De acordo com um recente estudo realizado em França, uma em cada três crianças
desloca-se para a escola de carro, facto que, segundo a Agência de Ambiente
e Gestão de Energia daquele país, agrava a poluição do ar na proximidade dos
estabelecimentos escolares. Em Marselha e em Lille, por exemplo, apenas metade
dos alunos dos 5 aos 9 anos vai para a escola a pé, contra cerca de três quartos
em 1976. E os trajectos efectuados por carro, de acordo com o mesmo estudo,
são por vezes vezes muito curtos e não justificam o uso do automóvel: 20% das
deslocações são inferiores a um raio de 500 metros e 42% de 500 metros a um
quilómetro.
Serve este pequeno exemplo para demonstrar como nas sociedades ocidentais, e
nomeadamente no nosso país, os "automóvel-dependentes" são cada vez em maior
número. Para termos uma imagem, desde o princípio do ano, e só no distrito do
Porto, foram comprados cerca de 130 mil novos carros. Dois terços das deslocação
nas cidades fazem-se hoje de automóvel. Não é difícil imaginar o transtorno
que um tão grande número de viaturas causa nos grandes e médios centros urbanos,
invariavelmente dotados de uma estreita malha viária: filas intermináveis, passeios
ocupados, barulho excessivo e poluição q.b.. Os peões ficam claramente relegados
para segundo plano. Não é de estranhar. Não contribuem com impostos para o Estado,
nem enchem os bolsos das empresas que produzem os "bichinhos", os revendedores
que os revendem e as gasolineiras que multiplicam os lucros. Pelo meio, existe
uma completa desresponsabilização das instituições políticas que deixam a situação
atingir já quase um situação de não retorno, que nem a duvidosa iniciativa do
"Dia sem Carros" parece disfarçar.
Quanto a mim, o automóvel particular deveria ser considerado um custo social.
Não estou com isto a propôr que se extingam os automóveis, mas antes que se
faça um uso racional dos mesmos. Claro que para isto aconteça é necessário que
os (ir)responsáveis políticos tenham a coragem de introduzir medidas de restrição
à circulação automóvel (estabelecendo um número mínimo de ocupantes por viatura
ou fazendo uma triagem através das matrículas para entrada nas cidades), bem
como incentivar a criação de pistas cicláveis e de faixas de rodagem exclusivas
para transportes públicos, modificar os planos de circulação e, principalmente,
investir em transportes públicos cómodos e com horários fiáveis). Qualquer coisa
é preciso fazer. Senão, num prazo de 50 anos, temos mais quilómetros de automóveis
do que as ruas das próprias cidades (isto é verdade, segundo um recente estudo
sobre o trânsito no Porto). Tudo, menos a ditadura do automóvel.
Ricardo Costa com AFP
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