Seis anos após a guerra e apesar dos esforços massivos da
comunidade internacional na unificação da Bósnia-Herzegovina, o sistema de ensino
praticado em cada uma das três grandes comunidades - muçulmana, sérvia e croata
- continua a ser caracterizado por um verdadeiro "apartheid".
Quer se trate do funcionamento das escolas ou do conteúdo dos programas, tudo
varia consoante a etnia dos alunos. As diferenças de abordagem existem não apenas
no ensino da história ou da geografia, mas também no ensino da matemática e
da biologia. Na República Srpska (RS), de etnia sérvia, são utilizados manuais
vindos da República da Jugoslávia (Sérvia e Montenegro), ao passo que os alunos
croatas da Herzegovina usam manuais importados da Croácia, o seu país de referência.
Estas diferenças determinam os conteúdos veiculados pelos manuais. Assim, um
manual utilizado pelas crianças da escola primária da RS menciona a contragosto
a criação e existência do estado bósnio e concentra-se essencialmente sobre
os "dois Estados sérvios": a Jugoslávia e a RS. No mapa dos Balcãs, no lugar
onde se encontra a Federação croato-muçulmana, uma das duas entidades que constituem
a Bósnia juntamente com a RS, não existe qualquer referência àquele estado,
como se se tratasse de uma terra desconhecida. A obra sublinha que a fronteira
entre a RS e a Jugoslávia "divide o povo e os países sérvios" e que ela "não
é natural" mas "imposta à força".
Do mesmo modo, os croatas da Bósnia, concentrados maioritariamente na Herzegovina,
mantêm-se fiéis aos manuais croatas, tendo-se recusado a utilizar, no ano passado,
manuais de inglês e informática financiados pelo Banco Mundial. Por seu lado,
os muçulmanos - sem alinharem por um país de referência, como acontece com as
duas outras entidades - vão tentando dar ao seu ensino um carácter misto. É
esta diferença de programas e a segregação entre alunos de diferentes comunidades
que constitui ainda hoje um dos principais obstáculos para o regresso das crianças
e jovens à sua região de origem.
Numa escola primária de Stolac (sul da Bósnia), actualmente de maioria croata,
os alunos muçulmanos não estão autorizados a entrarem pela entrada principal
da escola e os corredores são divididos de modo a evitar conflitos entre os
miúdos. O director da escola recusa-se a utilizar os computadores que lhe foram
oferecidos pela comunidade internacional, afirmando que prefere privar os alunos
croatas da aprendizagem da informática do que partilhá-los com os estudantes
muçulmanos.
Claude Kieffer, conselheiro para a educação do Alto Representante da Comunidade
Internacional para a Bósnia, refere que para resolver estes problemas será necessário
instaurar um sistema educativo básico e secundário com programas comuns, criticando
a comunidade internacional por não ter feito da educação uma "prioridade" da
sua acção no território.
A guerra da Bósnia de 1992-1995 foi despoletada pela declaração de independência
da Bósnia e pelo reconhecimento unilateral da Alemanha, secundada pelos restantes
países da comunidade internacional. Segundo os termos dos acordos do Pacto de
Dayton, a Bósnia é um Estado único partilhado em duas entidades, que dispõem
do seu próprio governo, polícia e exército, partilhando apenas as instituições
centrais.
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