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A "guettização" da Europa
Na pequena localidade húngara de Jaszladany, 120 quil?metros a sudoeste da capital Budapeste, a polémica estalou. As autoridades locais querem construir uma escola privada destinada a crianças não-ciganas e a comunidade desta etnia insurgiu-se contra a medida. Queixam-se de discriminação e afirmam que não percebem o porquê da construção de outra escola quando a actual foi inaugurada há apenas três anos.

Eva Csikos, uma mulher de origem cigana, pergunta porque razão as autoridades locais não recolhem o lixo ou constroem ruas nas zonas habitadas pelos ciganos, ao invés de investir na construção de uma nova escola. Já o presidente da edilidade local, Istvan Danko, assegura que a escola "não está a ser constru?da contra os ciganos", mas antes para "impedir a progressiva degradação do n?vel de educação local".

Facto é que em Jaszladany, onde os ciganos representam quase um terço dos 6200 habitantes, a taxa de desemprego no seio da comunidade eleva-se aos 18%, contra os 5,8% da média nacional, e "nenhuma das fam?lias poderá suportar os 20 contos de propina", como explica o chefe da comunidade cigana Laszlo Kallai.

A questão da minoria cigana na Hungria tem levantado uma acesa polémica naquele pa?s, depois de vinte ciganos originários da cidade de Zamoly terem pedido o estatuto de refugiados, em França, assegurando serem v?timas de discriminação. O pr?prio presidente da Comissão Europeia, Romano Prodi, já advertiu a Hungria de que a questão do tratamento das minorias deveria estar "regulada" até à entrada do pa?s na União Europeia.

Entretanto, neste outro cantinho da Europa, um recente inquérito junto de alunos portugueses entre os 14 e os 15 anos, inclu?do num estudo internacional sobre educação c?vica, revelou que mais de metade deles concorda com a segregação de crianças seropositivas e apoiam a criação de escolas separadas para esse grupo. O mesmo inquérito revela que 42% afirmam também não concordar com a entrada de operários não especializados no pa?s, 30% concordam com a segregação de crianças filhas de toxicodependentes e 24% têm a mesma opinião relativamente a crianças de etnia cigana.

Com tudo isto, pergunta-se: Que modelo de Europa estaremos a construir? Onde andará o esp?rito de tolerância que sempre caracterizou os habitantes do velho continente? E qual, afinal, o papel da escola em contrariar este processo de "guettização" a que assistimos? Perguntas a serem postas, quem sabe, aos defensores da publicação dos "rankings" de escolas, cujo efeito perverso acaba, mais cedo ou mais tarde, por transparecer em casos como os de Jaszladany. E que pode perfeitamente repetir-se, num futuro pr?ximo, numa qualquer vila ou aldeia portuguesa.

Ricardo Jorge Costa
com AFP

  
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Edição:

N.º 104
Ano 10, Julho 2001

Autoria:

Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação
AFP
Agence France-Presse
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação
AFP
Agence France-Presse

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