A rápida transformação das sociedades modernas, em particular, a sua diversificação,
tem levado, em muitos sistemas educativos, a repensar a função docente, reajustando
as competências que a definem e os processos formação para essa função. Aqui
se têm incluído diversas preocupações, em particular: a identificação e explicitação
das competências docentes, gerais e específicas, esperadas em contextos sociais
e educativos em permanente reconfiguração; a certificação da qualidade da formação
dos professores através de processos de acreditação visando verificar se os
cursos, concebidos para profissionalizar para a docência, obedecem a critérios
que assegurem o desenvolvimento daquelas competências. A formação inicial de
professores tem na sua meta uma dupla expressão: uma certificação académica
e uma certificação profissional. A componente profissionalizante exige que o
processo de formação garanta a transformação ou projecção dos conteúdos teóricos
em/para desempenhos profissionais expressando competências docentes. São as
competências que definem a especifidade da própria profissão. Por isso, têm
uma definição prévia ao curso e são orientadoras do processo de formação. E,
logicamente, apelam à definição de parâmetros de qualidade durante o curso que,
potencialmente, sustentem o desenvolvimento daquelas competências. Quer relativamente
aos critérios gerais de qualidade na formação, quer relativamente às competências
docentes, existe um consenso internacional resultante de análises e investigações
sociológicas e educacionais e de produtos de práticas. No seu conjunto, são
elementos que têm vindo a contribuir para aprofundar a especifidade e especialidade
da profissão docente como acontece com outras especialidades apoiadas pelas
respectivas comunidades profissionais e científicas.
Como fica então a autonomia científica e pedagógica das instituições formadoras
num processo em que outras entidades, embora, como no caso português, com a
sua participação, definem aqueles critérios de formação e as competências docentes
esperadas?
No essencial qualquer formação académica ou profissional de qualidade orienta-se
para objectivos e finalidades claramente definidos e apoia-se em processos que
sustentam aquela qualidade. São condições que dão legitimidade e reconhecimento
social à instituição que a realiza e orientam as escolhas dos candidatos à formação.
É, naturalmente, no uso da sua autonomia científica e pedagógica que as instituições
do ensino superior seleccionam aqueles objectivos e finalidade e definem as
condições através das quais são realizados. Com efeito, as exigências de qualidade
na formação e a resposta às expectativas sociais - dos formandos, dos seus familiares,
dos empregadores e da sociedade em geral - em relação à qualidade dos diplomados,
realizam-se através de escolhas científica e pedagogicamente autónomas. Dito
de outro modo, a autonomia é o meio indispensável para a instituição de formação
estruturar as melhores respostas ao que delas é esperado independentemente do
nível de especificação das expectativas externas. É, portanto, indispensável
que a instituição esteja atenta às necessidades de desenvolvimento da sociedade
e àquelas expectativas. Estas e as exigências externas de formação ou investigação
mais específicas, em vez de constrangimentos à autonomia, constituem, antes,
desafios ao seu uso para melhor corresponder àquelas necessidades e expectativas.
Tudo se passa como se existisse - e, frequentemente, existe - um contrato social
entre parceiros sociais. No cumprimento dos contratos de programa com empresas
ou instituições públicas, a escola de formação ou de investigação, no uso da
sua autonomia, organiza e realiza o seu plano para corresponder o melhor possível
à necessidade manifestada pelo cliente. É, portanto, legítimo esperar
que o uso da sua autonomia esteja subordinado às necessidades e expectativas
dos destinatários da sua acção, sejam pessoas individuais, organismos (públicos
ou privados) ou comunidades mais ou menos alargadas. A resposta a necessidades
de desenvolvimento que supostamente a acção das instituições de ensino superior
prosseguem e a correspondência às expectativas dos parceiros sociais são, simultaneamente,
elementos definidores e limites da autonomia científica e pedagógica dessas
instituições.
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