário em cada canto para encaminhar as pessoas para os serviços que procuram. ?Do doutor ao analfabeto, todos ficam desorientados quando aqui chegam, sejam doentes ou familiares?, explica Dinora Freitas, voluntária há 22 anos e coordenadora deste serviço. As voluntárias sabem que o cancro ainda é um tabu e que há um estigma em torno da sigla IPO. Daí que para Dinora a simpatia e a prestabilidade sejam essenciais para quem se vê forçado a percorrer os corredores do IPO.
A par do acolhimento, a linha da frente do voluntariado, existe ainda um outro serviço que salta à vista: o café com leite. A Liga dispõe de seis carrinhos que percorrem os meandros do hospital a distribuir café com leite e bolachas, gratuitamente. Todos podem ser clientes deste serviço: quem aguarda por consultas, os acompanhantes e o pessoal hospitalar. Só que os voluntários não ficam à espera que as pessoas se dirijam ao carrinho vão ter com elas e perguntam: ?Não quer tomar um cafezinho??
Menos visíveis são os serviços de visita às enfermarias e o acompanhamento de doentes e seus familiares. Mas requerem uma boa preparação por parte das voluntárias. A primeira lição sobre como apoiar consiste em desmistificar o cancro. Geninha não deixa margem para dúvidas: ?Aqui ninguém é coitadinho.? No seu português do Brasil a voluntária esclarece que ?estar doente é um percalço que qualquer um pode ter? e insiste: ?Ninguém é doente, as pessoas ficam doentes.?
Desmistificar não significa, contudo, desvalorizar o sofrimento dos doentes e dos que os acompanham. Esta é a segunda lição. ?Não podemos bater nas costas das pessoas e dizer que isto vai passar, devemos antes transmitir confiança e tranquilidade?, ensina Dinora. A função do voluntário no que toca ao seu relacionamento com doentes e família é ouvir o que estes têm a dizer sem curiosidade de saber para além do que é contado. Sem dar conselhos e sem interferir na questão médica. ?Muitas vezes os pais das crianças vêm ter comigo e dizem que o médico sugeriu determinado tratamento e depois perguntam: se fosse teu filho o que fazias?? A resposta só pode ser uma e Geninha não hesita em dá-la: ?A decisão tem de ser vossa!?

?Boa disposição controlada?

Local de cura para uns, de doença para outros, o IPO carrega em si um quê de tristeza inevitável. As voluntárias sabem-no bem. A sua presença e amabilidade servem para amenizar a atmosfera hospitalar. Para isso é essencial ter uma ?boa disposição controlada?, explica Dinora. E uma ?apresentação cuidada, mas sem exageros?, acrescenta Geninha. Características estéticas que não maquilham uma outra qualidade vital para o exercício do voluntariado no IPO: ?força interior?, avisa Geninha. ?Não é qualquer pessoa que consegue ser voluntária neste hospital?, garante. A experiência ensinou-as que é preciso dar muita atenção às recaídas que se sucedem a períodos de relativa melhora. Quando isto acontece nas crianças ?muitas recusam os tratamentos porque estão cansadas?, observa Geninha. Neste caso ?não devemos forçar a criança a fazer o que a priori não quer?, alerta. ?Devemos contornar a situação com jeitinho.?
A recompensa por esse ?jeitinho? vem do reconhecimento do pessoal médico e dos doentes, dizem as voluntárias. Muitos voltam ao hospital com o único intuito de as visitar e de agradecer, mais uma vez, os seus cuidados. E é por isso que o miudinho franzino corre em direcção às pernas da ?avó? Geninha abraçando-as como se tivesse acabado de cortar a meta.

Núcleo Regional do Norte da Liga Portuguesa Contra o Cancro

Tipo: Instituição de Utilidade Pública
Objectivos: Desmistificar o cancro promovendo uma  imagem realista da sua natureza e causas, mas também apostar na sua prevenção, tratamento e cura.
Direcção: José Cardoso da Silva
Morada: Estrada Interior da Circunvalação 6657/ 4200-177 Porto
Telefone: 225492423
Página na Net: www.ligacontracancro.pt


  
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Edição:

N.º 120
Ano 12, Fevereiro 2003

Autoria:

Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação
Andreia Lobo
Jornalista, A Página da Educação

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