Para quem está no domínio da educação é, muitas vezes, evidente
a falta de conexões entre os diferentes actores nele implicados. Tem-se a impressão
de uma forte compartimentação de discursos, debates e decisões.
Sendo a educação importante e significativa para todos, espera-se
que estejam no mesmo vector de entendimento, as decisões políticas ? a investigação
e o pensamento teórico ? a formação dos docentes - a acção dos professores ?
as expectativas da sociedade civil, famílias e alunos. Embora cada nível tenha
uma função específica no sistema educativo, usando discursos específicos, parecem
indispensáveis zonas de interface comunicativo entre eles, de modo torná-los
compreensíveis para todos, clarificar finalidades e processos, encadear acções e
ajustá-las às expectativas dos mais directamente interessados nos produtos da
educação.
Aqueles ruídos na comunicação são particularmente evidentes entre (a) o nível
de decisão e planeamento, por um lado, e a sociedade civil, as escolas e professores,
pelo outro; (b) o nível académico e de investigação e a decisão política, as
escolas e os professores ; (c) as escolas e os professores e a comunidade/famílias.
A dificuldade de comunicação escola-família é clássica e tem sido objecto
de muitos debates e investigações, mas os resultados surgem pouco generalizados,
eficazes e convictos. As causas são complexas e não cabe neste pequeno texto
discuti-las. Mas certamente que a fragilidade dos outros elos de comunicação;
a crescente complexidade social, étnica e cultural das famílias dos alunos ;
a suas diferentes expectativas ; e a persistência de culturas de escola
e de professores demasiado auto-centradas, são importantes resistências a essa
comunicação.
Os baixos resultados dos alunos portugueses em estudos comparativos internacionais
e o debate em torno dos rankings de escolas, levantam questões essenciais
acerca do funcionamento da cadeia do processo que gera resultados tão pouco
animadores. Centrar as insuficências das aquisições dos alunos nos professores
é, nitidamente, uma atitude de afastamento das responsabilidades. Eles são,
de facto, o elo essencial do processo educativo, mas a sua acção reflecte complexas
condições envolventes e as insuficiências das etapas anteriores do processo.
Não é, também, possível ignorar o desconforto das famílias face aos baixos desempenhos
dos seus filhos, mesmo ao nível das competências básicas. Entenda-se que, para
uma grande parte da população portuguesa, a sua maior expectativa em relação
à escola básica é que ela comece por garantir o domínio das competências básicas
aos seus filhos. De facto, sem elas, não há sustentação para o desenvolvimento
das competências essenciais que essa mesma escola se propõe assegurar ao fim
de 9 anos.
No que se refere aos níveis de decisão e planeamento educacional, falta-lhes
uma sistemática sustentação em evidências tendo em maior conta os resultados
de investigações realizadas em contexto nacional, as escolas e os professores
e as expectativas da comunidade. Persiste a conveniência, de momento, das decisões
políticas e o seguidismo face às soluções dos outros, criando a ilusão de modernização
e avanços que finalmente não se revelam nos produtos atingidos. Falta ajustar
as finalidades e os processos a desenvolver às nossas especifidades e necessidades.
Nos últimos anos, o sistema educativo tem acolhido conceitos ? por ex. educação
inclusiva, educação intercultural, flexibilização curricular, curriculos alternativos,
autonomia, etc ? já desenvolvidos noutros países, com sentido prático e transformativo,
mas que, em Portugal, ainda estão longe de serem significativos e assimilados
por quem tem de os aplicar.
Ao frágil suporte, das decisões e planeamento, em evidências da investigação
educacional, acresce algum desinteresse da comunidade académica e de investigação
pelo processo de transferência dos resultados da investigação para contextos
educativos reais. Transferência realizada através de comunicações mais activas
com as escolas e professores ? projectos conjunto, formação, elaboração de materiais,
etc - que tornem compreensivos e significativos os resultados das investigações
a quem tem de os aplicar. Afirmava, num encontro sobre investigação educacional,
um professor universitário e investigador, que fora professor durante vários
anos no ensino básico, que não lhe cabia a ele fazer trabalho dessa natureza.
Confesso que estranhei o tom tão peremptório da afirmação. Não vou explicar
porquê. Mas quem melhor que professores-investigadores, que formam professores,
para adequarem os resultados das investigações, realizadas pela comunidade a
que pertencem, a discursos e práticas significativas para quem estão a formar?
|