Na senda do entendimento protagonizado pela American Psychological Association,
devemos entender a violência como situações casuísticas
ou habituais, susceptíveis de causar perturbações ao bem-estar
físico, psíquico ou social dos indivíduos ou dos grupos.
A complexidade do problema torna difícil a abordagem
com o condicionamento exíguo dos quatro mil caracteres de espaço
a que este artigo se deve ater. Tentarei, pois, fazê-lo circunscrevendo-me
a dois únicos tópicos (como, aliás, me foi pedido), quais
sejam as possíveis causas para a violência que assola a Escola
e saber se é ela o único local ou o local privilegiado para a
combater. Naturalmente que o método será sinóptico e as
escolhas corresponderão às prioridades que pessoalmente defendo.
A violência que chega à Escola tem a sua origem
primeira fora da Escola e é, em meu entender, uma emanação
da sociedade violenta que temos vindo a desenvolver, assente na derroga galopante
de valores tradicionais e no aniquilamento da Família.
Quando a industrialização arbitrária se
impõe como modelo desenvolvimentista, quando o consumismo gratuito avassala
os paradigmas identitários até então vigentes, a pobreza
e a exclusão acentuam-se e com elas a violência cresce. Não
sendo única, esta é causa forte.
Sabemos que os jovens com comportamentos desviantes e violentos
provêm maioritariamente de famílias precarizadas a todos os níveis
(miséria, alcoolismo, toxicodependência, ambientes de maus tratos
e abusos sexuais, etc.). E sabemos, é a Psicologia do Desenvolvimento
que o postula, que as crianças expostas a estes ambientes têm desenvolvimentos
emocionais patológicos. Com efeito, ninguém minimamente familiarizado
com o conhecimento científico pertinente desconhece que as crianças
adquirem as suas competências sociais num processo de identificação
com os comportamentos dos adultos e do ambiente em que estão enquadradas
e onde crescem.
Do que ficou dito, resulta implícito que não
pertenço ao grupo dos que pensam que a violência encontra na Escola
o lugar privilegiado para a combater. A Escola, enquanto instituição,
e os professores, enquanto agentes educativos, são hoje vitimas da violência,
que não será diminuída sem intervenções de
fundo a montante da Escola. Naturalmente que muito trabalho se pode desenvolver
em situação escolar, mas sendo a violência um problema de
toda a Sociedade, é a ela como um todo e não a um seu sub-sistema
que cabe a responsabilidade primeira.
O problema da violência, como, aliás, qualquer
outro comportamento prevaricador, nunca pode ser tratado numa vertente única.
É sempre preciso considerar, com equilíbrio e equidade, a sua
natureza tripla, isto é, encarar a possível recuperação
do prevaricador, cuidar da indemnização da vítima e preservar
a Sociedade de futuras reincidências. Neste âmbito, e em jeito de
conclusão, deixo algumas medidas que me parecem, entre outras que o espaço
não permite abordar e as que resultam implícitas depois do que
supra referi, de prática imperiosa:
- Não há pequena e grande delinquência. O combate à
delinquência passa por aplicar igual rigor e exigência ao pequeno
e ao grande delito. O pequeno delito não tratado incentiva os futuros,
que serão crescentemente mais graves.
- 0 regime disciplinar vigente nas escolas é burocratizado até
ao ridículo e ineficaz. E imperioso mudá-lo.
- Urge aprendermos com o que se ensaiou na Europa e nos USA e concluirmos
que o problema não é de conjuntura mas de fundo. Afigura-se-nos
indispensável a criação de um observatório especializado
que forneça informação tratada aos decisores.
- Torna-se imperioso reforçar a acção de equipas interdisciplinares
de prevenção da violência juvenil, particularmente no
que concerne aos grandes centros urbanos.
Lemos Damião
Presidente da Associação Nacional de Professores
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