Nesta época repete-se, anualmente, o tapete lilás que cobre as
ruas quando os jacarandás se despojam das flores que esplendorosamente
ostentavam.
Embora despida de estética comparável, também
esta coluna, habitualmente no mês que passa, alude a um estádio
que dá pelo nome de férias. Desta vez, a este estádio associa-se
o desafio "turismo".
Com o dicionário (não o mais recente) aqui à
mão vá de o usar pois os livros nascem para serem mexidos e a
viagem tem que começar.
Aparece:
TURISMO: gosto pelas viagens; o que se relaciona com os
serviços organizados de viagens; viagens de instrução e
recreio; excursionismo.
Espevitada a curiosidade pela última proposta de significado,
procura-se a opinião do(s) dicionarista(s) a respeito, naturalmente numa
página bastante mais atrás.
EXCURSÃO: ... (fig) digressão; divagação;
incursão; correria.
Ora cá está o fig que porventura justifica
a inquietação que me trouxe para estas deambulações.
Leia-se o que se viu escrito: 1. gosto eu sei que é
gozo, prazer; 2. serviços organizados tem sabor a prestações
eficazes em relação aos destinatários; 3. instrução
e recreio tenho levado toda a vida, que já é suficientemente
longa para ter pisado muitos palcos enquadrados por cenários diversos,
a ligar uma ao outro por casamento indissolúvel com Educação
por testemunha e Formação por notário; 4. excursionismo
fica assim a tender para o corriqueiro
Excursão é a beleza das descrições
que abundam na literatura dos autores da nossa terra; de há uma mão
cheia de anos por vivência e, neste período de sobreposição
de séculos por construção de memória/ficção.
Mudando a bitola da classificação, que a isso
implica o aviso da tal abreviatura, podemos admitir: a) digressão
não veste bem a figura; b) divagação soa a alienação;
c) incursão tem toque viscoso e cáustico de ingerência
ambígua ? é "in" ou é "ex"?; d) correria
é razão de passada acelerada por ligeireza ou leviandade.
Chame-se "dados" aos resultados do exercício
feito. O jogo é tão sujo, tão indigno, tão obsceno
que é preciso estar contemplado numa resolução (1099 de
1996) da Assembleia Geral da Nações Unidas um certo ponto 13 onde
os Estados-membros do Conselho da Europa são convidados a tomarem
medidas concretas para pôr fim ao turismo sexual, nomeadamente através
de sanções penais e administrativas contra agências de viagem
e operadores turísticos ... e pela dissuasão dos candidatos ao
turismo sexual, nomeadamente projectando filmes nos aviões com destino
aos países de risco, mostrando os graves prejuízos infligidos
ao desenvolvimento psico-social e físico do jovem vítima de abuso
sexual, e da entrega de folhetos sobre a exploração sexual das
crianças, à saída dos aviões.
Sem deixar de tirar o chapéu à UNICEF e a outras
organizações que trabalham para a protecção e
informação das vítimas reais ou potenciais, nós,
educadores, não podemos eximir-nos da parte de responsabilidade que nos
cabe, sentados no dispositivo Europol.
Façamos férias, façamos turismo, mas,
sobretudo, aproveitemos a viagem e o lazer para investir numa reflexão
de que resulte a determinação efectiva de pressionar quem detém
a maior fatia do poder no sentido de incluir nos currículos escolares
temas de melindre e acuidade como o focado nestas linhas. Mas atenção,
que incluir não é simplesmente mandar dar à estampa; é,
antes de mais, formar para a formação.
Iracema Santos Clara
Escola E.B. 2/3 Dr. Pires de Lima
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