A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) está a levar a cabo, na
Macedónia, uma missão militar com o nome de "colheita essencial".
Na década de noventa, alguns países membros da OTAN, quiseram um corredor livre
entre a Europa e as fontes petrolíferas do Golfo Pérsico. Distribuíram armas,
pagaram e estimularam rivalidades e conflitos. Criou-se sofrimento e desordem.
Depois, com pontaria cirúrgica, estabeleceu-se a nova ordem.
A Macedónia era uma quintinha pouco produzida, mal amanhada, mas onde o povo
ia fazendo pacificamente pela vida. O problema deles não é de tamanho nem de
poder mas de terem o azar de estarem estrategicamente mal situados.
Na zona dos Balcãs, a pobreza e a desorganização do Estado potenciaram a corrupção,
o crime, as máfias, a violência. É o salve-se quem puder. Se a prazo é um corredor
de acesso ao petróleo, presta-se de imediato para rota do tráfico de drogas,
de armas, de pessoas, de carros roubados e de vários negócios criminosos. Ali,
como no resto do mundo, o crime produz as relações de trabalho, os lucros e
a ausência de impostos que são paradigma do bom capitalista. Relações de trabalho
flexibilizadas ao extremo, lucros assombrosos em relação ao capital investido,
impostos zero.
Ao contrário do que afirma a moral capitalista o crime compensa e compensa excelentemente.
As organizações criminosas, como os Estados tendem a ter os seus exércitos.
No caso do Kosovo, da Albânia e da Macedónia - e desgraçadamente noutros pontos
do mundo - os exércitos às ordens do mundo do crime têm vindo a ser aceites
como parceiros de países e de organizações internacionais. Ali, a OTAN, depois
de reconhecer, emparceirar e colaborar com o UÇK, reconhece agora o mesmo bando
embora com novo nome, ou seja, o Exército de Libertação Nacional (ELN). Foi
a esta associação criminosa que em Agosto, após um período de desassossego,
destruição e massacres na Macedónio, a OTAN pediu-lhes, delicadamente, que entregassem
algumas armas. A esta inteligente e suave missão deram o nome de "colheita essencial".
Durará um mês, prometem, e esperam recolher à roda de 3.300 fuzis.
Quanto nos custa a palhaçada?
A espinhosa missão empenha 4.000 militares. Nem todos custarão o mesmo. A
viagem dos alemães irá custar à roda de 14 milhões de contos. Vão em primeira
especial. Muito VIP. Os outros irão conforme as posses de cada país. Mas vão
todos aconchegados. Suponho que a meia dúzia de portugueses, incluídos no evento,
irão à boleia dos italianos. Se o tempo é de poupança faz bem o governo em aceitar
a boleia.
55 milhões de contos é quanto se estima que custe a colheita das 3.300 armas.
Quer dizer que se a missão for bem sucedida cada velha espingarda recolhida
pelos «missionários» da «colheita essencial» nos ficará pela módica quantia
de 15 a 16 mil contos.
Na zona, na Albânia e na Sérvia, ainda se fabrica a velha AK-47 mais conhecida
por Kaláshinikov. As da Albânia, de fraca qualidade, custam nos quiosque à roda
de quarenta contos. São mais caras as fabricadas na Sérvia, de melhor qualidade,
pois atiram para os duzentos contos.
A "colheita essencial", grande missão da OTAN, decorrerá durante trinta dias.
Não se sabe se os malandretes do ELN encontrarão sucata suficientemente para
fazer da missão um sucesso ou se terão de lhes oferecer meia dúzia de Kalashinikov
albanesas. Estimo que seja mais um sucesso da política internacional na zona.
Considerando os objectivos e mesmo sabendo que a propaganda internacional está
cara, ainda assim é caso para dizer, como diria o meu amigo Henrique Borges,
para que tanto aparato? Porque não vão directamente aos quiosques da Albânia?
É mais barato.
José Paulo Serralheiro
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