Justificado pela relevância do tema e pelo interesse que o
mesmo tem vindo a merecer junto dos leitores, este espaço contará, a partir
dos próximos números, com o contributo precioso de Adalberto Dias de Carvalho
(Universidade do Porto) e José António Caride Gomez (Universidade de Santiago
de Compostela), autores cujo pensamento constitui uma referência incontornável
para todos quantos reconhecem na educação um lugar privilegiado para a realização
da utopia do humano. Mais do que as tradicionais boas intenções de que, afinal,
estão todos os princípios de ano cheios, trata-se de procurar, com esta nova
ou renovada rubrica, valorizar diferentes formas de pensar esse problema
humano que é a educação.
Pela nossa parte, e no seguimento das preocupações que temos
vindo a partilhar, continuaremos a interrogar a ligação entre ética e profissão
docente a partir de uma visão positiva do homem e da vida. Os problemas que
são hoje colocados a quem é chamado a intervir, profissionalmente, no processo
de desenvolvimento de pessoas e comunidades, exigem um optimismo paciente e
perseverante, ancorado numa atitude critica mas também optimista em relação
ao futuro do homem e da sociedade. A evidência do mal no mundo, sobretudo um
mal que decorre da capacidade humana para fazer sofrer, justifica uma maior
atenção às situações e acontecimentos que revelam o sofrimento e a vulnerabilidade
do outro. Por outro lado, e parafraseando Boaventura Sousa Santos (1994) a complexidade
e a profundidade das mudanças que atravessam a sociedade contemporãnea fazem
com que seja difícil compreender "as transformações por que estão a passar as
transformações" tornando, também nessa medida, imperativa a existência de referências
axiológicas balizadoras de um viver em comum.
Atendendo à responsabilidade social que lhes é confiada, os
educadores-professores sentem, de uma forma muito particular o desejo de radicar
os laços sociais num sentido de proximidade, de solidariedade e de justiça.
Uma exigência ética que, do nosso ponto de vista, passa, sobretudo, pela afirmação
da vocação humana para o infinito e para a imortalidade, apesar de toda a finitude
e mortalidade reconhecidas. Recusando uma visão, apenas, reactiva assente numa
concepção conservadora do homem, consideramos que o grande desafio que se coloca
à educação nestes tempos conturbados e incertos, reside na invenção de estratégias
singulares que permitam exaltar a dimensão projectiva e criativa dos sujeitos.
Porque a vida é mais do que destino, importa promover junto de pessoas e comunidades,
o desenvolvimento das competências que permitam criar alternativas, revolucionando,
permanentemente, o horizonte dos possíveis. É na ideia de Bem, na afirmação
perseverante de ideais e valores, que deve ser fundado o desejo ético. Quanto
mais o mundo nos confronta com o lado obscuro da condição humana mais necessário
se torna sublinhar o seu lado luminoso, aquele precisamente que faz a sua diferença
e a sua especificidade.
Importa então que a responsabilidade profissional docente
seja perspectivada a partir dos mesmos pressupostos. O termo responsabilidade,
como alerta Alain Etchegoyen (1995), tende a sofrer o destino de todos os termos
ambulantes que perdem a sua clareza à força de serem invocados, merecendo por
isso ser problematizado com mais rigor. Quando equacionada a partir de uma visão
negativa e pessimista da profissão, a responsabilidade dos professores tende
a ser valorizada numa dimensão jurídica e retroactiva, como a que encontramos
subjacente aos códigos deontológicos. Ora, querendo fazer justiça à complexidade
antropológica e ética inerentes ao acto educativo, a responsabilidade profissional
docente terá que ser valorizada numa dimensão fundamentalmente prospectiva.
Não é, pois, do lado da falta e do erro que nos posicionamos, mas do lado do
questionamento inquieto e paciente. Não é do lado da interdição, mas do lado
da liberdade e do desejo que vamos procurar interrogar a responsabilidade ética
dos professores.
Referências:
Alain Etchegoyen. 1995 . A Era dos Responsáveis. Difel
Boaventura Sousa Santos. 1994. Pela Mão de Alice, o Social e o Político
na Pós-Modernidade. Afrontamento
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