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Pentatlo do desporto escolar *

Para uma Associação de Professores de Educação Física, falar de Desporto Escolar é algo que se pode revestir de um certo melindre. Isto porque o Desporto Escolar é sustentado pela boa vontade de muitos e muitos profissionais de Educação Física - que representamos - e que dão o seu melhor. Mas também porque não foi ainda dado por estes o grito de revolta, que ecoasse nos sedentários gabinetes do Ministério da Educação, e que, produzindo o efeito desejado, se traduzisse num compromisso sério, isto é, num esforço conjunto de proporcionar aos nossos jovens estudantes um verdadeiro Desporto Escolar.
É esta, no fundo, a nossa intenção ao colaborarmos neste número de "A Página da Educação": levarmos aos seus leitores alguns pontos de análise sobre o Desporto Escolar em Portugal, de modo que seja possível a formulação individual de um juízo crítico sobre o que se passa (e o que seria desejável) nesta matéria.
Assim, vamos sistematizar algumas ideias sobre o assunto, em 5 pontos que nos parecem relevantes:

1. O Desporto Escolar não é Educação Física nem Desporto de Alto Rendimento

A Educação Física é para todos, o Desporto Escolar só para alguns: os que, voluntariamente, pretendam aderir aos núcleos existentes na Escola. Nem poderemos afirmar que o Desporto Escolar seja só para os mais aptos, uma pré-incubadora de campeões, destinada a uma selecção de valores emergentes pelos "olheiros" dos clubes e das federações. Todos os alunos que quiserem participar num enquadramento curricular não disciplinar no âmbito das actividades físicas e desportivas deverão encontrar resposta no Desporto Escolar. Terão o direito a participar em quadros competitivos ou meros encontros/convívios, conforme a actividade em causa, dentro da sua escola, ou com outras escolas ou entidades que promovam actividades idênticas.

2. Não há Desporto Escolar sem Educação Física

Não faz sentido que, numa escola em que não exista Educação Física, assistamos impávidos e incrédulos ao desenrolar de "treinos" de equipas de Desporto Escolar. Sejamos claros: a Educação Física é que é obrigatória, como o Português ou a Matemática ou a Geografia, porque se reconhece hoje o contributo específico e insubstituível daquela disciplina - e não área curricular! O Desporto Escolar vem "a seguir", usufruindo das mesmas instalações ou, porventura - perfeitamente aceitável - de outras alugadas, cedidas ou mesmo construídas para o efeito. O Desporto Escolar deverá ser uma continuidade-reforço-evolução lógica do gosto proporcionado pelas actividades desenvolvidas no âmbito da Educação Física, mesmo que seja na prática de remo, por exemplo, que não poderá ser dada em Educação Física. Com base neste raciocínio, uma aposta forte do Estado no desenvolvimento "desportivo" deverá passar em primeiro lugar por dotar efectivamente a Educação Física com as condições necessárias à sua leccionação plena. É, sem dúvida, o que permitirá minorar o analfabetismo motor que grassa na juventude.

3. Não há Desporto Escolar sem recursos humanos

São os Professores de EF que garantem o devido enquadramento das actividades desenvolvidas no Desporto Escolar. A sua preparação pedagógica permite que os alunos tenham um acompanhamento profissional, a um tempo adequado às suas características e propiciador de vivências diversificadas mas sustentadas, tanto quanto possível, em requisitos, de vária ordem, previamente adquiridos na disciplina de EF.

É para nós desadequado, porque negação de princípios elementares que fundamentam a função docente, que outros tenham a seu cargo a responsabilidade de orientar um grupo de jovens no âmbito do Desporto Escolar. Manifestamente, o "currículo" de praticante obtido numa determinada modalidade não será, por si só, suficiente. Sê-lo-á, eventualmente, para aceder a um curso de treinador. Não para ser educador. Mas todos temos conhecimento do que se passa em algumas escolas...

Convém esclarecer que um Professor de EF não é obrigado a incluir no seu horário semanal a mancha relativa ao Desporto Escolar. Tão pouco pode incluir as horas destinadas a acompanhar os alunos aos encontros e torneios fora da escola, horas de privação do seu descanço, sem qualquer compensação financeira. Mesmo assim, muitos profissionais optam por dar resposta positiva aos apelos de tantos e tantos alunos, que serão assim devidamente orientados e acompanhados por Professores, preparados para essa missão. Que definirão e respeitarão os objectivos estabelecidos a pensar nas especificidades e necessidades daqueles que tem sob a sua responsabilidade. Mas até quando? Os pontos seguintes são determinantes na resposta a esta questão.

4. Não há Desporto Escolar sem recursos materiais e financeiros

Com alguma frequência, há conflitualidade entre as actividades no âmbito da EF e no do Desporto Escolar, no que respeita à utilização do material e instalações. Isto porque é difícil traçar a fronteira entre o desejável e o possível, quando o material de desgaste (bolas, por exemplo) é solicitado por ambos. Em casa onde não há pão, acaba por ninguém ter razão...

Não é hoje possível que continuemos a ver chegar às escolas verbas ridículas, e em tranches, para compra de material, equipamentos, aluguer de transportes, etc.. Como se não bastasse a exiguidade, há ainda que contar com enormes atrasos na sua disponibilização, extremamente prejudiciais e comprometedores para um adequado planeamento e desenrolar das actividades programadas. Felizmente, o professor é português, e vai-se "desenrascando"!...

A dotação orçamental tem de considerar, no mínimo, gastos evidentes e absolutamente necessários para desenvolver com eficácia e dignidade as actividades previstas. Onde não se enquadram os fogachos e as feiras de vaidades a que se costuma assistir no encerramento anual do Desporto Escolar, perfeitamente dispensáveis num quadro de constrangimentos financeiros. Não é aceitável que seja o totobola a suportar parte das despesas. É uma percentagem de uma verba oscilante, dependente de apostadores, e estes não podem ser responsabilizados por não jogarem, como é óbvio... Mas podemos e devemos responsabilizar quem tem o poder de decidir nestas matérias.

5. Não há Desporto Escolar sem vontade política

No fundo, é lá em "cima" que se decide. O trabalho de campo é feito pelo Professor, mas é exigível maior ambição e determinação políticas para um grande projecto, como este deveria ser, traduzir-se em mais que mera... paixão.

A histórica decisão de ser o Ministério da Educação a tutelar o Desporto Escolar foi um passo de exemplar correcção. Mas são necessários outros...

Sem equívocos, deve entender-se o Desporto Escolar como um projecto nacional. Assente em sólidas bases humanas, materiais e financeiras. Que contribui para uma salutar vida adulta, de praticantes - mais que ocasionais - de actividades físicas, desportivas ou não. Que, mais que um dispendioso sorvedouro de dinheiro que todos lamentam, seja um investimento na qualidade de vida que todos ambicionam e desejam. Com o contributo dos Professores. Com a vontade dos Alunos. Com o apoio dos Pais. Com o aplauso da Sociedade. E, já agora, com o investimento do Estado.

"Só" falta, pois, a vontade política! O resto estará garantido...

* título da responsabilidade da Redacção

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 109
Ano 10, Fevereiro 2002

Autoria:

Helder Oliveira
Direcção da Associação Portuguesa de Professores de Educação Fisica
Helder Oliveira
Direcção da Associação Portuguesa de Professores de Educação Fisica

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