Inicio neste número um espaço em que nos dedicamos a reflectir
sobre o modo de ser professor. Eu próprio, o Pedro Silva, o Rui Santiago, o
José Santos Trindade e a Susana Faria traremos para aqui ideias e modos de viver
e sobreviver do professor/educador. Do professor que gere o seu quotidiano entre
o ser (pessoa) e o ter (direitos e deveres como funcionário).
Dois antropólogos, dois sociólogos e um psicólogo estarão convosco ao longo
de pelo menos um ano, para vos falar, pôr a pensar, a debater, a discordar,
etc. sobre o professor olhado e pensado no dia a dia e muito na sua própria
perspectiva.
Quais os limites da individualidade do professor? Que faz o professor perante
a tutela? Acredita cegamente? Limita-se a obedecer? Como? Finge? O que faz perante
tanta informação que, de cima para baixo, acelerada agora com as novas tecnologias
da comunicação, lhe chega a todo o momento às mãos? Procuraremos apresentar
uma escrita que roce a perspectiva etnográfica do quotidiano dos professores:
do pré escolar ao básico e do secundário ao Superior.
Parece-nos que pouca investigação se preocupa com o quotidiano concreto dos
professores e com os pedidos de socorro que aberta ou silenciosamente estes
vão lançando diariamente. Não pretendemos um texto investigativo pesado que
afaste os implicados da sua leitura. A ideia é fazer uma escrita leve que vá
ao encontro das preocupações práticas e evidentes dos profissionais da educação.
Abordaremos, entre outras, questões como os desafios colocados hoje aos professores
vindos dos mais diversas quadrantes. Desafios que decorrem não só da construção
de novos conhecimentos, do desenvolvimento social, do mercado de trabalho, da
crescente diversidade cultural dos alunos, da pressão social que pais, comunidade
e sociedade civil exercem cada vez mais, das novas solicitações colocadas à
escola, das contínuas reformas curriculares e, por vezes, das "voltas sobre
a forma", etc.
Afinal como é que os professores lidam com todas estas situações? Como vive
o professor entre a pedagogia e a burocracia? O que é de facto função deles
enquanto docentes? O que devem aceitar? O que devem recusar? Como se colocam
perante as novas burocracias da escola?
Quais os limites do professor/educador? O que se faz como profissional da educação?
Transmitir conhecimentos? Quais? Ensinar a aprender? Ensinar a aprender a aprender?
Ser também investigador? Envolver a comunidade e a famílias? Como?
Que espaço tem o professor/educador para a criatividade? Que espaço para a tão
apregoada inovação? Inovação de quem? Quais os limites da transgressão professoral
em prol da inovação?
Finalmente, o que é o professor no seu modo de ser profissional? Um actor social,
um sujeito autónomo ou um agente social da educação?
Há dias, no âmbito de uma conversa com alguém que tinha participado
numa oficina de formação, dizia-se que "as pessoas estão ainda um pouco baralhadas
com o despacho da autonomia [...] mas, entretanto, as pessoas estão a organizar-se
um pouco de acordo com as realidade locais. E é isso que se pretende com a autonomia
[...]".
Numa oficina, depois de alguma discussão sobre a diferença
entre as preocupações administrativas e as preocupações pedagógicas relativas
a cada contexto, (in)disciplina, heterogeneidade (entre problema e potencial),
retenção, currículos alternativos, etc., pediu-se que os formandos exprimissem,
de forma individual e anónima, por escrito, os seus medos e dificuldades. Não
foi fácil inicialmente. Mesmo assim, surgiram coisas como: "há muitos tempos
livres; a brincadeira tem que ser orientada para combater a indisciplina". Ou,
ao contrário, "a brincadeira até é um meio para a promoção do ensino...". Outro,
ainda, dizia: "a autonomia é um colete de forças que está a baralhar".
Bem, são questões desta natureza que procuraremos analisar aqui, mensalmente,
na Página da Educação e, para apresentação duma ideia, penso que chega por hoje.
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