O acesso ao ensino superior vai começar a ter novas regras já a partir deste
ano. Segundo o Ministério da Ciência e do Ensino Superior (MCES), o conjunto de
medidas agora propostas visa "aumentar a exigência" no ingresso às
universidades e politécnicos e conferir "credibilidade" ao sistema.
Uma das principais decisões tomadas pelo executivo, e talvez a mais
mediatizada, passa pelo estabelecimento de uma nota de ingresso mínima de 9,5
valores, aplicada a todas as provas, cursos e estabelecimentos de ensino
superior. De acordo com números adiantados pelo ministro Pedro Lynce, se esta
classificação tivesse entrado em linha de conta nos concursos do ano passado,
cerca de cinco mil de um total de 36 mil alunos estaria de fora. O ministro
garante que a fixação desta fasquia irá ocorrer de uma forma gradual, já a
partir deste ano, para atingir plena expressão apenas no ano lectivo de
2004/2005.
O governo quer também passar a limitar a escolha do número de provas nacionais
do 12º ano para os concursos de ingresso - que, para todos os efeitos,
funcionam como uma espécie de "lotaria" -, podendo os alunos passar a escolher
as melhores notas entre um máximo de seis disciplinas, ao contrário das actuais
dez. A ideia é que os estudantes deixem de aceder ao ensino superior através de
exames que pouca ou nenhuma relação têm com a formação que escolheram. Esta
proposta só entrará em vigor a partir do concurso nacional de 2006/2007.
Outra das medidas preconizadas pelo MCES é a de extinguir, suspender ou
reconverter os cursos que tenham menos de dez alunos inscritos. Só no sector
público existem 107 cursos nessas circunstâncias. Já este ano, a tutela
conferiu zero vagas às licenciaturas e bacharelatos do ensino privado que não
conseguiram alunos nos dois últimos anos.
Esta proposta, porém, parece não obter consenso. De acordo com recentes
declarações do presidente do Conselho de Reitores das Universidades Públicas,
Meira Soares, é uma medida indispensável no sentido de "racionalizar a rede";
mas o presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos, Luís
Soares, já referiu existirem necessidades de formação específica no país que
não se coadunam com a limitação do número de alunos.
Mesmo não sendo esse o caso dos cursos superiores de formação de professores, o
MCES já avisou que vai encerrar os cursos desta variante cujas saídas
profissionais estejam saturadas. Os planos do ministério passam por numa
primeira fase atribuir zero vagas ao primeiro ano da licenciatura em causa,
para depois a fechar quando os alunos tenham concluído o curso. Esta decisão
será tomada em parceria com o Ministério da Educação, a quem caberá comunicar
quais as áreas de formação a "abater".
Lei de financiamento está "esgotada"
Apesar de a Lei Orgânica do MCES já ter sido aprovada, falta ainda consolidar a
sua estrutura de funcionamento. Um dos principais entraves é o facto de
existirem um conjunto de serviços que trabalhavam para o Ministério da Educação
de que o MCES se vê agora privado. Apesar deste constrangimento, próprio de uma
mudança organizativa em larga escala, muitos defendem que a passagem de tutela
para o actual ministério poderá potenciar a ligação entre a ciência e o ensino
superior, tanto mais se se pensar que mais de 80% da investigação feita em
Portugal é realizada nas universidades.
Foi talvez com base neste pressuposto que outra das principais inovações
introduzidas pelo governo passe pela criação dos chamados Centros de Estudos
Superiores, que arrancam já este ano lectivo. São formações especializadas de
nível 4 da União Europeia - uma especialização intermédia pós-12º ano - dando
aos estudantes a possibilidade de ingressar mais rapidamente no mercado de
trabalho ou prosseguir os estudos no ensino superior.
Estes cursos pós-secundários são uma exigência antiga dos empresários
portugueses e serão lançados em conjunto pelas universidades e pelas empresas.
Uma das principais vantagens, na opinião de Pedro Lynce, é o facto de eles
poderem ser criados e extintos à medida das necessidades de formação local. O
financiamento será assumido em 75% pelos fundos do III Quadro Comunitário de
Apoio, sendo a restante parcela assumida pelo ministério, empresas e
autarquias.
Quanto à actual fórmula de financiamento, o ministro Pedro Lynce referiu já que
a considera "esgotada". A obtenção de verbas passará a depender da "qualidade"
dos cursos e não do número de alunos que neles estão inscritos. Para isso, o
ministro garante que vai avançar, até ao final deste ano, com a criação de uma
Inspecção Geral para o Ensino Superior e para a Ciência. Tudo, assegura Pedro
Lynce, para garantir a qualidade do ensino superior português e a
credibilização dos diplomas dos estudantes portugueses a nível internacional.
Para já, anunciam-se cortes de 5% nas verbas transferidas para as universidades
e politécnicos. Na opinião dos sindicatos, o ensino superior em Portugal só
funcionará no próximo ano com qualidade idêntica à de 2002 se forem
transferidos 732 milhões de euros do Orçamento de Estado para as universidades
e 279 milhões para os institutos politécnicos, ou seja, mais 35 milhões que a
proposta avançada pelo Governo. A mesma opinião tem o Conselho de Reitores das
Universidades Portuguesas, que afirmou só aceitar um orçamento de contenção
para as universidades apenas por mais um ano.
O MCES não partilha desta perspectiva e garante mesmo que as verbas para o
ensino superior vão aumentar, já que a transferência do Orçamento do Estado
para as universidades se elevará, em 2003, aos 714 milhões de euros, quando
este ano o orçamento estimado era de 707 milhões de euros - montante que, de
acordo com a tutela, inclui a verba destinada a pagar os aumentos salariais de
2002, reclamados pelas estruturas sindicais. "O que o ministério não tem em
conta são os aumentos de carreira no ensino superior universitário, avaliados
em cerca de 16 milhões de euros", refere João Cunha e Serra, da Federação
Nacional de Professores.
Número de candidatos ao ensino superior diminui
Pelo segundo ano consecutivo, o número de vagas disponíveis no ensino superior
público é maior do que o número de candidatos. Nas universidades e politécnicos
a relação é de 46 mil estudantes para 49 mil vagas. O aumento homólogo do
número de vagas no ensino superior público relativamente ao ano lectivo de
2000/2001 - cerca de 400 - resulta, em grande medida, do acréscimo proveniente
da área da saúde. No ensino superior particular e cooperativo o número de vagas
ascende a 32 mil, o número mais baixo dos últimos sete anos. Este, aliás, é
apenas o resultado visível da diminuição de alunos no ensino privado, que
perdeu, desde 1996, cerca de dez mil estudantes.
Dos alunos que obtiveram colocação na primeira fase, 87 por cento ficou numa
das três primeiras opções, o que representa um acréscimo de um por cento face
ao ano passado. Sessenta por cento, cerca de 23 mil jovens, conseguiu colocação
na primeira escolha. Dos cerca de mil cursos existentes, mais de metade ficou
logo sem lugares na 1ª fase. A 2ª fase de candidatura do concurso nacional
decorre entre 7 e 11 de Outubro, altura em que serão postas a concurso as 10
282 vagas restantes desta 1ª fase.
|