Sabemos, os que estamos na formação inicial de professores, que subsiste ainda,
na concepção dos respectivos planos curriculares, uma lógica essencialmente,
aditiva. Definem-se as disciplinas de modo a completar a dotação temporal para
cada componente de formação, muitas vezes, com fraca articulação entre elas.
Em alguns casos, podemos dizer, existe uma lógica corporativa no arranjo
curricular, com predominância de certas disciplinas e cargas horárias,
resultante da influência relativa de certos professores/formadores e
departamentos/áreas. Mas, quase sempre, resulta uma excessiva pulverização
disciplinar contrariando o recomendado princípio da integração. É verdade que,
pela sua natureza, os conteúdos da formação inicial de professores e, em
particular, de professores do 1º ciclo, são já diversificados. É esperado, que
esses docentes sejam generalistas nas principais áreas científicas. Esta
diversidade apela à participação de professores/formadores com percursos e
interesses muito diversificados, aumentando a tentação para pulverizar
disciplinarmente os conteúdos de cada componente de formação. É, obviamente,
uma situação diferente da que se verifica na formação em áreas de saber mais
específicas: História, Geografia, Matemática, etc onde a generalidade dos
professores/formadores participam da mesma área de saber e têm mais
interiorizada a finalidade da sua acção formativa. Tal interiorização tem sido
mais difícil no domínio da formação de professores. Cada um reconhece-se e é
reconhecido como especialista numa das componentes de formação ou de uma
disciplina específica como pouca comunicação profissional e científica entre
eles. A falta de conhecimento ou sensibilidade para a área de docência do curso
em que participa, aumenta a tentação academista e individualista, incompatível
com um projecto de formação profissionalizante. Tem, portanto, faltado uma
concepção participada e integrada de formação enquanto projecto e a projecção
intencional da intervenção de cada um e de todos para uma mesma finalidade: a
formação de docentes com um perfil final definido por um conjunto integrado de
competências. Esta dispersão repousa comodamente em falsas convicções: os
alunos vão fazendo progressivamente as necessárias integrações ao longo do
curso, a integração das diferentes componentes realiza-se, depois, na
intervenção educativa/no estágio, etc. Falsas convicções, porquê?
A integração é expressa por formas elevadas de competências, muito mais
complexas do que a diversidade dos saberes parcelares que as constituem.
Integrar exige a capacidade de reconfigurar competências e desempenhos face às
situações, seleccionando e mobilizando, para isso, os saberes necessários. E, o
princípio da integração, realiza-se através de uma lógica de projecto e esta
não é feita de novas disciplinas, designações ou componentes de
formação, mas pelo modo como é concebido o plano de formação, se relacionam as
suas componentes, se integram os meios e intervêm e participam os actores. Não
é um conjunto de acções voluntaristas, mas uma perspectiva de formação com um
fundo ideológico que comanda a realização. Nela entram os
professores/formadores enquanto principais decisores dessa perspectiva: desde o
nível de concepção do currículo ao nível da sua realização. Não é, portanto,
possível esperar que os alunos desenvolvam competências integradoras sem que o
processo de formação e os formadores, cada um e entre eles, o façam.
Quanto ao estágio, este é, por definição, a componente que deve
assegurar a projecção, de modo integrado, para contextos de intervenção, do
capital científico, teórico, reflexivo e metodológico que os formandos foram
adquirindo e desenvolvendo nas restantes componentes do curso. A ausência do
sentido de projecto e da dimensão integradora durante o curso tende a produzir
rupturas entre a prática pedagógica e as componentes teóricas do curso,
ocultando a importância da análise crítica e reflexiva dos processos educativos
e das mudanças sociais nos contextos em que o futuro docente terá de actuar
profissionalmente. Naquela ausência, o estágio apresenta-se como última
oportunidade de aprendizagem prática, por imitação e reprodução acrítica e
pouco questionada das práticas observadas, antes do formando iniciar a sua vida
profissional.
A passagem de uma lógica aditiva a uma lógica de projecto na formação inicial
de professores muito ganharia com a consolidação do processo de acreditação dos
respectivos cursos. O simples facto de colocar no horizonte da formação as
competências esperadas dos docentes a formar e, no processo, os critérios de
qualidade para o fazer, constitui factor promotor de uma cultura de formação
cientifica e profissionalmente integradora e de processos de cooperação e
comparticipação da diversidade de professores dirigidos para a promoção das
competências necessárias dos docentes em formação.
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